quinta-feira, 8 de outubro de 2015

AUSENTE

Andei por lugares distantes. Confins. Me perdi de mim mesmo para depois, novamente, me encontrar. Percorri encostas, escarpas, trilhei as mais inóspitas trilhas. Subi, desci, suei, chorei, senti frio, tive medo, muito medo, medo de não mais me encontrar, medo de perder a vida, medo de mim mesmo caso ficasse frente a frente comigo. Revi pessoas queridas que já se foram e esses encontros foram cheios de vida e de significados. Num determinado ponto da minha jornada chegou a ficar tudo muito escuro. Não era capaz de ver nada à minha frente. Nem atrás. Onde estava aquele que eu era? Aquele que fui? Todos gostavam de mim, eu lembrava. Eu tinha muitos amigos, pensava. Onde é que eu tinha ido parar? Aquelas iniciativas incríveis que eu tinha, porque agora não tenho mais? Cadê todos aqueles happy hours, os bota-foras, as despedidas de solteiro? Os aniversários surpresa, até estes tinham desaparecido. Eu não pertencia mais a nenhum grupo. De amigos, de viagem, de teatro. Não era de nenhum partido, não torcia para time algum. Os meus LPs estavam todos riscados, nos sulcos do vinil tinha poeira entranhada, nada mais conseguia limpar. Simone não tinha mais medo de amar, Roberto não se atinha a detalhes, Nara não via a banda passar. Tudo já havia passado. Teria eu ficado para trás? Lá nos setenta, oitenta, noventa. Junto com a Vespa e as calças baggy. Perdido numa esquina do Bom Fim. Esquecido em um canto de boate. As cartas! Com certeza as cartas guardavam respostas. Não as do baralho, a correspondência mesmo. Aquelas que eram enviadas via aérea, mala postal. A gente esperava com tanta ansiedade que elas chegassem, nada desse imediatismo whasápitco, facetimeco... Andei mais, subi mais, desci mais. Procurei em cada canto da casa e da memória, virei esquinas de Paris, Porto Alegre, São Paulo, Soledade. Até que finalmente voltei, me revi, me reencontrei... Cabelos restam poucos, quase todos brancos, a pele já não tem o mesmo viço de outrora, a barriga começa a se pronunciar. Quase tudo mudou. A essência das coisas e das pessoas, essa, eu acho que permanece a mesma. Para o bem e para o mal. Fazer o quê...
Na busca encontrei esse poema que escrevi quando tinha dezoito anos e que tem o mesmo título do post:
Estrelas existem milhares
Companhia também nunca falta
O que falta é a alegria
Que os teus olhos espalham nos ares
O que falta é o que está contigo
O que falta é a tua presença...
Na foto, eu jovem poeta sempre sentado à janela do apartamento em Porto Alegre.

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