quinta-feira, 30 de junho de 2016

O CHEIRO DO CAFÉ

É sempre bom a gente lembrar o papel que o teatro tem na sociedade. Ou melhor, o papel que ele pode ter. É sempre bom também que se faça teatro. De todos os tipos, afinal, como já falei aqui, o mundo com teatro é muito melhor. Ainda que com mau teatro. Que ele nos divirta, nos faça somente rir, nos faça pensar, nos faça rir e pensar, nos faça chorar, questionar valores, despertar a nossa consciência social, política ou pessoal. Que ele reflita a sociedade na qual está inserido. Que ele repense a história, o passado, lançando luz sobre o presente. Que ele forme plateias. Que vá até as periferias. Que dê recados. Mensagens. Que faça cócegas. Que imite a Broadway. Acho válido em todos os casos. É claro que em alguns casos o teatro ressurge com mais valor e mais pleno de potencialidades. De relevância. Vivemos tempos difíceis. Crise geral. De valores. Financeiros, morais e éticos. Um bom campo para que floresça a comédia, por exemplo. Todos querem rir. Não tá fácil pra ninguém. Muitos atores e comediantes de sucesso popular aproveitam esse nicho de mercado para montar seus solos de stand up, por exemplo. Não é preciso investir quase nada, cenário, equipe técnica, luz, trilha sonora, apenas um microfone e um palco vazio, iluminado por um único refletor e o retorno financeiro é muito maior, o dinheiro da casa lotada é todo do ator comediante e a plateia satisfeita vai comer pizza depois de “rachar o bico”. Tudo certo. Outros mudam o nome do espetáculo e apresentam uma versão requentada da mesma coisa que já faziam e continuam tendo o sucesso que conquistaram. Tudo certo também. Mas tem alguns atores e comediantes de sucesso popular – poucos, diga-se - que aproveitam o dinheiro e a popularidade que ganharam para dar um algo mais para seu público ávido de risadas. É o caso de Marcos Veras. Assim como Eduardo Sterblitch, de quem muito já falei aqui, ele reverte as expectativas do público que quer apenas “rachar o bico”. Esse tipo de ator ou comediante arrisca. Investe. São jovens que não se acomodam no glamour do sucesso fácil. Querem mais, tem algo a dizer. Revestem o teatro de comédia da sua real função. Vamos rir, sim. Mas do que é mesmo que estamos rindo? Da nossa miséria? Da nossa feiúra? Da nossa pequenez diante do universo? Da nossa estupidez, crueldade e violência? Ah, tá. Então vamos rir juntos. De nós mesmos. Rá rá rá... Dono de um talento e de um carisma imensuráveis, Veras dá a seu público não apenas risadas, mas teatro. O verdadeiro teatro. Eu já o havia visto em Atreva-se, com direção de Jô Soares, e tinha gostado muito. Apesar de ser uma comédia mais leve e despretensiosa, era de extremo bom gosto, uma impecável encenação toda em preto e branco, parodiando o cinema noir. Agora, nesse Acorda Pra Cuspir, ele vem seco. Direto e reto. Como uma flexa. Um soco. Uma sacudida forte. Adoro. O texto, de Eric Bogosian, foi traduzido por Maurício Guilherme, o autor de Atreva-se. No original chama-se Wake Up And Smell The Coffee. E é isso. Acorda! Levanta! Se liga! E vá ao teatro aplaudir de pé Marcos Veras...
Na foto, Veras agradece os merecidos aplausos.

domingo, 26 de junho de 2016

GALLAVIN

Sigo minhas buscas intermináveis por novos talentos musicais, que tanto me inspiram. Como já declarei aqui no blog, grande parte dos meus achados devo à Radio Swiss Jazz, que tenho no meu iPad. Pois é de lá que vem a minha mais recente descoberta do jazz vocal: Steven Gallavin. Ou apenas Gallavin, como prefere ser chamado esse suíço natural de Sierre. Quando escutei por acaso sua interpretação de You´re The Top, de Cole Porter, fui atrás e fiquei muito satisfeito com o que encontrei. Principalmente com seu primeiro álbum, Mad About The Boy. Acho que já deu pra entender, não? Gallavin retoma standards do jazz escritos por compositores gays ou bissexuais e que originalmente eram gravados por mulheres. Com suas interpretações masculinas ele imprime novos sentidos às canções, realçando sua essência e as intenções originais de seus autores. Hits como The Man I Love, Lover Man, Like Someone in Love e My Baby Just Cares for Me ganham novas cores e tons. Uma delícia de se ouvir. Para além de quaisquer estereótipos, Gallavin é um deleite só. Dia desses, em um bate-papo ao vivo no Facebook, meu amigo Edson Cordeiro declarou, diretamente de Berlin, que sou uma espécie de pesquisador musical, sempre a apresentar-lhe novidades. Fiquei tão envaidecido que resolvi dividir aqui, além da minha mais recente descoberta, as palavras de meu querido amigo. Diga-se de passagem, outro grande artista a quem devemos ouvir com a maior atenção. Tem algumas coisas de Gallavin disponíveis no Youtube, não muitas. Os álbuns estão à venda no iTunes. Eu, evidentemente, já comprei...
Na foto, Gallavin em si fazendo a bonita, toda trabalhada no pailleté.

terça-feira, 21 de junho de 2016

PARA UM DOMINGO QUE FINDA

Quem me conhece e/ou segue o blog sabe da minha paixão por piano e pianistas. É que estudei esse instrumento durante boa parte da minha infância e adolescência e, como abandonei os estudos, hoje sou uma espécie de pianista frustrado. O que foi sem nunca ter sido, como a Viúva Porcina de Roque Santeiro. Pois bem, isso tudo faz com que eu esteja sempre de olho nesses maravilhosos seres musicais e seu incrível talento para tirar música do instrumento que tanto amo. Para citar alguns, Cida Moreira, João Carlos Assis Brasil, Arthur Moreira Lima, Miguel Proença, Rodrigo Vellozo, Cezar Camargo Mariano e muitos outros. Entre eles, Lady Gaga, que me surpreendeu em um concerto a que assisti em Paris no ano de 2010. Nesse domingo fui ao Theatro Municipal para a apresentação de Michel Camilo. Esse incrível pianista é natural da República Dominicana e passeia por diversos gêneros musicais, do clássico ao popular, passando pelo jazz, com composições próprias e interpretações bem particulares de standards. Uma espécie de one man show do teclado. Fiquei bastante impressionado. Sua já antológica interpretação de Take Five é aplaudida já nos primeiros acordes. Claro que cheguei bem mais cedo, uma hora antes do início do recital, para aproveitar o café do teatro tomando um vinho. O café funciona nas dependências do Salão Assyrio, que fica no subsolo do teatro e tem uma decoração deslumbrante, para dizer o mínimo. Nesse salão aconteciam os bailes de máscaras do Municipal e também chegou a funcionar um cabaret onde se apresentou Pixinguinha! O Assyrio apareceu na minissérie Ligações Perigosas, da Globo, na cena em que Selton Mello é flagrado com outra por Marjorie Estiano... Fiquei curtindo os relevos de azulejos franceses enquanto degustava meu vinho. Servido, malheureusement, em taças de plástico. Praticamente uma heresia em um local tão belo e sofisticado. Mas vale a visita. Aliás, valem várias visitas. Pretendo voltar mais vezes. Não apenas o café, mas o teatro como um todo, é encantador. Eu sei que foi inspirado na Opéra Garnier e que o que vou dizer é um clichê, mas, ainda assim, lá vai: Parece que a gente está em Paris. Mesmo. Saí com um aconchego no peito e a sensação de um domingo bem encerrado. Do lado de fora, a lua cheia iluminava a Cinelândia... Para fechar a semana com chave de ouro.
Nas fotos, Michel Camilo agradece a ovação, vitral do teatro e detalhe dos azulejos do Assyrio. #michelcamilo #theatromunicipalrj

domingo, 19 de junho de 2016

BR TRANS

Ainda me sinto tocado pelo emocionante espetáculo BR Trans, a que assisti nesse fim de semana no Teatro Poeira. Resultado de uma pesquisa do universo de travestis, transexuais e transformistas, feita pelo artista Silvero Pereira, a peça fisga o espectador desde o momento em que ele entra no teatro. Digo artista porque acho que seria redutor chamar Silvero apenas de ator. Seu enorme talento e carisma são capazes de quebrar o gelo de qualquer coração endurecido e fazer relaxar o mais refratário dos moralistas. Assim que um deles coloque os olhos em seu vestido de melindrosa que marca com o balanço das franjas o ritmo da melodia suingada executada pelo pianista enquanto a plateia ocupa os seus lugares. Silvero dá vida a Gisele Almodóvar, espécie de alter-ego do ator, e essa nos conta a história de várias colegas e entrevistadas na sua pesquisa. Assim percorremos as alegrias, os sonhos, as desgraças, os dilemas e as angústias desses seres estigmatizados que tentam sobreviver à margem da sociedade. Eu, que adoro por identificação todos os excluídos, os desvalidos, os degredados filhos de Eva, “os ladrões e as amantes, meus colegas de copo e de cruz” (para citar Chico) fiquei completamente absorvido e emocionado. Silvero é cearense, mas realizou a pesquisa em Porto Alegre, onde entrou em contato com Jezebel de Carli, que veio a ser a diretora do espetáculo. Coincidentemente, Jezebel foi minha colega na faculdade de teatro. Já tinha ouvido falar bem desse espetáculo há muito tempo. Só agora consegui assistir. Ainda bem. E, por favor, não deixem de fazer o mesmo. Fiquei pensando em minha amiga Claudia Wonder, já falecida, e no quanto ela iria adorar se ver retratada nesse belo trabalho. Silvero arrebata ao interpretar ao vivo Três Travestis, de Caetano, e Geni e o Zepelin, de Chico Buarque. E a personagem Babi me levou às lágrimas dublando Maria Bethânia na belíssima Balada de Gisberta, que não conhecia e que agora não paro de escutar. Esse espetáculo é muitíssimo bem-vindo nesse momento de tanta violência, segregação, discriminação e preconceito contra homossexuais em geral, entre os quais travestis e transgêneros se incluem. Quem diria, em pleno século XXI. Seja pelo estado islâmico (minúsculas intencionais) ou pelos pastores que pregam a cura gay. Dá tudo na mesma: O retrocesso está no ar. Mas ainda assim, eles estão lá. Sonham e se desencantam. Ralam e se transformam. Traçam perfis na praça. E se a barra pesar, deixam o país e enchem Paris de graça... Afinal, a distância até o fundo é tão pequena, no fundo é tão pequena a queda. E o amor é tão longe...
Na foto, as franjas ritmadas do vestido de melindrosa de Gisele. #brtrans

quarta-feira, 15 de junho de 2016

MAIS GOTAS

Sábado passado fui a Copacabana para assistir ao espetáculo Esse Vazio, no Teatro Glaucio Gil. Como sempre faço quando vou ao teatro, cheguei mais cedo para comprar o ingresso e, depois de adquiri-lo, fui fazer hora tomando uma taça de vinho. Dessa vez, no simpático bistrô Pek 170, que fica na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, bem na altura do Copacabana Palace. Quando saí do bistrô e me dirigia para o teatro dei de cara com Jane di Castro saindo de um restaurante onde acabara de jantar. Não pude deixar de abordá-la. Conversamos, fizemos uma selfie e ela me deu o flyer do show que fará com Rogéria na Sala Baden Powel no próximo dia 23. O prospecto, ela falou. Achei chique. Tem coisas que só em Copacabana... Quanto ao espetáculo, bem, não amei. Mas achei que faz juz ao nome... Depois ainda fui jantar no Azumi, o melhor japonês do Rio na minha singela opinião. Ele fica em Copa, mas bem poderia estar situado na Liberdade, em São Paulo. Tal a autenticidade. Como eu dizia, tem coisas que só em etc... Na segunda, Weidy e eu fomos passar a tarde na Ilha de Paquetá. Um pequeno tesouro que em anos frequentando o Rio eu nunca havia visitado. Ruas de areia e paralelepípedos remetem ao passado e a pequenas cidades do interior, como a minha Soledade. Além das belezas naturais e arquitetônicas, Paquetá conserva o que para mim é um dos maiores luxos da atualidade: O silêncio. Andando pelas suas simpáticas praias e ruas o silêncio é tamanho que se pode escutá-lo. Vez em quando ele é interrompido pelas ondas que quebram baixinho na areia. Uma tarde de sonho... Hoje fui finalmente visitar a exposição ComCiência, de Patricia Piccinini, no Centro Cultural Banco do Brasil. Não há muito o que ser dito, pelo menos por mim, sobre esse maravilhoso trabalho. É o tipo de obra que tem que ser vista e sentida. Apesar de que, pelo visto, a maioria das pessoas somente olha. E fotografa! Meu Deus, tem gente que chega a encostar os celulares nas esculturas em busca de closes. Dá um pouco de vergonha alheia. Aliás, muita. Mas cada momento dedicado a apreciar esse impressionante trabalho valerá para sempre. Eu não vou esquecer jamais... E o mês de junho segue com temperaturas amenas. E eu, já em ritmo de despedida do Rio, procuro aproveitar o que posso da Cidade Maravilhosa.
Nas fotos, selfie com Jane, bucolismo em Paquetá e um pouco de ComCiência.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

JUNHO EM GOTAS

Dia desses, assistindo ao filme Meia Noite em Paris, de Woody Allen, pela quarta ou quinta vez, observei que na calçada onde os personagens andavam nos anos vinte havia aqueles relevos indicativos para cegos. O que, imagino, à época ainda não existia. Mesmo em Paris, sempre tão avant-garde. Gostei do que vi. Me fez pensar que mesmo um gênio como Allen, tão cercado de gente tão capaz, pode errar...
A galeria Marcelo Guarnieri está expondo fotografias de Pierre Verger. Muitas delas tem como diferencial o fato de terem sido manipuladas pelo próprio Verger. Reveladas, ampliadas, etc por ele e, mais ainda, assinadas. O que faz com que custem em torno de vinte mil reais. Adoraria ter dinheiro para poder pagar isso tudo por uma fotografia. Vai ficar para a próxima encarnação...
Gota D'Água a Seco, com Laila Garin e Alejandro Claveaux, retoma o musical de Chico Buarque e Paulo Pontes protagonizado por Bibi Ferreira no fim dos setenta. Creiam, eu assisti, mesmo sendo praticamente um bebê. A peça se mantém atual e na minha singela opinião o único senão é o registro dramático adotado pela direção. Gota D'Água, Bibi o sabia, é trágica! Já Helena Varvaki é toda drama em A Outra Casa, de Sharr White, no pequeno Cândido Mendes. Me fez chorar potes, como tudo o que trata de doenças terminais ou crônicas atualmente...
O Facebook tem me aborrecido sobremaneira. De modo que só entro para ver os aniversariantes do dia, as atualizações e tchau. Todo o atual engajamento dos friends me dá muita preguiça. Fora Temer, ok, aceito. Mas gente perguntando que horas Dilma volta, acho um pouco demais. Desapega, meu povo...
Frio no Rio, uma novidade total para mim. Dá ainda mais saudades de São Paulo. Mas agosto se aproxima e eu, finalmente, irei voltar ao lar... Sem muita paciência para escrever aqui, navegar em redes sociais e me conectar em geral. Isolamento master...
Apaixonado pela série Gracie and Frankie, do Netflix. E, por falar em Gracie, minha amiga de fé, irmã, camarada, Grace Gianoukas está arrasando na novela Haja Coração, como a milionária excêntrica Teodora Abdala. A novela não me prende, mas fico online só para curtir a Grace. Felicíssimo pelo seu êxito na TV encerro o post. Bom inverno a todos!
Na foto, Pierre Verger na galeria Marcelo Guarnieri em Ipanema.