terça-feira, 28 de agosto de 2012


A VELHA
Não acredite no título dessa peça. De velha, ela não tem nada. Muito pelo contrário. Eduardo Esterblitch prova, com mais esse espetáculo, que é a melhor novidade no humor brasileiro. Um vento de originalidade sopra desde que se entra no teatro ao som de uma seleção musical de primeira. E a peça ainda nem começou. Quando o pano abre, o inusitado se estabelece: Trilha, luz, cenário, tudo fala, tudo comunica. Em seguida, entra o primeiro e surpreendente personagem: Uma porca. Ela anda pelo cenário, come, deita, dorme, acorda, anda e come novamente. E, por fim, ela, A Velha em si, adentra a cena. Música, fumaça, ação. Eduardo Esterblitch domina espaço e audiência do momento em que pisa o palco até deixá-lo. Tudo o que faz e diz tem alguma relevância, mesmo que, às vezes, só para ele. Ou para a sua geração. A Velha diverte e puxa as orelhas. Afaga e dá tapas na cara. De qualquer maneira, sacode a mesmice. Eu pensava que Grace Gianoukas era a nova Dercy Gonçalves. Era. Até o surgimento dessa velha. Eduardo é a nova Dercy. Faz o que quer em cena. Abandona e retoma a história ao seu bel prazer. Improvisa. Incomoda. E faz isso com tal habilidade, carisma e timming, que é um enorme prazer acompanhá-lo. Essa velha é muito da safada, também. Bebe, fuma, fala palavrões e dispara sua metralhadora de impropérios para todos os lados. Cutuca com vara curta a burrice estabelecida. E dispara: No meu tempo, quando os jovens queriam dizer alguma coisa, escreviam livros... Bem, no caso de Eduardo Sterblitch, peças de teatro. E essa, ao invés de A Velha, deveria se chamar A Boa Nova...
É imperdível. Mas, se você ainda não foi, perdeu. Ontem foi o último dia...

sexta-feira, 24 de agosto de 2012


WELCOME, NEW SONG
Eu não podia ter trazido companhia melhor para passar uns dias comigo em Ilhabela (além, é claro, do Weidy recém-chegado de Londres): O álbum Estrela Decadente, de Thiago Pethit. Ele, que já me encantara com seu Berlim, Texas, agora me conquistou definitivamente. Impossível não se deixar levar. Gosto de iniciar a audição pela última faixa: Surabaya Johnny, de Bertolt Brecht e Kurt Weill, que o produtor Kassim transformou em fanfarra que adentra uma pequena cidade anunciando a chegada do Grand Circo. E a função traz artistas ilustres no programa: A cantora Cida Moreira empresta seus graves, agudos e savoir-faire acrescentando ainda mais brilho ao já imperdível espetáculo.  A doce Malu Magalhães nos faz lembrar como era bom ter vinte anos e ser feliz... As guitarras nos transportam para os anos sessenta. E Thiago soa, na boa, ora Lou Reed, ora Devendra Banhart. Ora Mutantes, ora Serge Gainsbourg, como sugere, sutilmente, a capa do CD. Jovem poeta, compositor e cantor. Desde Cazuza, quem o seria? Sim, trata-se de uma estrela. Sans aucune décadence... Thiago Pethit é uma boa nova para quem gosta de boa música. Bom saber que ainda se faz música de qualidade. Em um contexto musical estranhíssimo, no qual até Marisa Monte se rende a uma espécie de pop brega, Thiago é luz, é raio, estrela e luar... Aumente o som, abra a garrafa de vinho, jogue um lenço de cores quentes sobre o abajour. Fumaça, copos, cigarros, batom. A festa vai começar. So long, new love. Welcome, new song...

quinta-feira, 23 de agosto de 2012



FELICIDADE
Enquanto faço meu cooper na areia, observo alguns casais que repousam nas suas espreguiçadeiras. Fico pensando se eles compraram aqueles pacotes que pregam: A felicidade é ficar sem fazer absolutamente nada a não ser encher a pança de cerveja de frente para o mar. Saia da rotina em suaves prestações. Só alegria com traslado e café da manhã incluídos. Incluídos, não. Inclusos, para usar um termo bem comum a essas promoções. As fotos, devidamente postadas ao vivo em todas as redes sociais, com certeza (outro termo bastante usado nesses casos) serão seguidas de comentários do tipo: Ê vidão... Tá loko, só curtindo... Você merece, velho...E por aí vai. À noite, pelo amor de Deus, não marca nada cedo. Só depois da novela. E quer saber? Talvez felicidade seja isso mesmo! Oi oi oi...

quarta-feira, 22 de agosto de 2012




MAIS QUE A PAIXÃO

Retomo o hábito, há muito tempo deixado para trás, de escutar o álbum Circense, de Egberto Gismonti, que contém uma das mais belas canções da minha trilha sonora pessoal: Mais que a Paixão. Agora, por exemplo, estou em Ilhabela, de frente para um céu lindamente estrelado, ao som dessa canção, me perguntando como pude ficar tanto tempo sem ouvi-la... Eu tenho, desde os anos oitenta, o LP. Mas há muitos anos não tenho mais toca-discos e nunca encontrei em CD. Agora, moderno que sou, tecnológico que me tornei, baixei o álbum no meu iPad. A canção diz: Não espere de mim nada mais que a paixão. Como se paixão fosse pouco! Às vezes paixão é, simplesmente, tudo. Tudo o que se pode esperar. Tudo o que poderia salvar a vida de uma pessoa. Ilhabela, por exemplo, é amor. Fazia quase dois anos que não vinha e ela está aqui, linda, perene e bela na sua constância. O oposto da paixão, inconstante, fugaz, bipolar eu diria. Mas tão necessária! E a canção segue dizendo coisas como: A infinita vontade de arrancar de dentro da noite a barra clara do dia. Isso não é total e completamente paixão? Querer o impossível, desejar o inatingível, para, logo em seguida, deixar de querê-lo? Botar fogo na água, nublar o visível, confundir a compreensão, ofuscar as idéias... E Gismonti prossegue: Não espere encontrar numa canção nada além de um sonho. Nada além de uma ilusão. Transposto para a obviedade esvaziada de sentido das canções de hoje em dia, esse verso provavelmente diria: Não espere encontrar numa canção nada além de um tchu. Nada além de um tcha. E tchum tcha tcha tchum tchum tcha! Brincadeira. O vinho já está subindo à cabeça. E eu espero encontrar muito mais que a paixão nesses dias em Ilhabela. Às vezes a gente deseja mesmo é arrancar de dentro da noite a barra clara do dia. Nem que seja em sonho. Ou, quem sabe, em poesia. Ou talvez numa ilusão...

domingo, 12 de agosto de 2012



TUDO PASSA...
Dizem que na vida tudo passa. Até mesmo as uvas! (Desculpem, não resisti). Mas houve um tempo em que tudo passava – literalmente - em frente à minha casa. Morávamos na avenida principal de Soledade, que corta a cidade de um lado ao outro. Guardando as devidas proporções, seria mais ou menos como morar em plena Avenida Paulista, aqui em São Paulo. Assim, vivíamos em uma espécie de camarote diante do qual a vida desfilava. Tudo era tão simples... No mês de setembro, um cortejo de cavaleiros, com seus trajes típicos, passava anunciando as comemorações da Semana Farroupilha. Havia também o desfile das candidatas à Primeira Prenda, que vinham sentadas sobre o capô dos carros acenando como misses. Isso também acontecia no verão, com as candidatas a Rainha das Piscinas, e quando havia a escolha da Rainha do Baile do Chopp. No Sete de Setembro eu adorava ver passar a banda do Grupo Escolar Álvaro Leitão, cuja ala Contos de Fadas, vinha cheia de personagens das histórias infantis. My own Disney Parade... Circos e teatros mambembes anunciavam seus espetáculos com carros de som, o que continua acontecendo até hoje. Alguns anos atrás eu estava de férias em Soledade e, ao ver passar um desses carros anunciando uma função para a noite, Igor, o filho da empregada da minha mãe, que na ocasião devia ter uns seis anos de idade, me perguntou: Tio Beto, lá em São Paulo tem um carro que passa anunciando a Terça Insana? Ri da ingenuidade daquela criança, cujas referências se limitavam ao que passava diante da minha casa. Igor certamente não imagina, mesmo hoje que já é um jovem, as dificuldades para se divulgar um espetáculo em uma grande cidade. Mas isso já é outro assunto... Nunca esqueço de uma corrida de carros que aconteceu em plena avenida. Colocaram cordões de isolamento nas calçadas e nós, as crianças, fomos proibidos de ficar sobre elas. Eu e meus amigos subimos na casa e assistimos à corrida de cima do telhado... Mas nada se compara ao dia em que um elefante passou anunciando a chegada de um circo. Felizmente deu tempo de correr para pegar a máquina fotográfica e registrar... Tudo era tão simples, volto a dizer. Vivemos, hoje, a era do espetáculo. Não me refiro às artes nem ao entretenimento, mas à espetacularização da própria vida. Não temos mais a vida como ela é. Mas, sim, como ela deveria parecer aos olhos dos outros. Por que será que isso não me impressiona? Por que não tem a força do elefante desfilando em frente à minha casa do interior? A avenida continua lá, testemunhando sabe Deus que atuais cortejos... Aquele tempo passou, levando consigo os eventos que por lá desfilavam. Eu continuo passando, assim como as uvas e tudo o mais. E os cães, que ladrem...

quinta-feira, 2 de agosto de 2012



IGREJINHA
Desde o mês de maio deste ano São Paulo ganhou um lugar agradabilíssimo para se tomar uns "bons drink" com os amigos: O bar Igrejinha, do meu amigo Ricardo K. O ambiente é super descontraído, parece que a gente está em uma festa, tal a quantidade de pessoas legais e conhecidas reunidas. O Ri é aquela simpatia que vem de anos, todo trabalhado na gerência do Ritz: Querido, fofo, atencioso, esperto, ligadérrimo, organizado, eficiente, enfim, japa. Isso sem falar no igualmente querido sócio-gato Eduardo Revi... A decoração justifica o nome da casa, com muitas imagens de santos e símbolos religiosos mas, of cours, com pegada iconoclasta à la Madonna, presença musical constante na trilha sonora da casa. Assim como Hercules and Love Affair e quetais. O Ricardo também é excelente barman e faz o melhor Whisky Sour de São Paulo, na minha opinião. Diz ele que faz o melhor Cosmopolitan, mas isso eu não sei, acho Cosmopolitan muito girlie. Prefiro bebida de macho! Aloka... Eu contribuí modestamente para a decoração da casa com a doação de uma imagem de Santa Maria Madalena, que ganhei da minha amiga Claudia Wonder, que Deus a tenha em sua glória. Certa feita, Claudia tinha montado um enorme altar na entrada de seu apartamento, espécie de santeria que reunia dezenas de imagens dos mais diferentes credos. Sua mestre e guru achou que a presença maciça de santos guardando a casa da amiga a estava oprimindo e pediu à Claudia que se desfizesse do tal altar. Foi quando ela me presenteou com a Santa Maria Madalena, protetora dos artistas, das prostitutas, do povo da noite em geral. Não poderia estar, portanto, em melhor lugar... Não deixe de conhecer o Igrejinha: Fica na rua Fernando de Albuquerque, número 302. É quase em frente ao Mestiço, tem um neon com o nome na fachada, não tem como errar! Sempre que posso eu passo lá para dar uma rezada. E umas risadas também... Bons drink!
Na foto, o incrível Whisky Sour do Ricardo.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012



O DIA QUE BETINA BOTOX FOI A PARIS

Betina não acreditou quando entrou na aeronave da Air France – classe executiva – e a aeromoça lhe ofereceu champanhe... Finalmente ela iria conhecer a cidade com a qual sempre sonhara... Estava tão ansiosa, nervosa e excitada que, junto com o champanhe, resolveu tomar um Lexotan. Instantes depois, apagou. Não percebeu a travessia do oceano, o desembarque, a alfândega, nada. Quando recobrou os sentidos já estava bebendo com as amigues em um barzinho do Marais. Estavam todas excitadíssimas com o show de Lady Gaga a que assistiriam logo mais, à noite. Afff! Show da Lady Gaga? Não posso perder! Mas, e o ingresso? Indarguiu. Em seguida as amigues mexeram os pauzinhos e um ingresso, lindo e pink, chegou às mãos de uma incrédula Betina ainda no jet lag... Mais uns drinks e barzinhos depois, ainda deu tempo de passarem no apartamento de uma delas para um rápido esquenta. Betina ficou passada quando viu o apê da amiga, na rue de Rivoli, com vista para o Hôtel de Ville. Na sacada, teve surtos estéticos que levaram as amigas a fotografá-la em ensaio totalmente inaudito! Mais uns drinks e clics e ela já se encontrava em pleno ginásio, de frente para o palco, esperando sua diva pop entrar em cena... Mesmo do alto dos inseparáveis saltos, Betina, pequeninha que era, mal conseguia ver La Gaga. O que não era problema, pois as outras bees a erguiam nos braços e ela se deleitava com os modelos escândalo da cantora... De repente, um empurra-empurra, um desconforto, cutucadas indesejadas. Pára, não empurra! Não empurra! Não empurraaa... Ei, garoto, acorda! Betina não acreditou quando viu o condutor sacudindo-a no último banco do último vagão do trem que a levava para casa. Como assim? E Paris? E as amigues? E a Lady Gaga? Que mané Lady Gaga, menino. Eu, heim? Disse o condutor. Você já está em Itaquera! Aff, ela pensou. O after foi babado...