quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

ALMODÓVAR VIRTUAL

Fiquei tão feliz, mas tão feliz com a entrada de Pedro Almodóvar para o Netflix, que resolvi dividir aqui no blog essa minha singular felicidade. Minha paixão pelo cineasta espanhol é antiga, desde que descobri Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos, sua sétima película, a primeira a que assisti, aqui mesmo em São Paulo, quando ainda morava em Porto Alegre. Mais tarde, quando morei em Paris, é que tive a oportunidade de conhecer todos os seus trabalhos anteriores como Pepi, Luci, Bom Y Otras Chicas del Montón, Labirinto de Pasiones, Maus Hábitos, O Que Fiz Para Merecer Isso, Matador e La Ley del Deseo. Muito já falei sobre ele e seus filmes aqui no blog. Mas, quando penso que o assunto se esgotou, me dou conta de que ele é inesgotável. E que sempre é bom falar, ver e rever Almodóvar. O Netflix traz doze títulos da sua cinegrafia e o seu mais recente lançamento, Mães Paralelas. Ando tão atribulado com ensaios que até agora só pude rever um deles. Claro que foi A Lei do Desejo, meu eterno cult movie. Esse, diga-se de passagem, já revi diversas vezes, em videocassete e DVD. Mas, obviamente, irei rever todos. Não me canso de rever Almodóvar. Ele é muito bem-vindo, sobretudo agora, que pouco se vai a salas de cinema e o streaming domina os lares do mundo. Sempre atual e contestador, desde o primeiro filme. Sempre privilegiando as personagens femininas, os excluídos, os desencaixados da sociedade. Subvertendo valores como família, fé e sexualidade. Sexualidades, melhor dizendo. Uma cabeça privilegiada e à frente do seu tempo. Como os melhores o são. Tomara que o streaming se abra também para a obra de Arnaldo Jabor, que infelizmente acaba de nos deixar. Assim, muitos da nova geração que não tiveram contato com sua expressiva obra cinematográfica, poderão conhecê-lo sem sequer sair de casa. Mas, voltando a Almodóvar, seus filmes são puro deleite estético a cada frame. Cenários coloridos, trilha sonora envolvente, figurinos sofisticados e atrizes talentosíssimas. Não faltam musas como Rossy de Palma, Bibi Andersen, Carmen Maura, Marisa Paredes, Victoria Abril, Chus Lampreave e Penélope Cruz. Para quem não viveu a década de oitenta uma dica: Ela está toda lá. Ele flerta com o brega, o subverte e o transforma em luxuoso kitsch. Mistura drama, comédia, melodrama e suspense resultando em estilo pessoal e intransferível, embora largamente copiado mundo afora. Eu mesmo já quis ser Almodóvar sobre a cena. Está confesso aqui no blog. Basta procurar no campo de busca. Então era isso. Não deixem de ver e rever Pedro Almodóvar, agora em streaming. É luxo só... Na foto, o cineasta e suas musas Rossy de Palma e Penélope Cruz.

sábado, 5 de fevereiro de 2022

CONVERSAS PARALELAS

De uns tempos para cá, infelizmente não sei precisar quando, profissionais das mais diversas áreas passaram a dizer que as coisas "conversam" entre si. Pelo jeito só eu acho isso uma loucura, pois todos o dizem o tempo todo sem sequer perceber. Tornou-se absolutamente normal decoradores, por exemplo, dizerem que determinados móveis “conversam” bem com as cortinas e ou tapetes. Ou chefes de cozinha que dizem que os ingredientes de um prato ou sobremesa "conversam" uns com os outros. Fico imaginando a cena: Um cabide de chapéus e uma namoradeira à entrada de um luxuoso apartamento. Cabide: Madame está enlouquecida hoje. Saiu com o chapéu vermelho. Namoradeira: Que chapéu vermelho? Cabide: Ué, o único que está sempre aqui, pendurado em mim. Não reparou que hoje estou sem ele? Namoradeira: Eu não reparo. Apenas converso. Cabide: Pelo menos quando ele está aqui comigo ninguém vê, pois eu não posso sair às ruas e ser alvo de chacota como ela, que é chamada de palhaça e de bombeira, pelas crianças. O tapete não comentou nada com você? Namoradeira: Não sei, não converso com ele. Fui colocada aqui para conversar apenas com você... Entrementes, na cozinha, o chefe diz à cozinheira: Vou deixar essa carne marinando para que os aromas conversem entre si e com ela. Corta para dentro da panela. Alecrim: Alho, você não acha que o chefe pesou no sal? Deve estar apaixonado pela patroa. Alho: Não é da minha conta. Além do mais, o chefe nos deixou aqui para que nós, aromas, conversássemos entre nós e com a carne. E até onde eu sei, sal não é aroma. Pelo contrário, é totalmente inodoro. Não gosto de me misturar… Dia desses, no ensaio de uma peça em que estou trabalhando, a iluminadora disse que estava pensando em criar uma luz que conversasse com o cenário. Aí eu já achei demais. Se no meio de um espetáculo a luz resolve começar a conversar com o cenário, ninguém vai entender o texto da peça! Já pensou que confusão? Rsrsrs… Por isso sugiro que a gente deixe as coisas quietas, cumprindo o papel delas. Mas de boca fechada! Num mundo como o atual, em que todos tem tanto a dizer o tempo todo em todas as plataformas, palanques e redes, se ainda por cima for dada voz às coisas, aí mesmo é que não se sabe onde iremos parar… Na foto, os graciosos objetos falantes de A Bela e a Fera.