sexta-feira, 19 de abril de 2024

SOUVENIRS DE PARIS

Nunca se falou tanto em Paris na mídia como agora que as Olimpíadas se aproximam. Só que para mim isso começou há muitos anos... Aliás, pode-se dizer que tudo já foi dito sobre Paris. Não apenas dito, mas também cantado, pintado, fotografado e filmado. Ela está em Hemingway e em Cole Porter; em Toulouse Lautrec, Man Ray e Gertrude Stein; está em Stanley Donen, Richard Quine e Woody Allen. E também na memória de todos os que nela moraram, namoraram, viveram um grande amor ou mesmo a visitaram apenas uma única vez. Paris é de fato inesquecível. Com suas belezas e feiúras… Recentemente me caiu às mãos um romance de Julio Verne chamado Paris no Século Vinte. O autor, famoso por suas antecipações do futuro, das invenções e da tecnologia, antevê em pleno século dezenove o que se tornaria a capital francesa no século seguinte. Com espantosa fidelidade! Entre os romancistas contemporâneos me encantam muito Paula McLain e seu Casados com Paris, livro que retrata o amor, a traição e a ambição do jovem Ernest Hemingway e sua primeira esposa nos anos loucos da Paris do início do século passado; e também Marc Lévy, com o romance P. S. de Paris, que narra as aventuras amorosas de uma atriz inglesa e um escritor americano que buscam mudar suas vidas na Cidade Luz… Não me canso de rever o filme Meia-noite em Paris, de Woody Allen, assim como Cinderela em Paris e Quando Paris Alucina, ambos protagonizados por Audrey Hepburn e, claro, a série Emilly in Paris… Queria muito enjoar da cidade ou, como dizemos no Sul, “pegar nojo” de Paris. Assim não sentiria tanta falta de visitá-la, de flanar pelas suas ruas e redescobri-la a cada vez que lá voltasse. Queria implicar com seus garçons, geralmente mal humorados e sem paciência para qualquer tentativa de alteração do cardápio, com seus edifícios de seis andares sem elevador, com sua ausência de ar condicionado em pleno verão… Mas não posso, não consigo, é mais forte do que eu. Fico com as cerejeiras em flor, os gatos nas vitrines e telhados, os telhados, os barcos que deslizam pelo Sena, os acordeonistas de rua, os museus, teatros e galerias, os parques e jardins; os cafés com mesas na calçada, as coupes de champagne, os entardeceres em frente à Tour Eiffel... Sigo amando essa cidade que me arrebatou no começo dos anos noventa e, mesmo sem vê-la há nove anos, me mantenho fiel ainda que à distância… Espero que as Olimpíadas passem logo, a mídia esqueça um pouco da cidade e a multidão de estrangeiros vindos de todos os cantos do mundo a desocupe para que ela volte a ser só minha. Mesmo que seja apenas na minha imaginação… Nas fotos, eu novinho na Paris dos anos noventa, a Place des Voges e o Canal Saint Martin iluminado ao entardecer.

domingo, 14 de abril de 2024

O CIRCO CHEGOU

Essa semana que passou fui assistir ao espetáculo Cabaré Coragem, do Grupo Galpão, no Sesc Belenzinho. Era uma quinta-feira à noite, eu estava cansado dos ensaios da semana, essa unidade do Sesc é longe pra caramba, andei, peguei metrô, fiz baldeação na República, andei mais e finalmente cheguei. O importante aqui é que: Valeu a pena! Assim que o espetáculo começa, ou antes mesmo dele começar, a gente é levada a entrar no clima pelos atores que já circulam, oferecem bebidas, se comunicam com a plateia. A música é constante e super envolvente, descontrai, faz rir, não tem como não se entregar para a proposta. Que deleite esse espetáculo! Cida Moreira, que participou do processo de criação, já havia me antecipado que era o máximo. Pois é: Emociona, encanta, transporta para lugares recônditos da memória e, sobretudo, diverte. Uma troupe afinada e talentosíssima se reveza em textos, canções e instrumentos. Eu, que nasci e cresci no interior do Rio Grande do Sul, tive a sensação de que o circo havia chegado à minha pequena cidade. Ou que o velho teatro de lata estava outra vez em cartaz. Ou ainda que o meu teatrinho de garagem tinha voltado a cartaz... Eles sempre chegavam trazendo esse encantamento, essas surpresas, alegrias e emoções. E tudo o que eu via, assim que chegava em casa tentava reproduzir... Nunca esqueço de uma vez que vi passar um elefante em frente à minha casa, em Soledade, anunciando a chegada de um circo... Cabaré Coragem vai de Brecht e Weill a Calcinha Preta e Valeska Popozuda. Passando por Boris Vian, Rita Lee e Caetano Veloso. Inês Peixoto é a mestre de cerimônias, que conduz com maestria e versatilidade o show de variedades que a troupe apresenta, cantando, dançando e interpretando com talento que enche os olhos e a alma. Teuda Bara, a decana da toupe, personifica a propriétaire que, do alto da sua sabedoria e experiência, procura espremer o que pode de seus sonhadores artistas. Poético, singelo e pungente. Tão bom, mas tão bom quando um espetáculo de teatro consegue fazer isso com a gente. Comigo, pelo menos. Assisto a tantas coisas (cada vez menos) que deixam tanto a desejar. Já andava sedento dessa comunhão, dessa catarse. Todos os outros atores, Antonio Edson, Eduardo Moreira, Lydia del Picchia, Simone Odornes e Luiz Rocha tem seus momentos, encantam, surpreendem, realizam façanhas e arrancam aplausos sem ter fim. Fui às lágrimas com Teuda Bara cantando Mamãe Coragem, de Caetano, gravada por Gal. E também com a canção Perigosa, de Rita Lee, sucesso das Frenéticas, grupo do qual fazia parte minha saudosa amiga Lidoka. Que noite inesquecível de quinta-feira! Com direito a vinho, conhaque e cachacinhas... Longa vida ao cabaré do Grupo Galpão! Nas fotos, Teuda Bara, Inês Peixoto, Eduardo Moreira, Antonio Edson e a troupe toda agradecendo os merecidos aplausos.

quinta-feira, 11 de abril de 2024

ABRIL A MIL

O mês de abril chegou me levando de volta à sala de ensaio! Graças a Deus. Já estava tendo síndrome de abstinência do palco...Retomei os ensaios do meu solo Caio em Revista que vai estrear no dia onze de maio aqui em São Paulo, no teatro Viradalata. Já não era sem tempo! Venho trabalhando neste projeto desde o ano de 2017. Foi quando comecei a pesquisar os textos, depois adaptei-os para o teatro, confeccionei o roteiro e veio a pandemia que fez com que tudo parasse. Em 2022 iniciamos o processo de montagem com ensaios alternados na casa do meu diretor Luís Artur Nunes e na minha. Em seguida começamos a apresentar os ensaios para amigos, ainda nas nossas casas. Nesse meio tempo, dois produtores nos inscreveram em editais e em prêmios nos quais não fomos contemplados. Até que no início desse ano eu disse para mim mesmo que de 2024 não passaria. E não passou! Arregacei as mangas e resolvi fazer o que fosse possível para tirar esse projeto da gaveta e jogá-lo no palco. Graças às contribuições inestimáveis de Luís Artur, Patrícia Vilela, Alexandra Golik, Émerson Brandt, Guto Lacaz, Mareu Nietsche, Claudia de Bem, André Omote, Cabral e Gerardo Franco consegui levantar o mínimo indispensável para a realização desse sonho, ainda que em caráter de work in progress... Sem falar que, para que eu tivesse acesso aos textos, totalmente inéditos em livro e apenas publicados em revistas dos anos oitenta, me abriram seus guardados Cida Moreira, Luiz Henrique Campos, Samuel Oliveira, Odilon Henriques, Marcos Breda e Humberto Vieira. Inestimável também tem sido a colaboração de Sylvia Moreira e Celso Frateschi nos cedendo o espaço do seu lindo Teatro Ágora para os ensaios. Como se pode ver, teatro definitivamente não se faz só, mesmo quando num caso como este, se trata de um monólogo... O que quero dizer aqui é que tenho andado afastado do blog, escrevendo pouco, por este nobre motivo: Em maio estarei de volta aos palcos! E, evidentemente, minha cabeça agora está totalmente voltada para isso. Logo darei mais notícias por aqui. E logo mais, no dia 25 próximo, irei comemorar meus sessenta e um anos de idade em Foz do Iguaçu, a convite de minha irmã Raquél. Volto em cima da hora de estrear. A gente vai se falando... Bom mês de abril a todos! Na foto, eu ensaiando Caio em Revista no palco do Teatro Ágora.

quarta-feira, 20 de março de 2024

SONATA DE OUTONO

Nasci em um dia de outono. Hoje começo, portanto, a viver o meu sexagésimo primeiro outono... É algo a ser celebrado. O outono é uma estação amena, de temperaturas agradáveis. (Pelo menos vinha sendo assim até aqui. Agora, com as mudanças climáticas, o aquecimento global, tudo pode ser esperado). Ainda assim, uma estação do ano que não nos expõe a rigores climáticos como os do inverno e do verão. De uns anos para cá tenho me identificado mais com essa época do ano. Acho que estou a viver o outono da minha vida. O sol aquece sem queimar. A luz outonal dos dias é clara e incide de maneira a ressaltar as cores e texturas das coisas. As folhas vão amarelando até avermelhar e se desprender das árvores voando num balé aéreo em direção ao chão. Les feuilles mortes, de Jacques Prévert... Quando fui morar em Paris, no começo dos anos noventa, cheguei na cidade em pleno outono. Os plátanos davam um show de beleza nas ruas. Bem, tudo era beleza e deslumbramento para mim naquela época. Mas a primeira imagem da Paris outonal ficou impressa na minha memória. Como um cartão postal de dias felizes... Espero que o outono que hoje inicia nos aqueça o coração. Nos traga esperança e força para ir em frente. Nos anime a semear sempre, para ter melhores colheitas futuras. Se trata de renovação, de deixar caírem as folhas mortas para novos brotos desabrocharem. Teremos também a Páscoa que, para além da chocolataria que nos engorda, simboliza o renascimento do criador. Enquanto escrevo essas linhas minha cabeça é invadida por uma profusão de memórias de outonos passados, que não caberiam aqui nesse post. E de canções, como a de Roberto Carlos, que diz: "as folhas vão caindo e eu choro baixinho; mas tenho a esperança que ela vai voltar; as folhas quando caem, nascem outras no lugar"... Bom outono a todos!

quarta-feira, 6 de março de 2024

PERFECT DAYS

Ao me sentar diante do computador para escrever esse post devo confessar que ainda não sei muito bem o que vou dizer. É sobre o filme Dias Perfeitos, de Win Wenders, a que assisti ontem à tarde. Uma tarde quente de verão, abafada mesmo, com um vento que anunciava a chuva que estava por vir. O filme começou e foi, aos poucos, me transportando para uma outra dimensão. Acho que é isso, mas poderia ser também outra realidade, outro tempo, outras possibilidades de se viver. Quem espera encontrar ação ou aventura nos filmes, por favor, não vá porque não tem. Nem romance ou suspense. Nem mesmo uma história com começo, meio e fim. Mas do que se trata então? Trata-se de um poema filmado. Poesia feita de imagens e de sons. Acompanhamos o dia a dia do personagem Hirayama, funcionário da companhia de banheiros públicos de Tóquio. Sua rotina. Sua maneira de observar o mundo em volta. Seus rituais, seus hábitos, seus gostos particulares. Sua maneira de se relacionar com os outros. O filme tem um ritmo próprio, diferente do que estamos acostumados. E a vida, no filme, também tem seu próprio ritmo. Para começar, quase tudo no universo do personagem é analógico: Os livros que lê, as fitas K7 em que escuta suas músicas; a máquina fotográfica com a qual registra sua visão da cidade; o som da vassoura da vizinha varrendo a calçada, que o desperta todas as manhãs... Hirayama não vive preso ao celular, oh, libertação suprema! Imagino que a maioria das pessoas não tenha tempo para dedicar duas horas das suas atribuladas rotinas a esse filme. Ocupadas que estão com coisas importantíssimas como expor as próprias vidas nas redes sociais, por exemplo. Mas é uma pena que assim seja. Perdem muito. O filme abre uma janela no cotidiano. Nos arranca da nossa vaidade, do nosso egoísmo autocentrado. Nos dá a percepção da nossa própria futilidade... Termina com Hirayama dirigindo seu furgão da companhia de banheiros públicos ao som de Felling Good, na voz de Nina Simone. Emocionado, ele ri e chora. Em silêncio, como fica durante quase todo o tempo do filme. A trilha sonora, diga-se, é maravilhosa... Quando a sessão acabou, um temporal varria a cidade e a enxurrada cobria as calçadas da Rua Augusta, que tinha se transformado em uma grande cachoeira. Fiquei parado na porta do cinema esperando a chuva acalmar. Os carros parados em fila tentavam subir em direção à Avenida Paulista. Muitos desistiam, retornavam e desciam a Augusta de volta. O que tornava o caos ainda maior. Me veio à mente a música de Éric Satie. Alguns textos de Caio Fernando Abreu. São Paulo sendo São Paulo. Eu sendo eu. A vida sendo ela própria... Na foto, o ator Kõji Yakusho, que vive Hirayama, no cartaz de Dias Perfeitos.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

FEVEREIRO DUMP

No primeiro dia do mês minha gatinha Lina faz aniversário. Quatro anos... Vou com meu amigo Edson Cordeiro ver nosso amigo dj Eduardo Corelli tocar em um restaurante descolado no Bixiga... Fico encantado com a performance de Nilton Bicudo em O Antipássaro, espetáculo no qual ele transborda a poesia de Orides Fontela. Puro arrebatamento... Relembro um verão dos anos oitenta do século passado no Rio de Janeiro na companhia de amigos inesquecíveis... Meus pais em um antigo baile de carnaval no Clube Comercial de Soledade. A trilha sonora é Camisa Listrada, na voz de Carmen Miranda... Minhas irmãs e eu em um antigo baile de carnaval no Clube Comercial de Soledade. Ao fundo, Caetano Veloso canta Muitos Carnavais... Meu personagem ovino, uma ovelha inspirada no homem carneiro de Haruki Murakami, descansa a beleza com máscara de dormir deitada em um sofá no pós-carnaval. A imagem é embalada pela voz de Edson Cordeiro cantando Lovesong, da banda britânica The Cure... Relembro as queridas Lidoka e Claudia Wonder, que já viraram purpurina e iluminam o céu. Weidy e eu na praia de Ipanema (bronzeados, dourados e felizes) no verão de 2009... Para fechar com chave de ouro, assisto a mais dois espetáculos de teatro: Um com a maravilhosa Martha Mellinger (De Tanto Amar) e o outro com o surpreendentemente incrível e encantador João Côrtes (Invisível)... Essa foi uma tentativa de traduzir em palavras o que seria um carrossel de imagens do mês de fevereiro no meu Instagram. Um fevereiro intenso & variado. Bem como eu gosto! E boas águas de março a todos! Na foto, eu-ovelha descansa a beleza no pós-carnaval.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

INVISÍVEL

Escrevo ainda fortemente impactado pelo espetáculo Invisível, solo do ator João Côrtes, a que assisti ontem à noite no Teatro Renaissance. É a primeira vez que assisto ao trabalho desse jovem artista que, pelo que andei pesquisando, já tem dez anos de carreira. João encanta desde o primeiro momento em que pisa no palco. Com uma presença cênica eletrizante e um trabalho corporal invejável ele conduz a plateia através da violenta história de seu personagem, que é vítima de violência física e psicológica por parte de seu companheiro. Assim falando parece que se trata de algo difícil de se assistir, ou pesado demais, ou até mesmo chato. Mas não é. Com seu talento e carisma João arrebata e nos prende à sua narrativa do início ao fim. É um grande prazer presenciar uma entrega tão intensa no palco. Ele denuncia e, ao mesmo tempo, entretém. O texto de Moisés Bittencourt e a direção impecável de Fernando Gomes são emoldurados pela precisa e mágica iluminação de Paulo Cesar Medeiros, praticamente o único cenário do espetáculo. Com ritmo intenso, cortes e flashbacks cinematográficos, o espetáculo solo de João Côrtes é uma lufada de ar fresco no teatro brasileiro. Uma renovação. Sacode, diverte, emociona e faz pensar. Precisa ser visto! Esse jovem ator é um atleta, um ginasta da arte e das palavras. Não sei mais o que dizer. Estou sem fôlego, estupefato, entorpecido. Saí do teatro renovado e recomendo a todos... Na foto, João recebe e agradece os merecidos aplausos.