quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

PEQUEÑA EVENTUALIDAD

Remexendo guardados encontrei esse conto de 27 de fevereiro de 1985. Eu tinha vinte e um aninhos na ocasião. Reli e achei-o muito engraçado, sobretudo pela adjetivação exacerbada, e então resolvi postar: Alfonso Soares era chileno e mudara-se para o Brasil durante o governo de Pinochet. Rico, foi logo se instalando em um luxuoso apartamento no centro de Curitiba, cidade que escolheu por ter ouvido falar de sua excelente organização. Advogado aposentado, dedicava seu tempo às leituras, aos esportes - gostava de correr para manter-se em forma - e ao lazer em geral pois, apesar de já ter os seus cinquenta e poucos anos, era alegre, jovial e cheio de vida, apreciando todos os prazeres que lhe assegurava a sua condição burguesa, com muchos dolares a cambiar. Soy loco por ti America cantarolava de manhã cedo ao sair de casa para fazer seu cooper no Passeio Público, não sem antes telefonar para Claudio Prado, seu amigo mais chegado, que conhecera em uma viagem de trem de Curitiba a Paranaguá. Encontravam-se então em uma esquina da Luiz Xavier, de onde já saíam em plena corrida. Numa dessas manhãs, Alfonso Soares torceu o pé justamente quando atravessavam correndo uma movimentada avenida. Claudio Prado, em pânico, tratou de arrastar o amigo para a calçada enquanto pedia ajuda aos passantes que, super apressados, não se dignavam sequer a olhá-los. Com esforço conseguiu levá-lo até um banco, onde deixou-o sentado. Fique-aqui-quieto-enquanto-vou-telefonar-pedindo-para-mandarem-uma-ambulância, disse Claudio Prado ao amigo ferido e correu desesperado até o telefone da esquina. Alfonso Soares gemia e esbravejava de dor quando uma senhorita muito distinta desceu de um Fiat branco recém estacionado à sua frente e veio na sua direção. O senhor está ferido, perguntou a discreta moça, parece que sim, respondeu o chileno, então vamos até o meu carro que o levarei de bom grado ao Pronto Socorro Municipal, disse ela e foram os dois Fiat a dentro e Luiz Xavier a fora esquecendo-se completamente, Alfonso Soares, de seu amigo Claudio Prado. Quando este retornou ao banco onde havia deixado o parceiro, atônito constatou que ele havia sumido. Levando as mãos à cabeça e um pouco tonto com a situação perguntou-se, sem resposta, para onde teria ido o louco do seu amigo. Andou em círculos, deu algumas voltas no quarteirão e já exausto e sem entender nada desistiu da busca e foi para seu apartamento de cobertura - que também era rico - onde ficou pensando, preocupado, no paradeiro de Alfonso Soares, enquanto tomava incessantes vodkas com suco de tomate e comia azeitonas pretas. Já de volta do Pronto Socorro Municipal e com o pé devidamente enfaixado, Alfonso Soares convidou Amelia Oliveira e Silva, esse era o nome da distinta senhorita, para subirem até seu apartamento e tomarem um drink, quem sabe almoçar, quem sabe bater um papo, quem sabe. Ora-como-não-muito-obrigada-é-com-prazer-imenso, disse Amelia Oliveira e Silva e lá se foram rumo ao elevador cuja porta foi aberta pelo porteiro Palhares, que ficou muito abalado e sentido com o doloroso acidente. No fue nada, exclamou Alfonso Soares, gracias à gentileza dessa simpática señorita. Bondade sua, corou Amélia Oliveira e Silva e subiram ofegantes os dezoito andares, de elevador. Ao abrirem a porta - Oh-mas-que-extremo-bom-gosto - lembrou-se Alfonso Soares de seu amigo Claudio Prado e no mesmo instante o telefone tocou. Vou-já-para-aí, disse Claudio Prado do outro lado da linha e nem deu tempo ao amigo de dizer que não precisava, que estava tudo bem, que tinha companhia, que. Amelia Oliveira e Silva fez questão de dizer a Alfonso Soares, já que era comunicadora e sabia se expressar muito bem, que além de achá-lo muito inteligente e simpático, achava-o também bastante corajoso, afinal, com tudo o que passara naquela manhã, nem se havia abalado. Ele estava encantado com ela, além de super excitado, mi Diós, mas que pedazo de muchacha. Ela o estava achando muito atraente e sensual, tanto que fixou os olhos na saliente braguilha da sua calça de malha Le Cock Sportif quando ele alcançou-lhe o copo de Martini com cereja ao marasquino segurando sua mão branca e um tanto trêmula. Trocaram um profundo olhar, sorriram encabulados, ela ruborizou, a campainha tocou, ele foi atender, ela suspirou. Claudio Prado entrou - ainda-bem-que-está-tudo-bem - foi logo apresentado a Amelia Oliveira e Silva - muito -prazer-o-prazer-é-todo-meu - e ficaram os três a tomar os seus drinks conversando animadamente como velhos amigos. Resolveram então sair para almoçar. Foram a um restaurante de luxo, comeram lagosta e beberam do mais fino champanhe francês. Depois, Amelia Oliveira e Silva deixou-os em frente ao prédio de Alfonso Soares, pois já haviam combinado de à noite assistir a um espetáculo de dança no Teatro Guaíra. Às oito e meia Alfonso e Claudio passaram na casa de Amelia para apanhá-la, no elegantíssimo Mercedes bordeaux de Claudio Prado, o rico empresário & colecionador de obras de arte. Após o teatro jantaram, após o jantar foram a uma boate, depois a um pub beber mais uns drinks e então Claudio sugeriu que fossem até o seu apartamento de cobertura para verem o nascer do sol. Todos acharam a ideia maravilhosa e excitante. Já no terraço, Amelia, completamente bêbada, despiu seu elegante vestido jogando-se, em êxtase completamente inaudito, na refrescante piscina de água transparente, levemente azulada. Alfonso parou-se a admirá-la na borda da piscina e Claudio, aproximando-se dele, começou a despi-lo lentamente, jogando as peças de roupa na água, que Amelia ia pegando e acariciando e mordendo uma a uma até que lhe foram jogadas as cuecas, que enfiou inteiras na boca. Alfonso, já inteiramente despido, fez o mesmo com Claudio e jogaram-se os dois na piscina juntando-se a Amelia numa confusão de peças de roupa e de corpos e abraços e beijos e membros. O sol então apareceu surpreendendo-os na sua nudez pós-orgíaca adormecida. Amelia foi a primeira a despertar com os raios quentes e tratou de acordar os amigos para que vissem a beleza do dia. Abraçaram-se os três e, felizes, mandaram vir o breakfast. Comeram frutas e beberam café com torradas à beira de. Sentiram-se novos, donos de uma energia muito forte e vital. Soy loco por ti Amelia, cantarolava agora Alfonso Soares pela manhã, ao sair de casa para fazer seu cooper no Passeio Público, não sem antes telefonar para Claudio Prado, seu amigo mais chegado, e para Amelia Oliveira e Silva, sua amiga mais chegada. Numa manhã, quando iam os três correndo por uma movimentada avenida, Amelia esbarrou em alguém, levou um tombo e.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

DESAPEGO

Sou um entusiasmado praticante do desapego. Não que eu seja budista, espírita ou seguidor de qualquer outra religião ou filosofia que o cultive. Não que eu também não seja. Apenas o pratico como um exercício de fazer as coisas rodarem, circularem. Tudo o que se move gera evolução, criação e, no meu entender, crescimento. Abre espaço para o novo, o inusitado, a surpresa. E não apenas em relação às coisas, mas também com as pessoas e os sentimentos procuro ser desapegado. Eu já era adepto dessa prática há muito tempo de maneira intuitiva. Mais tarde, com a leitura de É Tudo Tão Simples, de Danuza Leão, tornei-me um entusiasta do desapego de maneira totalmente planejada. O assunto veio à baila porque me encontro em plena atividade, separando livros, roupas e uma variedade sem fim de objetos para doar. Adoro a ideia de abrir mão de algo que não me serve mais e imaginar o quanto esse algo possa fazer bem a uma outra pessoa. Principalmente em relação aos livros. Se eles já me ajudaram, me emocionaram, divertiram ou até mesmo mudaram minha vida, o mínimo que imagino é que façam o mesmo com um outro alguém que por ventura os ler. Assim a roda da vida segue girando.E eu, dentro da minha casinha, vou me reorganizando.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

SEMPRE É BOM

Sempre é bom rever amigos e familiares. Estive rapidamente em Porto Alegre, a caminho de Passo Fundo, onde fui comemorar a passagem de anos de minha irmã, ocasião que serviu para reunir a família, já tão dispersa nos mais diversos pontos do país e do exterior. Infelizmente não sobrou tempo para matar a saudade dos amigos de Soledade. Mesmo assim, fiz questão de entrar e dar uma olhada na cidade na ida e na volta de Passo Fundo. O tempo que restou para curtir a capital, apesar de curto, foi bastante proveitoso. Na quinta-feira fui recebido por meu amigo Éverton Klauss, com uma deliciosa paella regada a muitas cavas no novo apartamento lindamente decorado pelo arquiteto Claudio Resmini. Lá reencontrei o artista plástico Nelson Wilbert e pude apreciar um pouco de sua obra. Na sexta-feira almocei no Bistro do Solar, o simpático restaurante da Sociedade Nova Acrópole, instalado no belíssimo Solar Palmeiro, um tradicional casarão histórico do século XVIII, localizado na Praça da Matriz. Recomendo. Após pit stop para um café com Sergio Lulkin, que me contou as novidades das gravações do seriado Doce de Mãe, o dia findou em um happy hour com por do sol de tirar o fôlego chez nossa amiga Lucia Nascimento. No domingo, após o retorno do interior, ainda tive direito a mais um happy hour no La Tasca, inusitada mistura de padaria, adega e bar de tapas no centro da cidade, exatamente ao lado da Champanheria Ovelha Negra. Recomendo II, a Missão. Além do prazer de rever amigos e familiares, nessa rápida volta ao sul tanbém tive o privilégio de ser clicado por Guto de Castro em mais uma série de incríveis portraits. Guto sempre faz de mim um ser humano melhor. E o melhor: Mais bonito. Retorno a São Paulo com uma grande vontade de voltar a ser a pessoa agregadora que fui no passado e juntar todos esses amigos de diferentes tribos em uma grande festa para fazer um brinde ao amor e à amizade. Cheers! Na foto, revisito o Parque da Redenção pelo olhar do fotógrafo Guto de Castro.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

BOWIE IN SP

David Bowie está em São Paulo. Aterrissou sua nave espacial no MIS, Museu da Imagem e do Som, e expôs todo o seu peculiar acervo. Trata-se da exposição sobre o ícone inglês do rock organizada pelo Victoria and Albert Museum de Londres, que fica até o dia 20 de abril e é imperdível, para dizer o mínimo. Após deixar todos os seus pertences na chapelaria, você recebe um pequeno aparelho conectado a fones de ouvido e começa a viagem através do espaço da obra do camaleão. Corredores negros iluminados por finos filetes de luz dão a impressão de lasers conduzindo o visitante por um universo virtual. Very Bowie. Very Ziggy Stardust... O acervo é composto de figurinos, fotografias, partituras, manuscritos, instrumentos, sapatos, cartazes, filmes e videos sem ter fim. Roupas especialmente criadas para ele pelo estilista Alexander Mc Queen me deixaram de boca aberta. A exposição é emocionante e digna da importância da obra desse multifacetado artista. Saí com a impressão de que nada mais pode ser feito de novo em termos de arte. A mesma que tive quando assisti ao documentário dos Dzi Croquettes. E também fiquei com a agradável sensação de que Rita Lee é o nosso David Bowie... Corra. Ou melhor, voe. Enfim, não perca! Na foto, Bowie usando um dos incríveis figurinos que compõem a mostra.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

SONHO DE UMA NOITE DE VERÃO

Nem tudo é ar quente e seco no tórrido verão paulistano. Ontem à tarde, estava eu em minha humilde residência quando toca o telefone e era a Camila, da produção do filme Que Horas Ela Volta, me chamando para participar de mais uma cena. Os que não sabem do que estou falando leiam, por favor, o post DIA DE CINEMA aqui no blog. Eu, que já havia dado por encerrada a minha participação, incrédulo vibrei de alegria. Minutos depois o motorista tocou a campainha, eu desci e embarquei rumo ao meu sonho de uma noite de verão... E a quimera já começou no carro mesmo quando o motorista Gilvan, simpatissíssimo, me contou que iríamos apanhar ninguém menos do que Joyce Pascowitch, que também participaria da filmagem. Quem me conhece sabe que invariavelmente pontuo minhas conversas com um já característico “li na Joyce” e até o jornaleiro aqui da rua, seu José, quando me vê passar avisa: Chegou a Joyce! Pegamos a Joyce em si em Higienópolis e, antes mesmo de começar a descer a Rebouças, o papo já fluía agradavelmente. Eu me sentindo amigo de infância de La Pascowitch, diga-se de passagem. Depois veio Patrícia Casé, a diretora Anna Muylaert, Bete Dorgam, o dono circo, as crianças, o público, de repente apareceu uma luz lá no alto: Era Regina Casé. E o mais inacreditável: Fazendo festa pra mim. O que mais eu podia querer? Dessa vez eu fui à forra, tirei o atraso, compensei toda a minha jequice do primeiro encontro. Abracei, beijei, disse que amava. E, claro, tirei fotos! Filmamos a festa de aniversário de Bárbara, a dona da casa, que entrevistei quando filmei como repórter. Durante um bom par de horas repetimos a cena, com a Regina servindo canapés. Eu era um dos convidados que aceitava o canapé. A cena mostrava a invisibilidade dos serviçais e eu tinha que pegar o canapé ignorando quem me servia. O duro foi ignorar Regina e, principalmente, não agradecer! Aproveito e agradeço agora: Obrigado! Mil vezes obrigado! Terminada a filmagem, depois de mais abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim, embarquei com Joyce no nosso carro que me trouxe de volta à realidade. Mas eu então já era outro, transformado por esse sonho de uma noite de verão... Na foto, a fofa diretora Anna Muylaert de quem já sou súdito fiel, pronto a fazer o que ela mandar.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

OPINIÃO

Na minha modestíssima opinião, ter opinião é algo realmente importante. Sobre o que quer que seja. Mas parece que hoje em dia estamos vivendo a Era da Opinião, assim mesmo, em maiúsculas, mesmo que a dita era seja a das opiniões furadas sobre assuntos de pouquíssima ou nenhuma relevância. E quando os assuntos são, de fato, relevantes, aí é que a coisa piora: Vira um festival de frases feitas e clichês que invariavelmente descamba para a violência e a truculência verbal. Sem falar no verdadeiro assassinato da língua portuguesa que vem de lambuja. Será que os inventores das - argh! - redes sociais imaginavam o inferno das torrentes de oponiões de todos sobre tudo que seriam despejadas diariamente sobre nós quando as criaram? Li outro dia, possivelmente em uma delas, as redes, que opinião é como bunda: Todo mundo tem. Mas nem por isso precisa sair dando por aí, néam? E o pior é que na sua grande maioria todas elas são repetições! Parece que as pessoas se reunem em um grande fórum para decidir sobre o quê irão opinar e quais serão as opiniões sobre cada um dos temas escolhidos. A favor ou contra o Big Brother, a favor ou contra a Dilma, os gays, os evangélicos, os homofóbicos, a pedofilia, a prostituição infantil, o PT, o PSDB, a reciclagem, os blogueiros, a redução da maioridade penal, a mídia ninja, o uso de esteroides anabolizantes, as manifestações, o Papa, a Globo, a Record, a Luciana Gimenez, o Danilo Gentili, o funk ostentação, o Rafinha Bastos, o Ratinho, a Luiza Marilac, o Pedro Bial e o Jodinei Aparecido Palhares, mais conhecido como Débora. Mas quem sou eu para falar? Olha o que estou fazendo aqui: Dando a minha bunda! Digo, opinião. Por isso podem me prender, podem me bater, podem até deixar-me sem comer... Na foto, uma opinião a ser levada em conta: A de Maria Bethânia, dirigida por Augusto Boal.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

CHIMARRÃO

Assim como os japoneses tem a sua cerimônia do chá, minuciosa e delicadamente repetida através de séculos, também os gaúchos, seleto grupo de brasileiros nascidos no extremo sul do país, ao qual pertenço, tem o seu chimarrão. Que não deixa de ser um chá, cuja erva-mate é servida em uma cuia de cabaça na qual se introduz a água quente e sorve-se o líquido pela bomba, uma espécie de canudo de metal circundado por ornamentos que tem, de um lado, um pequeno coador e, do outro, uma ponteira para os lábios. A minha, que herdei de meu pai, é banhada em prata e ouro com minhas iniciais gravadas no ornamento. A versão feminina do chimarrão leva açúcar e é conhecida como mate-doce ou mate de comadres. O chimarrão não é exclusividade dos gaúchos. Outros povos, tais como catarinenses e paranaenses e até mesmo argentinos e uruguaios, também costumam apreciá-lo. Só que em versões diferentes, em cuias menores ou mesmo em copos ou xícaras, e recebe o nome de tererê, bem menos inspirador, diga-se de passagem. No Rio Grande do Sul o hábito do chimarrão é agregador, ele reune os amigos em um círculo conhecido como roda de chimarrão. Cada componente toma uma cuia, sorvendo o líquido até fazê-lo roncar e passando em seguida para o amigo ao lado. Como não moro mais no Rio Grande e a maioria das pessoas que conheço aqui em São Paulo não tem esse hábito, tomo sozinho o meu mate diário. A erva, além de ser de boa qualidade, precisa ser nova e bem verdinha. Meu falecido pai era adepto da marca Tertulia e em uma ocasião, quando relatava ao representante da marca que faria uma viagem a Roma, este propôs um desafio a meu pai: Se ele tirasse uma foto com um pacote da erva em frente ao Coliseu, não precisaria pagar pelo produto durante um ano. E assim foi: Meu pai tirou a foto, trouxe-a para o amigo, que mandou publicá-la no jornal local e forneceu Tertulia de graça para nós por doze meses. Como se pode ver, assim como o chá dos japoneses, o nosso chimarrão também tem lá suas minúcias e delicadezas. Na foto, meu pai levando a erva para passear.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A ELEGÂNCIA DO OURIÇO

Meu amigo G. Comini, com quem troco impressões sobre amenidades como a arte e o sentido da vida, me indicou a leitura de A Elegância do Ouriço, de Muriel Barbery. Já bastante atraído pelo título, fui atrás dessa verdadeira obra de arte que tem me consumido os dias quentes desse verão incomum. Um livro para quem gosta realmente de ler e, sobretudo, para os amantes da língua, seja ela qual for. No nosso caso, a portuguesa. Não cheguei sequer à metade do volume, que tem trezentas e cinquenta páginas. É que leio atentamente, releio certas passagens, sublinho e paro a leitura para pensar sobre o que ela propõe. G. é um artista cujo trabalho é composto de pequenas gravuras que ele recorta e cola até formar inacreditáveis colagens, cheias de beleza e reflexão sobre os mais variados temas tais como vaidade, ambição, narcisismo, solidão. Um verdadeiro ourives a tecer filigranas. Obviamente uma indicação sua não poderia ser desprezada. E assim fui fisgado por essa leitura, por esses personagens que, como nós, buscam sentido para suas vidas. Um romance instigante, para dizer o mínimo. Isso sem falar que a história se passa em Paris... Disse tudo, não? Il faut le lire. Descobri na internet que já foi filmado e estou louco para assistir. Depois de terminar a leitura, evidentemente. Se alguém souber onde posso encontrar esse filme me avisa aqui? Merci.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

PARA UM AMOR NO RECIFE

Esse é o título de uma canção de Paulinho da Viola, também gravada por Marina Lima, que é bastante apropriado para esse post. Adoro essa música e a idéia que ela me passa, de amores regionais, localizados espacialmente em lugares distantes. Um amor em cada porto, como os marinheiros. O Brasil tem isso, esses encantamentos regionais. A cada estado ou região que se vai, um mundo novo se descortina e parece que você nem está no seu próprio país. Esses mundos novos trazem, por vezes, pessoas encantadoras. Que surpreendem ao primeiro encontro. Com um gesto. Com atitudes. Com palavras. E as palavras, quando bem utilizadas, no timing certo e com a dose adequada de bom humor & champanhe, têm o poder de uma poção mágica, aqueles líquidos encantadores que hipnotizam, prendem, trazem de volta a pessoa amada em três dias e etc, com pagamento pós-resultados... E, ao contrário dessas panaceias apregoadas por videntes e adivinhos de araque, as palavras têm poder. O poder de render o visitante apaixonado e irremediavelmente preso ao ser que as profere. Acontece com qualquer um. No Recife ou em qualquer outro lugar. De Recife pode ir para Salvador, Brasília ou, até mesmo, Buenos Aires. E lá ficar. Em meio a tangos, livrarias, boates ou jardins. Às vezes, o encontro certo na hora errada. Ou talvez a pessoa errada na hora certa, mas mesmo assim que tal ver no que vai dar? Já sabemos no que vai dar: É lindo enquanto dura. Depois, quem sabe, é chorar todos os dias... Como dizem os versos de Paulinho da Viola: “Quero fechar a ferida. Quero estancar o sangue”. Embalado por canções de amor... “Meu amor eu não me esqueço, não se esqueça, por favor”. Bebendo vodka com qualquer coisa... “Eu voltarei depressa, tão logo a noite acabe”. Lembrando de cada quarto de hotel... “Tão logo esse tempo passe, para beijar você”. Esperando que um dia consiga esquecer... “A razão porque mando um sorriso e não corro”. Ou, como em Surabaya Johnny, de Brecht & Weill: "Acordar numa cama barata e ouvir o barulho do mar. Teu navio partindo pra longe, indo embora pra qualquer lugar". E o nosso Brasil vasto, enorme, continental, segue sempre a surpreender. No Recife ou em qualquer outro lugar... Na foto, Paulinho em si lembrando, quem sabe, de um grande amor.