segunda-feira, 23 de maio de 2016

MUDANÇAS

Recentemente um amigo teve que deixar o apartamento onde viveu por quase dez anos. O proprietário manifestou o desejo de vender o imóvel e, naturalmente, deu a preferência para o seu inquilino tão fiel. Mas o fato é que esse meu amigo não tinha bala na agulha para se tornar o novo proprietário e a solução foi deixar o seu cafofo tão amado. Rapidamente conseguiu encontrar um apartamento até melhor do que aquele onde viveu por tanto tempo, mas quem diz que ele ficou satisfeito! Não é o conforto do novo lar, suas paredes brancas e cheias de tomadas, não é o elevador que o outro não tinha, não é a varanda ampla que comporta uma mesa e várias plantas, não é nada disso que ele queria. Queria apenas e tão somente ficar morando no lugar onde adorava morar... Essa mudança de residência trouxe consigo a mudança de diversos hábitos: Os locais que ele frequentava e que ficavam nas imediações, por exemplo. Teria agora de pegar conduções para ir até eles ou, pior ainda, passar a frequentar outros locais. Quando a gente decide fazer mudanças de hábitos ou mesmo mudanças de vida, isso é uma coisa ótima. Abre espaço para o novo, o imprevisto, o inusitado. Mas quando isso tem que ser feito à nossa revelia é realmente aborrecedor, para dizer o mínimo. De modo que esse meu amigo ainda nem descobriu as prováveis melhoras que essa mudança involuntária pode ter trazido à sua pacata existência. Por enquanto ele nem está interessado nisso. Tanto que a primeira coisa que fez, assim que se instalou confortavelmente na nova moradia, foi fechar a porta à chave e pegar um vôo para um país bem distante para descansar por duas semanas. Diga-se de passagem, o seu país de origem. Ele mora no exterior há mais de vinte anos... Já eu, de minha parte, às vezes tenho vontade de mudar é de planeta. E, quando sou tomado por esse sentimento de inadequação, felizmente recorro à literatura, passaporte mágico para as mais loucas e inimagináveis viagens. Nada como abrir portais, transcender, trespassar a realidade inócua do dia a dia e se embrenhar em universos paralelos cheios de mistérios a desvendar. Abrir a porta do Teatro Mágico cujo acesso só é permitido aos raros, aos loucos. Devorar a primeira metade das histórias e depois começar a poupá-las lendo-as lentamente para que a separação inevitável demore mais a chegar... Nesse exato momento estou fazendo algo que não fazia e que fui obrigado a fazer: Escrever em um computador. Sempre gostei de escrever, desde criança. E sempre o fiz à máquina. Tinha verdadeira paixão pela máquina de escrever do meu pai e, mais tarde, pela minha própria, uma Olivetti Lettera 35 alaranjada. Quando não o fazia à mão mesmo, nos cadernos de bolso que sempre carregava comigo. Quando chegaram os computadores, a internet, a era digital em si, ainda resisti um certo tempo. Mas não estava pegando nem bem para mim. E, como detesto ficar para trás e adoro uma mudança, ainda que por vezes involuntária, aderi em seguida. Hoje não vivo sem meu ipad, meu notebook e meu celular. Sem sinal de internet, então, nem se fala. Sou capaz de deixar de ir para um lugar incrível se souber que lá não tem internet... Enfim, vou me adaptando como posso entre as cidades e as estepes. Nem tanto o homem, nem tanto o lobo. Meu amigo também, estou certo, logo irá se adaptar à vida nova que virá com o novo lar. O importante é que estejamos vivos, conectados e cheios de curiosidade...
Na foto, o escritor alemão naturalizado suíço Hermann Hesse, cuja leitura muito me inspira.

Um comentário:

  1. Outro planeta, yuhu, tou nessa, gostaria de conhecer novas paragens. Mientras, grandes cidades são sedutoras, pequenos albergues em paragens bucólicas também convidam. Sei lá, hotelzim em Gramado, no silêncio do Bosque, tá valendo. Vamos?

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