segunda-feira, 11 de setembro de 2017

BOLERO

O ano era 1989 e eu ainda morava em Porto Alegre. Em uma das minhas idas a São Paulo para visitar amigos e conferir espetáculos de teatro, comprei uma edição da Revista AZ, de Joyce Pascowich, que trazia a cantora Rosemary na capa. Dentro, o editorial abolerado e o texto de Caio Fernando Abreu que passou a me inspirar em quase tudo o que fazia: Bolero. Partindo de uma comparação entre a "roupa" e a "música" bolero, Caio embarca em lembranças da infância que terminam por definir o "feeling" bolero, por assim dizer. Mais ainda: O universo bolero. Minha identificação com o conteúdo daquele texto foi tamanha que cheguei a escrever e dirigir uma peça de teatro que chamei de A Mulher Só - Uma Comédia Bolero. Lembro de uma vez em que estava dando uma entrevista na TVE de Porto Alegre sobre a peça e disse que gostava de ficar em casa aos sábados à noite ouvindo Dalva de Oliveira e Dolores Duran. Quando voltei à sala de maquiagem para pegar meus pertences o maquiador, bem mais velho do que eu, me disse: Você é jovem demais pra ficar ouvindo essas coisas, falando dessas coisas. E eu nem tinha trinta anos... Quando recebi o convite de Luís Arthur Nunes para participar da noite de lançamento do festival Caio Entre Nós, no Teatro São Pedro de Porto Alegre, que aconteceu na semana passada, não tive dúvida: Chegara a hora de interpretar o texto de Caio que guardei por tantos anos. Até o momento de entrar em cena eu estava um feixe de nervos. O coração parecia querer saltar pela boca. Todo o ar que me fosse possível respirar era insuficiente. Mas quando o foco no centro do palco se acendeu e fui entrando nele ao som do piano de Arthur de Faria que tocava os acordes iniciais de Sabor a Mí, tudo fluiu como devem fluir os boleros... E que eles nunca nos faltem! Essa imagem ficará na minha memória para sempre. Arquivada, arquetípica. (Para citar Caio Fernando Abreu). Uma pena Tânia Carvalho não estar presente. Eu teria dedicado minha cena a ela, que foi quem me apresentou ao universo dos boleros de Eydie Gormé e Trio Los Panchos quando eu ainda era praticamente menino... Volto para São Paulo me coçando de vontade de transformar esse bolero em um solo. Que os deuses do teatro me iluminem...
A foto que ilustra o post é de Flavio Wild, outro agradável reencontro que Caio Entre Nós me proporcionou.

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