domingo, 30 de abril de 2017

MEDO DE AVIÃO

Que sacanagem esse negócio de todo domingo um cantor bacana se despedir da gente. Domingo passado foi Jerry Adriani. Hoje, Belchior. O tempo vai passando, vamos envelhecendo e perdendo pelo caminho amigos, ídolos e referências. Eu, que nunca tive medo de avião, tremi nas bases quando encontrei com Belchior na loja de discos Spotless, do então meu amigo Cid (onde andará?) na longínqua Porto Alegre do ano de 1979... Já contei mil vezes aqui no blog desse encontro que mudaria a minha vida. Mas, dada a importância da efeméride, vale repetir. Eu ouvia atentamente nos fones de ouvido o recém-lançado LP de estreia de Ângela Ro Ro quando o cearense adentra o descolado point para uma tarde de autógrafos de seu igualmente recém-lançado LP Medo de Avião. Meio sem graça com a pouca frequência, se dirige à minha pequena e meiga pessoa, pergunta o que estou ouvindo e engatamos animada conversa. O que nunca contei aqui é que eu não estava lá por acaso. Sabia muito bem que o rapaz latino-americano sem dinheiro no bolso e sem parentes importantes viria do interior para dar os seus autógrafos. E, do alto dos meus quinze aninhos, fiz a desavisada & blasé... Belchior se encantou comigo, eu com ele e, além de um bom papo e um autógrafo, ganhei um convite para assistir ao seu show novamente, pois já havia assistido na noite anterior. Me pediu para esperá-lo na entrada lateral do Teatro Leopoldina, que era por onde entravam os artistas, que me levaria com ele para os bastidores do show. Eu era um poço de ingenuidade e virgem até a raiz dos cabelos. O que fez com que nenhuma segunda intenção me passasse pela cabeça. Fiquei com ele no camarim até o começo do show, assisti ao show da coxia e, quando as cortinas se fecharam após o bis, me escafedi com algum tipo de sinal de alerta não identificado me dizendo para sumir. É lógico que até hoje me arrependo amargamente de não ter esperado por ele, de não ter saído com ele após a apresentação, de não ter vivido o que quer que fosse que o destino estava tentando fazer para unir o nordeste ao sul. Um gole de conhaque, aquele toque em teu cetim, que coisa adolescente, James Dean. Agora já foi, já era. Até parece que foi ontem minha mocidade, com diploma de sofrer de outra universidade... Ainda bem que tenho suas canções. Que sempre amei, amo e amarei. Não quero ficar falando aqui de coisas que aprendi nos discos. Quero apenas contar como eu vivi e tudo o que aconteceu comigo. Vai em paz, Belchior. Em cada luz de mercúrio vejo a luz do teu olhar. Passas praças, viadutos, nem te lembras de voltar. De voltar, de voltar...
Eu tenho o autógrafo guardado, não sei onde. Se soubesse, postaria aqui para ilustrar o post.

Nenhum comentário:

Postar um comentário