domingo, 24 de julho de 2016

BYE, BYE LIDOKA

Acabo de chegar da cerimônia de despedida da minha amiga Lidoka, que nos deixou nesse fim de semana. Às vezes tenho a sensação de que o mundo está ficando cada vez mais chato e sem graça, tal a quantidade de pessoas bacanas que tem partido dessa pra melhor. Mas, como já andei falando muito de tristezas por aqui recentemente, vou tentar me concentrar nas coisas boas e alegres. Até porque, e quem conheceu Lidoka sabe, ela era pura alegria... Sua despedida não poderia ter sido diferente e teve direito a coro, puxado pela frenética Duh Moraes e entoado por todos os presentes, para Dancing Days e A Felicidade Bate À Sua Porta, dois hits das Frenéticas que embalaram gerações. Amigos falaram coisas lindas, seu filho Igor agradeceu a todos que estiveram juntos dando força e ao som de Viva Lidoka um grande aplauso encerrou a despedida... Cheguei em casa e fiquei lembrando da minha amiga. Da sua alegria contagiante, seu otimismo, sua força, sua eterna batalha. Nascemos no mesmo dia, vinte e cinco de abril, e por isso ela dizia que éramos irmãos astrais. E acho que éramos mesmo, tal a nossa sintonia desde a primeira vez que nos vimos no camarim do Teatro do Leblon, no ano de 2004, quando eu estava em cartaz com a Terça Insana e ela apareceu para nos vender as suas adoráveis bandocas... Em duas ocasiões tivemos o prazer de comemorar juntos o nosso aniver: Em 2005, quando eu ainda estava em cartaz no Rio e fizemos uma festa na casa da nossa amiga em comum Beta Leporage, e em 2012, quando ela estava em São Paulo e reunimos as turmas, a minha e a dela, no restaurante Jardim de Napoli... Sempre que vinha ao Rio, eu a procurava e invariavelmente nos encontrávamos para assistir ao por do sol no Arpex, o ponto da praia em Ipanema que ela amava. Aliás, circular com a Lidoka pelas ruas de Ipanema era a certeza de encontrar sempre novas pessoas, pois ela conhecia todo mundo e apresentava todos os seus amigos uns para os outros... Através dela tive o prazer e a honra de conhecer Ezequiel Neves e juntos assistirmos ao show Inclassificáveis, de Ney Matogrosso, no Canecão... Para mim o Rio de Janeiro não será mais o mesmo sem ela. Acho também que já não existem mais muitas pessoas como ela, eu pelo menos não conheço nenhuma. Sempre tinha um poema ou uma canção na ponta da língua e, onde quer que a gente estivesse, ela fazia suas performances em alto e bom som. E as histórias... ah, quantas histórias! Era um arquivo vivo da MPB, da TV Globo e da vida cultural carioca e brasileira em geral. Adorova deixá-la falar sem parar das histórias das Frenéticas, das Dzi Croquetas, dos Dzi Croquetes e de tudo o mais que vinha junto no pacote... Ai, como vou sentir falta da Lidoka! As Frenéticas embalaram muitas festas da minha juventude. E o dia-a-dia também. Ainda bem que tenho quase tudo em vinil e em CDs. Mas as melhores lembranças da minha amiga eu tenho guardadas comigo na minha memória e no meu coração. Vai em paz, amada, e leve com você o seu sonho mais louco... Te amo forever!
Nas fotos, um dos nossos entardeceres no Arpex e comemorando nossos anos chez Beta.

terça-feira, 19 de julho de 2016

LIMITE BRANCO

Querida Paula,
Naquele dia do seu debate saí do Sesc e fiquei andando pelas ruas de Copacabana com uma pulga atrás da orelha: Como é que eu, um leitor tão apaixonado pela obra de Caio Fernando Abreu, que tanto admira os seus contos e crônicas, ainda não havia lido seu primeiro romance, Limite Branco, escrito quando ele tinha apenas dezenove anos? Fui tomado por uma enorme curiosidade de saber como escrevia na SUA adolescência aquele escritor que eu tanto admirava na MINHA adolescência. E foi com enorme satisfação que hoje concluí a leitura dessa pequena joia. Joia não apenas pelo conteúdo, mas também pelo formato, bastante moderno para a época em que foi escrito. Além da enorme satisfação estética que a leitura me proporcionou, por poder identificar já no seu primeiro livro grande parte das características de sua obra que sempre me cativaram, tive também a satisfação pessoal de descobrir o quanto o adolescente Caio se parecia com o adolescente que eu fui. Apesar dos quase vinte anos que os separaram. Revi minha solidão, meu isolamento, meus eternos questionamentos sobre o sentido de tudo. Minhas pequenas revoltas com o estabelecido, minha necessidade urgente de mudanças, as angústias resultantes da consciência que eu cria ter. Consciência essa que, apesar de me fazer insatisfeito, não me levava necessariamente a nenhuma espécie de ação transformadora. Como ele, eu também sou do interior do Rio Grande do Sul, de Soledade, e aos catorze anos fui para Porto Alegre, por vontade dos meus pais, para fazer meus estudos do segundo grau e da faculdade. Revi minhas andanças pelo centro da cidade, o Guaíba, a Rua da Praia. Meu pensamento que se expandia de frente para a imensidão do rio que eu já ambicionava mar. E principalmente algo que defino como um certo “gauchismo”, que é uma visão das coisas e das pessoas que nos cercam com uma superioridade ingênua, que vem com um quê de julgamento, como se observássemos tudo e todos de cima, nos dando conta do ridículo e da pequenez alheias. O próprio Caio afirma, no prefácio de 1992, quando fez a revisão da obra, ter sido quase insuportável reler o que escrevera. Sinto a mesma coisa quando releio meus escritos adolescentes que ainda guardo a sete chaves... Que bom que você, Paula Dip, vai lançar um livro com cartas que Caio escreveu para Hilda Hilst nesse período. Isso irá nos revelar ainda mais do menino escritor que já se anunciava. Espero que seja mais um grande sucesso, como foi o seu Para Sempre Teu, Caio F...
Aguardo ansiosamente pelo lançamento. Para sempre teu,
Roberto Camargo.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

JULIETA SEM ROMEU

Dia desses, fã de Almodóvar que sou, fui correndo ao cinema para conferir Julieta, sua mais recente película. É um belo filme, sem dúvida. Uma boa história, contada, dirigida, roteirizada, fotografada e montada divinamente, como só Pedro sabe fazer. Mas fiquei com a sensação de que faltava alguma coisa. Depois que saí do cinema e fiquei pensando mais a respeito do filme (e bebendo, evidentemente) cheguei à conclusão de que não faltava alguma coisa: Faltavam muitas! Muitas das coisas que, para mim, caracterizam o cinema Almodovariano e o fazem tão encantador ao meu gosto pessoal. Sem sombra de dúvida, é muito autoral, muito Almodóvar. Desde o primeiro take, com o tecido vermelho do vestido de Julieta se movimentando lentamente em close. Mas é um Almodóvar light. Como diz a canção de Djavan, fica faltando um pedaço. Para começo de conversa, não tem travesti. Nenhumazinha. Nem ao menos uma bicha mais afetada. Aliás, bicha nenhuma. Tipo Benedito Ruy Barbosa. Ninguém bebe nem se droga. A protagonista, inacreditavelmente, nem ao menos fuma! E estou me referindo a cigarro mesmo, dos caretas. Um baseado, então, nem pensar. Não toca um só bolero na trilha! Nenhum!! Às vezes fica parecendo uma novela de televisão, tal a assepsia. Ninguém toma barbitúricos, ninguém sai na noite, ou seja: Não tem bas-fond. Fica parecendo, sei lá, avião sem asa, fogueira sem brasa, Buchecha sem Claudinho... Quero meu Almodóvar de volta! Com taras, fetiches, obsessões, perversões, marginais, excluídos, traficantes, dependentes químicos, toda a fauna, a flora & o mundo mineral. E, sobretudo, com seu humor cáustico, ferino, deliciosamente debochado...Minto! Tem, ao menos, Rossi de Palma, divina como a velha empregada obcecada pelo patrão. Que vai envelhecendo ainda mais durante o filme e está divina. Mas é só. E, claro, as cores e padronagens que vão de vestidos a papéis de parede. Mas falta. É como dieta sem carboidrato. Cerveja sem álcool. Café sem cafeína. Julieta sem Romeu. Eu, assim sem você... Justiça seja feita: Romeu tem. E que Romeu! Um bofe escândalo, digno do Banderas dos primeiros filmes... Brincadeiras à parte, é um filme lindo. Eu gostei. Mas, por motivos óbvios, não amei. E, como a esperança é a última que morre, fiquei esperando até o fim que a filha voltasse operada, como um homem trans. Mas nem isso...
Na foto, Adriana Ugarte sob o olhar atento do mestre espanhol. #julieta #almodovar

quarta-feira, 13 de julho de 2016

EPIFANIAS REAIS

Tenho passado agradáveis dias na companhia de Caio Fernando Abreu. Explico: O Sesc Copacabana está apresentando, desde o dia seis de junho, a ocupação Caio F Epifanias. Além da exposição Doces Memórias, que é permanente, a programação traz teatro, música, dança, cinema e debates até o dia sete de agosto. É muito tempo na companhia de alguém tão bacana como Caio e que já nos deixou há inacreditáveis vinte anos! Tem sido um deleite para mim, além de rever amigos, rever muito do escritor, sua obra e sua controversa persona. Quem me conhece e/ou segue o blog sabe da minha rápida convivência com ele nos seus cinco últimos anos de vida e o quanto isso foi belo e significativo para mim. Corre entre amigos e conhecidos em comum que Caio deixou muitas viúvas. Seriam os vários amigos e amigas que brigam pelo direito a perpetuar a sua memória. Como se isso fosse necessário, imaginem, logo agora que ele se transformou em fenômeno cult da internet... Assim sendo, já estive visitando a exposição na companhia de Grace Gianoukas, em pausa de gravações da novela Haja Coração, que aproveitou para dar uma entrevista a uma revista de celebridades enquanto nos revíamos e visitávamos juntos os recantos da memória de Caio. Estive também no debate Caio F Uma Vida Encenada, com os queridos Luís Arthur Nunes, Gilberto Gavronski e Renato Farias, no qual se falou sobre a dramaturgia de Caio e as adaptações de sua obra literária para o teatro. Outro debate que presenciei foi Caio F Vida & Ficção, com Paula Dip, João Silvério Trevisan e Luiz Fernando Emediato. Esse pegou fogo, com prós e contras surgindo o tempo todo e revelando a multifacetada personalidade do controverso personagem em questão e o quanto sua vida e obra estão entrelaçadas... Maravilhoso e aconchegante foi o show de Marina Lima e Cida Moreira no qual elas apresentaram músicas de que Caio gostava enquanto Candé Salles lia trechos da obra dele que se referiam às duas cantoras. Emocionante. Candé, aliás, em outra noite, apresentou e debateu seu filme Para Sempre Teu Caio F, do qual participo como ator interpretando A Lenda das Jaciras, texto em que Caio define e classifica de forma hilariante os tipos de gays existentes no mundo. E ainda tem muito mais. Amanhã, por exemplo, irei assistir ao espetáculo Como Era Bonito Lá, que a atriz Nara Keiserman concebeu a partir de cartas e entrevistas de Caio. E a coisa segue até agosto com extensa programação prevista. Fiquei muito feliz com essa iniciativa do Sesc. Fala-se que o Brasil é um país sem memória mas, felizmente, isso parece estar sendo aos poucos corrigido. Principalmente por propostas como esta. Através dela percebe-se o quanto a memória de Caio ainda está viva e o quanto ela perdurará... Viva Caio Fernando Abreu!
Nas fotos, visitando a exposição na companhia de Grace, o abraço de Cida & Marina e reencontro com Luisar e Gilberto.