terça-feira, 19 de julho de 2016

LIMITE BRANCO

Querida Paula,
Naquele dia do seu debate saí do Sesc e fiquei andando pelas ruas de Copacabana com uma pulga atrás da orelha: Como é que eu, um leitor tão apaixonado pela obra de Caio Fernando Abreu, que tanto admira os seus contos e crônicas, ainda não havia lido seu primeiro romance, Limite Branco, escrito quando ele tinha apenas dezenove anos? Fui tomado por uma enorme curiosidade de saber como escrevia na SUA adolescência aquele escritor que eu tanto admirava na MINHA adolescência. E foi com enorme satisfação que hoje concluí a leitura dessa pequena joia. Joia não apenas pelo conteúdo, mas também pelo formato, bastante moderno para a época em que foi escrito. Além da enorme satisfação estética que a leitura me proporcionou, por poder identificar já no seu primeiro livro grande parte das características de sua obra que sempre me cativaram, tive também a satisfação pessoal de descobrir o quanto o adolescente Caio se parecia com o adolescente que eu fui. Apesar dos quase vinte anos que os separaram. Revi minha solidão, meu isolamento, meus eternos questionamentos sobre o sentido de tudo. Minhas pequenas revoltas com o estabelecido, minha necessidade urgente de mudanças, as angústias resultantes da consciência que eu cria ter. Consciência essa que, apesar de me fazer insatisfeito, não me levava necessariamente a nenhuma espécie de ação transformadora. Como ele, eu também sou do interior do Rio Grande do Sul, de Soledade, e aos catorze anos fui para Porto Alegre, por vontade dos meus pais, para fazer meus estudos do segundo grau e da faculdade. Revi minhas andanças pelo centro da cidade, o Guaíba, a Rua da Praia. Meu pensamento que se expandia de frente para a imensidão do rio que eu já ambicionava mar. E principalmente algo que defino como um certo “gauchismo”, que é uma visão das coisas e das pessoas que nos cercam com uma superioridade ingênua, que vem com um quê de julgamento, como se observássemos tudo e todos de cima, nos dando conta do ridículo e da pequenez alheias. O próprio Caio afirma, no prefácio de 1992, quando fez a revisão da obra, ter sido quase insuportável reler o que escrevera. Sinto a mesma coisa quando releio meus escritos adolescentes que ainda guardo a sete chaves... Que bom que você, Paula Dip, vai lançar um livro com cartas que Caio escreveu para Hilda Hilst nesse período. Isso irá nos revelar ainda mais do menino escritor que já se anunciava. Espero que seja mais um grande sucesso, como foi o seu Para Sempre Teu, Caio F...
Aguardo ansiosamente pelo lançamento. Para sempre teu,
Roberto Camargo.

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