domingo, 3 de maio de 2015

ANTÍGONA

Há um ditado aqui na França que diz: En avril ne te decuvre pas d'un fil, en mai fais ce qu'il te plaît. Que quer dizer mais ou menos o seguinte: Em abril não vá tirando logo a roupa, em maio faça o que lhe aprouver. Mas ele parece não fazer mais o menor sentido: Cheguei em Paris no final de abril e fui recebido por sol e calor. E agora veio maio trazendo chuva e frio... Quero minha primavera de volta! Depois que escrevi isso, saí no começo da tarde de um domingo chuvoso para ir ao Théâtre de La Ville assistir a uma montagem de Antígona, de Sófocles, protagonizada por Juliette Binoche. Assim que as luzes se apagaram e teve início o espetáculo já me senti recompensado pela ausência do sol. Fui agraciado com uma belíssima encenação dessa tragédia que se revela essencialmente atual. Juliette e todo o elenco atingem o registro trágico com uma verdade e uma naturalidade impressionantes. Não soa empostado ou teatral, mas tem a força e a contundência que a obra exige. A encenação é irretocável, atualiza o conflito sem tentar modernizá-lo, apenas tornando mais evidente a atemporalidade dessa grandiosa obra da dramaturgia universal. Nos dando a clara visão de que o ser humano caminha, desde sempre, inflexível para o fim. Como diz o coro dos Velhos Tebanos: Numerosas são as maravilhas da natureza, mas de todas a maior é o Homem (...) Fecundo em seus recursos, ele realiza sempre o ideal a que aspira( ...) Só a morte ele não encontrará nunca o meio de evitar(...) Industrioso e hábil ele se dirige, ora para o bem, ora para o mal... Fiquei bastante tocado por esse espetáculo, que me trouxe muitas lembranças de meu mestre Ivo Bender e nossas aulas de Teatro Grego. Ele, como poucos, iria apreciar essa montagem em todas as suas sutilezas. Tive um maravilhoso presente de aniversário, ainda que com alguns dias de atraso. Juliette Binoche é uma grande atriz, dona de um talento imensurável, se é que existe medida para talento. Para o dela, certamente, não há. E, quando saí do teatro, mais uma grata surpresa: "Ó luz do sol, a mais radiosa que jamais brilhou sobre a Tebas das Sete Portas, eis que enfim ressurges"... As palavras do coro, mais uma vez, me apontavam a realidade atual: O sol voltara a brilhar sobre Paris. Fui duplamente contemplado...
Na foto, parte do elenco recebe os calorosos aplausos: Da esquerda para a direita: Kirsty Bushell, Finbar Lynch, Juliette Binoche e Kathryn Pogson.

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