sexta-feira, 16 de maio de 2014

VINTE ANOS BLUES

São Paulo, março de 1987. Desembarco do ônibus que me trouxe do aeroporto em plena Praça da República. Tenho vinte e três anos de idade. Vim com meu grupo de teatro estreiar uma peça no Sesc Anchieta. Fico hospedado na casa de uma amiga na rua Rego Freitas. E a cidade se descortina para a minha juventude... Tudo é novo, grande, moderno. Tudo promete. O grupo ao qual pertenço é muito admirado por todos e nossa diretora Maria Helena Lopes, então, cultuada. Recebemos muitos convites para festas, jovens atores nos seguem, nos levam para lá e para cá, é bacana ser amigo da gente. Imaginem como me sinto, tão jovem e deslumbrado. Os bares do Bixiga fervem à noite. A Consolação e a Paulista também. O Riviera, o La Baguete, o Ritz, o Spazzio Pirandello! O Espaço Off... Somos convidados a participar de uma performance das Harpias e Mansfield no Espaço Mambembe, da qual também fez parte Caio Fernando Abreu. Eu, seu leitor mais apaixonado fiquei lado a lado com ele e não disse palavra. A velha timidez insistiu em sentar entre nós. Um banquete inesquecível do qual não guardo nenhuma imagem senão as da memória. Muitos espetáculos para a classe teatral nas segundas-feiras, praticamente o único dia que não se trabalhava. As peças no TBC, no Teatro Igreja, no Ruth Escobar. A gente andava a pé pelo centro altas horas da noite. Não que já não fosse perigoso, mas não acontecia na-da. Meu aniversário de vinte e quatro anos foi comemorado junto com o da jornalista Marcia de Almeida em uma festa na casa de alguém que não me lembro, na rua dos Ingleses, ao lado do Ruth Escobar. No Bixiga havia uma livraria que ficava aberta à noite e foi lá que descobri o Manual do Pedólatra Amador, de Glauco Mattoso. No sobsolo do Pirandello também tinha uma livraria. A gente pirava, enchia a cara, se drogava, mas também lia muito! Ontem fui almoçar com amigos no restaurante do Masp, onde não ia há muito tempo, e essas lembranças todas e muitas mais tomaram conta de mim. Hoje de manhã, quando acordei, olhei a vida e me espantei: Saudades do menino cheio de sonhos que eu era. E as ilusões, como diria Cazuza, estão todas perdidas... Na foto, de Fernando Brentano, morro em cena da peça O Império da Cobiça, do Grupo Tear, que me trouxe a São Paulo na ocasião.

Um comentário:

  1. Robertinho, que linda memória e tenho presente cada quinhão desse viver. Teu aniversário, nessa data, se não me engano, foi comemorado na casa da Rosi Campos, que trabalhava no Inacen e nos acompanhava há muito tempo, o TEAR, com gosto e admiração. Ela morava logo ali, numa daquelas belas casas do Bixiga. E Caio, ah..., com quem partilhávamos mesa no Pirandello para alegria dele, regada a cafés com conhaque Macieira, e falares gauchescos cercado por nós. Merecidos sonhos que te fazem cultuar, até hoje, essa importante urbe de cultura e gostos extravagantes, os quais seduzem gerações de jovens buscando futuros.

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