terça-feira, 26 de dezembro de 2023
MEMÓRIAS DE VINIL
Eu sempre pedia de Natal para a minha mãe um disco de Maria Bethânia. Foi assim com Álibi, Talismã e Alteza, entre outros. Bethânia sempre lançava em dezembro os seus álbuns. Agora também saem em dezembro as novas temporadas de Emilly in Paris. É uma maneira de comparar, mas nada se compara... Dia desses liguei a tv e Ludmila cantava no programa do Serginho Groissman: Foca no meu bum bum. Troquei de canal e, no canal Brasil, dei com Elis e Tom, o documentário. Desculpe, Ludmila. Desculpe, Seginho. Não tenho como focar no bum bum quando estou acostumado a focar no talento. (Não que Ludmila e Serginho não tenham os seus mas, como eu dizia, nada se compara)... Na frente da minha casa, em Soledade, tinha uma espécie de varanda. A chamávamos de área. Área da frente. Ali nos sentávamos aos domingos para ver "o movimento ". Que nada mais era do que os carros e as pessoas que passavam para cima e para baixo como em um footing motorizado. Melhor do que ver o movimento, só sair para dar uma "voltinha de carro". Quando eu convencia meu pai a nos levar era o máximo. Na frente da minha casa tinha também uma segunda sala que dava para a rua, que era o escritório do meu pai. Sempre adorei essa sala. Tinha máquina de escrever, desde cedo uma das minhas grandes paixões. Tinha também um cofre, cujo segredo ainda bem pequeno meu pai me confiou. Dentro do cofre havia uma parte proibida para mim que era onde ficavam livros adultos, sobre sexo. Acreditam que, mesmo sabendo o segredo do cofre e o abrindo quando bem desejasse, eu jamais toquei nos livros que me eram proibidos? Mesmo quando uma vez, aos doze ou treze anos, tive um papo sério com ele dizendo que já estava na hora de eu ler aqueles livros e me informar sobre o tema. Meu pai disse que ia pensar e nunca mais tocou no assunto. E eu, burro, ainda assim, não os li. Bom, para se ter uma ideia, meu pai tinha uma arma que eu sabia onde ficava guardada e nunca tive coragem de tocar nela. Só de olhar, morria de medo que aquilo explodisse e me matasse. Acho que se tratava de obedecer aos mais velhos, coisa que deixou de existir há muito tempo... Quando já adolescente, eu e meus amigos (todos maconheiros, para desespero dos meus pais) invadíamos o escritório enquanto meu pai estava no campo trabalhando com o gado. Nos chapávamos e ficávamos ouvindo música no toca-discos. Eu tinha um som potente no apartamento em Porto Alegre, claro, e esse toca-discos portátil para ouvir nas férias em Soledade os discos que trazia. Às vezes meu pai voltava mais cedo da lida e havia uma verdadeira diáspora de amigos deixando rapidinho o escritório e limpando as provas do "crime"... No Natal em que Bethânia lançou o LP Alteza, meus amigos passaram na minha casa para me pegar depois da ceia e fomos à reinauguração da Boite Xodó, que havia sido reformada após um incêndio. Fomos, se não me engano, Marcel, Paulo, Rosaura, Nádia, Carminha e eu. Naquela época a gente ainda "ficava" entre amigos. O termo usado ainda não era esse, mas nessa noite eu me lembro que fiquei com a Nádia, irmã da minha amiga Rosaura. (Mas queria mesmo, no fundo e bem escondido, ficar com o Marcel ou com o Paulo)...
O Mauro Ota, amigo japonês das minhas irmãs, vinha às vezes nos visitar nas férias em Soledade. Ota tinha um Puma, o carro esporte mais "descolado" do momento. Inacreditavelmente ele me emprestava o Puma, mesmo sem eu ter habilitação. Eu saía dirigindo sempre pelas ruas "de trás", jamais pela avenida principal, onde podia ser parado pelos PMs. Uma vez peguei o Puma e fui até a casa da Rosaura, estacionei na frente e businei até que ela aparecesse para ver quem era. Quando me viu no Puma, jurando que era meu, me fez prometer que só ela andaria comigo no carro... Rosaura e eu percorríamos as ruas de Soledade na minha bicicleta Solange. Uma vez, descendo uma ladeira, os freios falharam e nós nos estabacamos num campinho no fim da rua... Nas férias de verão em Soledade eu acordava cedo (mentira, minha mãe me acordava), tomava café e ia nadar na piscina do clube com minha amiga Marilia Zarpellon. Marilia tinha sido minha professora de história no ginásio e eu era apaixonado por ela. Uma vez cheguei a me declarar, deixando a coitada numa saia justa daquelas de couro, sem forro e com o zíper emperrado... Marcel era o meu melhor amigo, tipo irmãozinho mesmo, e já nos deixou há alguns anos. Como já contei aqui, tínhamos um pacto de sempre ligar um pro outro no dia 24 de dezembro, onde quer que estivéssemos. Esse dia foi anteontem e, onde quer que você esteja, Marcel querido, lembre de mim como eu lembrarei para sempre de você...
P. S. Quando estava de férias em Soledade e algum disco novo era lançado eu ia até Passo Fundo, cidade maior vizinha à nossa, especialmente para adquirir. Em Soledade, eles demoravam a chegar. Foi assim com O Que Vier eu Traço, primeiro LP solo de Baby, então Consuelo. Quando saiu Muito, de Caetano, minha irmã Rita o comprou para mim em Porto Alegre e me trouxe no Natal. Memórias, memórias. Quem não as tem? Mas nada se compara...
Nas fotos, Marcel fotografado por mim na lida campeira com meu pai e Bethânia na capa do LP Alteza.
segunda-feira, 18 de dezembro de 2023
14 ANOS DE BLOG
Amanhã, dia 19 de dezembro, meu blog completa catorze anos de existência. Quis fazer o post hoje, segunda-feira, para me sentir útil começando a semana em atividade. Cansei daquela coisa de contar os anos do blog em bodas. Só para fazer diferente, esse ano não vou discorrer sobre o marfim, que seria o elemento correspondente a catorze anos de casamento. Ando em falta com meu blog. Tenho escrito pouco. Não apenas aqui, tenho escrito muito pouca coisa em geral. Sabe aquele papo manjado na internet de expectativa e realidade? Pois é, acho que comecei esse blog com muitas expectativas e nem todas elas se tornaram realidades. Mas o que fazer? Assim é a vida... Obviamente eu não iria deixar o aniversário passar em branco e nem o mês de dezembro, que tanto amo. Então vou espremer aqui pra ver se sai um post digno da importância da efeméride... Desde a mais tenra idade as letras me atraíram. Antes mesmo de entrar para a escola já conhecia todo o alfabeto e formava palavras com as letras estimulado pela minha mãe. Chegava a escrever pequenas cartinhas para minhas irmãs que moravam no colégio interno, na cidade de Cruz Alta. Quando cheguei na primeira série, foi facílimo para a professora Aluf Tams completar a minha alfabetização. Lembro até hoje do método empregado por ela para nos apresentar as vogais: A história da abelhinha, da escova, do índio, dos óculos e do urso... Foi ali mesmo, na biblioteca do Grupo Escolar Maria de Abreu e Lima, que tive contato com a obra de Monteiro Lobato e a devorei inteira. (Sinto que me repito um pouco e peço desculpas aos leitores habitués). A tentativa aqui é de resgatar a minha paixão pela escrita, que vem de mais de meio século. Cruzes! Às vezes eu mesmo me assusto com a quantidade de anos que já vivi... Minha mãe vivia me perguntando por que eu não escrevia um livro. Eu sigo me perguntando. E acho que foi movido por essa vontade que me lancei aqui, na escrita dessas já incontáveis linhas por mim postadas nesses catorze anos de blog. O livro ainda não foi publicado, mas adianto que já tenho material para, no mínimo, dois. Aliás, se alguém que me lê porventura souber de um editor que tenha interesse em publicar um autor neófito, contatos via comentários... Sem mais delongas, quero agradecer mais uma vez e sempre a todos que me seguem, me leem, comentam, compartilham, enfim, me amam. Rsrsrs... Sigo postando, ainda que com menor frequência, com a mesma esperança e alegria de sempre. O prazer de dividir aqui tudo o que vivo, descubro, penso, leio, assisto ou visito é todo meu. Sempre que puder farei questão de compartilhar minhas vivências com quem me lê. Aproveito também para desejar um feliz Natal e Ano Novo a todos! Paz, saúde, prosperidade e felicidade, para haver amor entre os homens. Au revoir!
Na foto, moi pelo fotógrafo Guto de Castro (Só pra me exibir um pouco, que eu também preciso).
domingo, 26 de novembro de 2023
FAST NOVEMBER
Eu devia andar completamente distraído pela vida quando o mês de novembro passou do lado de fora da minha janela e eu nem percebi… E não é que ele tenha passado silenciosa ou discretamente. Pelo contrário, passou fazendo muito barulho, causando estragos irreparáveis. Guerras, assassinatos, atentados, tornados, enchentes, alagamentos, incêndios, rachaduras no chão e desabamentos. Lembrei de um amigo já falecido que ao ficar sabendo de grandes catástrofes (naturais ou não) nas quais havia morrido muitas pessoas, dizia, irônico: “Ótimo! Tem gente demais no mundo”… Me pergunto se ele continuaria a dizer isso hoje em dia... Lava brotou das entranhas da Terra. Ventos sopraram com a força descrita por Shakespeare em Rei Lear. Mesmo assim, não vi novembro passar. E não pense quem me lê que do lado de dentro da janela a coisa tenha se desenrolado tranquila. E mais, do lado de dentro de mim, que a janela protege, também não houve muito silêncio ou discrição. Lava brotou dos pulmões, tremores racharam entranhas, ventos sopraram com força de arrebentar as bochechas. E quando dei por mim, novembro já havia passado e eu não tinha escrito sequer um post. Nesses catorze anos de blog, pela primeira vez quase fico um mês inteiro sem postar. Sei que muitas coisas boas, maravilhosas, acontecem simultaneamente no planeta inteiro. Crianças nascem, olhares se cruzam despertando paixões, curas para doenças são descobertas. Nesse mês que termina assisti a muitas séries e documentários, filmes também. E peças de teatro, mas poucas. Saí algumas vezes com os poucos amigos que tenho. O mundo segue dividido. Não vejo graça em quase nada. Queria ter um partido, uma religião, uma filosofia ou seita. Um guru, um pastor, uma vidente ou digital influencer. Uma qualquer certeza! Só tenho dúvidas. Inseguranças, temeridades. Voltar no tempo, impossível. Ir embora para onde quer que seja, inútil. Dormir, quem pode? O álcool, os diazepínicos, nada pode conter a angústia que vem da consciência que tenho. Quisera ser o mar que quebra nas rochas desde que o mundo é mundo. E assim vai ser para todo o sempre. Enquanto houver mar. Enquanto houver rochas. Enquanto houver mundo… Bom fim de ano a todos!
A foto que ilustra o post é do meu amigo fotógrafo Guto de Castro e retrata a rua Garibaldi, onde eu morava em Porto Alegre. Nessa época do ano ela fica assim, bordada de roxo pelas flores dos jacarandás que a contornam. Uma pequena dose de esperança em meio ao caos.
quinta-feira, 19 de outubro de 2023
O VAMPIRO BORIS - FINAL
Saniasin. Rajneesh. Baguan. Osho. Roupa vermelha, colar. Mala. Terceiro olho, cajal preto nos olhos. Incenso. Buda. Seitas, mistérios, iniciações. Boris trazia segredos, prometia iluminações, mudanças. Uma nova era. Seres evoluídos. Evolua, não polua, escrevia nas páginas dos meus cadernos, junto à imagem de uma lua crescente, por ele desenhada como um grafitti. Tanto para mim. Ao alcance da mão e tão distante. Flertava com a dança e com o teatro. A yoga, a biodança. Retiros espirituais. Como alguns instantes vacilantes e só. Vento devastando como um sonho que gente maluca gosta de sonhar...
A praia da Pinheira, em Santa Catarina. O bairro do Bom Fim, em Porto Alegre. Desfilamos nesses dois lugares nossas juventudes e nossos sonhos. Nossas ilusões passageiras e as que se mantiveram comigo, pois ele já se foi. Para onde, não sei. Talvez para a Paris do século XIX, com seus teatros e bulevares, como fez Lestat, no romance de Anne Rice. Acho que nunca saberei: Boris era um ser envolto em mistério. Que a vida me trouxe e depois me levou. Como os vampiros que vem, causam o maior estrago, ceifam vidas e se vão. Sem deixar rastros, apenas cicatrizes. E lembranças. Depois partem, alados. Misteriosos. Antes que o dia amanheça, desaparecem. Noite adentro, mundo afora. E eu sinto aquela coisa no meu peito: Sinto aquela grande confusão. Eu sei que também sou um vampiro, que nunca vai ter paz no coração...
Já faz um bom tempo que recebi a mensagem da minha amiga com a notícia da morte de Boris. Não mudou muita coisa para mim: Continuei sem vê-lo ou ouvir falar dele como vinha acontecendo há quase quarenta anos, desde que nos afastamos. Nem ao menos em sonho ele me visitou. Vez por outra, remexendo guardados, encontro alguma fotografia em que ele aparece comigo ou com alguns dos nossos amigos. Nada muito nítido ou revelador, todas meio fora de foco, tremidas como as lembranças que tenho dele. Encontro também dois bilhetes que ele me mandou da Praia da Pinheira, escritos em pedaços de papel de embrulho cor de rosa, com uma conta de bar anotada à mão no verso. Típico. A cara dele. Não creio que eu vá reencontrá-lo em uma possível vida após a morte. Tivemos tempo demais nesta aqui e isso nunca aconteceu. Até porque ele não deve ter morrido de fato. Talvez descanse sob a superfície da terra junto ao cemitério do Père-Lachaise, em Paris, ou nos arredores do French Quarter, em Nova Orleans. Até que o som de alguma banda de rock o desperte novamente em um século qualquer, em uma nova era, como ele gostava de dizer. Não sei. O que era para ter sido, foi. O que não foi, a gente inventa. Romanceia. Auto ficciona. Com pitadas de terror e erotismo, que é para tornar a leitura envolvente e, quem sabe, inspiradora para possíveis corações apaixonados. Como eram os nossos naquele adorável e inesquecível fin de siècle...
domingo, 15 de outubro de 2023
O VAMPIRO BORIS PARTE III
Tão intensas quanto a presença de Boris eram as suas ausências. Quando ele desaparecia meu humor ficava completamente alterado. Meu metabolismo se acelerava. Meu PH ficava ácido. Ele tinha o poder de, mesmo à distância, me desestabilizar por inteiro. Eu tinha raiva dele por isso. Raiva de mim por deixar que ele fizesse isso comigo. E nas noites de lua cheia a coisa piorava consideravelmente. Principalmente no verão, quando o ar noturno era invadido pela fragrância das gardênias e damas da noite que adentravam meu quarto de rapaz de vinte anos. Então tentava preencher com álcool o vazio que a ausência dele abria no meu peito: Vinho tinto. Vinho do Porto. Campari. Cherry Brandy. Sangue. Dalvas, Dolores, Maysas, Bethânias e Ro Ros tomavam conta do toca-discos. Nem sei quantas rotações por minuto. Abajures, cinzeiros e copos espalhados. Discos fora das capas. Drama: Quando você passa três, quatro dias desaparecido eu me queimo num fogo louco de paixão. Anjo exterminado...
As noites do Bom Fim ardiam de segunda a domingo. Do Estudantil ao Ocidente, passando pelo Alaska, Copa 70, Mariu’s, Lola, Lancheria do Parque, Anjo Azul, Bar Esperança e aquele outro de que não lembro o nome em alguma daquelas travessas da Osvaldo Aranha. Eu entrava tímido, olhando em todos os ambientes, aquela vontade de saber onde você estava, com quem estava, porque eu sabia que me traía. Não só a mim, traía vários, várias, você não era de ninguém como você mesmo me dizia entre beijos ardentes e overdoses. Essa busca era inútil porque eu nunca te encontrava, mas eu não desistia. Com perfeita paciência fazia todo o percurso de volta, uma via sacra de bêbados, drogados e prostituídos, uísque, Dietil, Diempax. Each man kills the thing he loves. Cena de sangue num bar da Avenida Osvaldo Aranha... Querelle de Brest. O romance de Genet que Fassbinder materializou em película cult assistida por nós no Cinema Um, Sala Vogue. Gaumont Filmes. Brad Davis inesquecivelmente belo e terrível. Marinheiro predador. Muito cuidado com essas noites quentes em que navios ancoram em cais distantes e mal iluminados. Facas perfurantes atravessam estômagos, cortam jugulares, degolam sem piedade. Eu trabalho numa ferrovia, babe, marinheiro não, eu não sou. Não aposte seu rabo se não tiver a intenção de perder. Não se arrisque em sexo fácil pelas esquinas e becos sombrios que o vírus pode te matar. Como matou Brad Davis, o eterno Querelle de Rainer Werner Fassbinder e Andy Warhol. A gente saiu do cinema comendo pipocas e foi beber em um boteco da Avenida Independência. O Vogue ficava na Independência, esquina com a rua Garibaldi, onde eu morava com minha irmã. Garibaldi quase com Osvaldo Aranha, meia quadra do Parque da Redenção. Esse parque que de dia era solar e bem frequentado e que à noite se transformava em território livre, terra sem lei onde os ladrões e os amantes malditos, colegas de copo e de cruz, se perdiam em alamedas escuras e moitas sem fim. Você era desses seres da noite que o parque escondia. Conhecidos em comum me alertavam sobre seus hábitos noturnos. Como você me dava medo e me atraía...
sábado, 7 de outubro de 2023
O VAMPIRO BORIS PARTE II
Boris representava tudo o que mais me atraía e mais era proibido para mim. O lado escuro da lua. Hey, babe, take a walk on the wild side. Era um ser da noite, dos bares. Frequentava lugares que eu sonhava conhecer, mas morria de medo. Tinha medo de tudo, quase. Uma aura de permissividade o envolvia. Ele materializava na minha frente as coisas que eu lia em André Gide, Jean Genet, Tennessee Williams e Bukowski. Então aquele mundo fascinante, habitado por seres livres, rebeldes, malditos, inconformados, desencaixados e sem pudores era acessível para mim? Estava agora ao alcance da minha vontade há tanto tempo reprimida? Difícil de lidar. De aceitar. De administrar. Ele vinha e ia embora com a mesma facilidade. Sumia dias sem dar nenhuma explicação. Ao voltar, calava minha boca cheia de cobranças com beijos de tirar o fôlego. E, rolando no carpete, me fazia esquecer de tudo o que fizera ou deixara de fazer. Enquanto minhas roupas iam sendo arrancadas por aqueles incontáveis braços de polvo sedutor. Quanta novidade para um jovem rapaz vindo do interior...
Eu achava lindos os seus pés e suas mãos. Ficava horas a admirá-los em silêncio. Na minúscula barraca individual em que acampávamos, deitados após o almoço, eu olhava para seus pés descalços apreciando cada mínimo detalhe. Os dedos longos, de unhas perfeitas, bronzeados pelo sol. Na praia ele estava quase sempre descalço, usava no máximo sandálias havaianas. As mãos, vez por outra, dedilhavam as cordas de algum violão. Ô Antonico, vou lhe pedir um favor. Que só depende da sua boa vontade. Prezado amigo Afonsinho, eu continuo aqui mesmo. Aperfeiçoando o imperfeito. Oba, oba, oba Charlie. Como é que é my friend Charlie. Não era só violões que dedilhavam: Suas mãos devassas me percorriam com igual destreza, invadindo bolsos que ele perfurava em direção a intumescências túrgidas e úmidas do meu incontrolado sexo que desabrochava, quanto riso, ó quanta alegria. Eu estou tão cansado, mas não pra dizer que não acredito mais em você...
Nossa sede insaciável de álcool nos levava a uma ronda noturna por botecos e bares nem sempre bem frequentados. E nos despertava outras sedes não menos insaciáveis que às vezes nos faziam ir ao banheiro juntos e lá mesmo, apertados em quatro paredes infectas, aplacá-las aos risos e sair com a maior cara de pau, como se nada tivesse acontecido. Acho que essa loucura toda, entre idas e vindas, não chegou a durar dois anos. Depois disso nos afastamos e, apesar de continuarmos morando na mesma cidade por muito tempo, eu nunca mais o encontrei ou ouvi falar dele. Teria se transformado em morcego e voado para terras distantes? Ou quem sabe seu peito teria sido atravessado por uma estaca? É impressionante a capacidade que algumas pessoas têm de desaparecer da vida da gente sem deixar rastros. Mais de trinta anos se passaram sem que eu nunca o tivesse reencontrado. Mesmo quando já existiam as redes sociais. Nada. Nem um perfil em nenhuma delas. Seriam os vampiros invisíveis nas redes, assim como o são diante dos espelhos? Aí está uma prova que nunca tirei: Não lembro de jamais ter visto a imagem de Boris refletida em um espelho... Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra, diz a elegia de Drumond. Boris era desses: Dos que se transformam quando o sol começa a se por. Dos que mudam quando é lua cheia. Dos que roubam gardênias perfumadíssimas dos jardins noturnos alheios para te dar de presente. Que juram amor eterno e fazem a eternidade caber em uma noite. Era noite de lua cheia na praia da Pinheira. O mar estava coberto por sua luz prateada. Brilhava no meio da noite. Como brilhávamos, Boris e eu, sobre as pedras da ponta da Praia de Cima. Não havia mais nada além dos nossos corpos entrelaçados sobre as pedras da praia. Nada além da luz da lua. Branca. Iridescente. Censurar ninguém se atreve: Mãos que adentravam calças e cuecas. Línguas desbravavam bocas e outros orifícios. A maior expressão da beleza, do amor e do prazer que eu jamais experimentara. Meu pequeno mundo se expandia a universo. Minha percepção se alargava. Minha vida interior desabrochava à luz da lua e à beira mar. Segura as pontas, meu coração. É tão bom sonhar contigo, ó luar tão cândido... Continua no próximo post. Na foto, obra do artista Titi freak.
terça-feira, 3 de outubro de 2023
O VAMPIRO BORIS - PARTE I
Dia desses recebi, pelo aplicativo de mensagens de uma rede social, a notícia do falecimento de Boris. A nota não dava maiores explicações. Vinha da irmã dele, uma amiga muito querida, daquelas que o tempo guarda na memória e a gente nunca mais vê nem ouve falar. Dizia que depois de longos anos de sofrimento, de luta contra a dependência de drogas e várias doenças por elas desencadeadas, ele finalmente descansara. Assim como ela e todos os que o cercavam. A simples leitura desse nome - Boris - acendeu em minha mente a chama de lembranças há muito adormecidas...
Conheci Boris, o vampiro, no ano em que completei vinte anos de idade: 1983. Por pouco eu não atingi ainda virgem a marca dos vinte anos. No limiar do ano, aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo, o tão ansiosamente por mim esperado aconteceu. Melhor, acontecera. Com outro. Mas, voltando a Boris, ele não era de fato um vampiro. Era, na verdade, um garoto de vinte anos, como eu. Mas, para mim, Boris sempre foi nome de vampiro. Ele me lembrava um daqueles seres das trevas. Primeiro pelos olhos, pretos por fora e vermelhos por dentro. Costumava pintar o contorno deles com cajal preto forte e, como fumava muita maconha, os tinha invariavelmente vermelhos na parte interna. Se ainda hoje meu coração não se cansa de ter esperança de um dia ser tudo o que quer (para citar Caetano) imaginem aos vinte anos. Segundo, pelo fato de me sugar por completo. Me tinha em suas mãos. Muito mais vivido e rodado na quilometragem (apesar de termos a mesma idade), me manipulava com natural esperteza e dissimulada cafajestagem. Eu, que dava os primeiros passos na malandragem e boemia da vida, com a cabecinha cheia de fantasias românticas, narrativas açucaradas e desfechos heteronormativos, era presa fácil, facílima para a sanha desenfreada do meu amante algoz...
O conheci por um daqueles acasos totalmente inesperados que a vida nos apresenta. Daqueles que o tempo revela não terem sido acaso nenhum. As férias de verão já tinham acabado e eu havia retomado a minha entediante rotina de aulas na faculdade de História, que sonhava abandonar para cursar Artes Cênicas, minha verdadeira vocação. Uma amiga me convida para irmos passar um feriado prolongado na praia, em Santa Catarina, onde a esperava uma ficante cujo irmão iria conosco no mesmo ônibus. Nos encontramos na rodoviária e, quando adentramos o ônibus, ele já nos esperava devidamente instalado no banco ao lado do meu. Faíscas, tremores, arfares. Meu coraçãozinho neófito quase arrebenta de tanto bater. Movimento retilíneo uniformemente acelerado. Conversa vai, conversa vem, antes da metade da viagem já estávamos nos atracando no banco do ônibus que tinha ficado pequeno para tantos braços, abraços, entrelaçamentos arfantes e sensuais...
Ainda não havia para mim Anne Rice, a tua mais completa tradução: O Vampiro Lestat. Foi mais tarde, no final da década, que vim a conhecer essa intrigante autora de romances cujos protagonistas se alimentam de sangue humano ainda quente. Quando, nas noites cálidas de lua cheia do verão gaúcho, eu me perguntava onde Boris estivera naqueles anos todos em que não nos conhecíamos, mesmo morando em bairros próximos da mesma cidade, não deixava de considerar a possibilidade de ele ter passado os últimos cem ou duzentos anos vivendo em estado vegetativo, sob a superfície da terra, se alimentando de pequenos roedores; e, atraído por sons amplificados de rádios, televisores, guitarras elétricas e melodias complexas como a Arte da Fuga, de Bach, tal como o personagem dos romances de Rice tivesse voltado à superfície justamente na Porto Alegre dos anos oitenta por mim habitada...
Continua no próximo post.
segunda-feira, 25 de setembro de 2023
O QUE TINHA DE SER
Acabo de chegar do cinema. Fui assistir ao documentário Elis & Tom, Só Tinha de Ser com Você. A sensação é de que entrei em uma máquina do tempo que me transportou para uma época em que sensibilidade, talento, cultura, inteligência e genialidade abundavam. Ao contrário do que vivemos hoje em dia, a carência total de todas essas virtudes. Elis Regina e Tom Jobim eram dois grandes artistas e o álbum que resultou desse encontro é uma obra-prima. E, como toda obra-prima, perdura até hoje, passados mais de quarenta anos da sua realização. Como é dito em diversos momentos do filme por vários dos entrevistados, foi uma grande ideia de difícil realização. Aliás, dificílima. Artistas são seres complexos. Grandes artistas são seres muito complexos. Juntar tamanhas complexidades não seria mesmo uma experiência simples... O resultado é esse disco antológico no qual Elis e Tom dão uma aula de música. A gente ri e se emociona o tempo todo no filme. Cenas inéditas de Elis, de quem sempre fui fã, cantando no estúdio acompanhada de Tom, Cezar Camargo Mariano e seus excelentes músicos, me fizeram chorar de emoção e felicidade. Ver Elis cantando aquelas interpretações definitivas de belíssimas canções como Retrato em Branco e Preto, Só Tinha de Ser com Você, Chovendo na Roseira, Modinha e Soneto da Separação, entre outras, foi um dos grandes presentes que a vida me deu. Quando percebi que o filme estava se aproximando do fim fui tomado por enorme tristeza, queria que ele durasse pelo menos mais uma hora. Ah, não seja a vida sempre assim como um luar desesperado a derramar melancolia em mim, poesia em mim... Pretento assistir de novo o quanto antes, até para fixar frases que foram ditas e que no embalo da emoção não consegui gravar. Em determinado momento um dos músicos diz que a arte é também uma forma de amor. E ao longo do difícil processo de criação e execução do álbum, Elis e Tom foram se amando também. Um outro tipo de amor. Amor de artistas criadores pela obra criada. De repente, do riso fez-se o pranto, silencioso e branco como a bruma. De repente, não mais que de repente... É muito lindo, eu gostaria que todos fossem ao cinema prestigiar essa película. Felizmente Roberto de Oliveira registrou tudo o que rolou em Los Angeles durante as gravações. E felizmente as famílias de Elis e Tom permitem que tudo seja levado a público. Quem ganha somos nós, o filme é um presente para os fãs. Assim como o álbum Elis &Tom vem sendo através de décadas... Corram para os cinemas! Afinal, de que servem as flores que nascem pelos caminhos se o caminho sozinho não é nada? Em cartaz nas melhores casas do ramo.
Nas fotos, o cartaz do filme e a capa do álbum antológico.
quinta-feira, 14 de setembro de 2023
PÁSSARO DA MANHÃ
Quando eu tinha catorze para quinze anos me mudei de Soledade para Porto Alegre para fazer o segundo grau (não sei como se chama hoje) num colégio da capital. Meus pais, que investiam tudo no nosso bem maior - nossa educação - faziam questão de que nossos estudos fossem feitos nas melhores instituições de ensino. E nesse quesito, Porto Alegre dava de dez na nossa provinciana e amada cidade natal. Mas já estou me desviando do assunto, que vem a ser o matinal pássaro de Maria Bethânia. Quando cheguei em Porto Alegre, minhas irmãs haviam assisitido recentemente ao show de Bethânia no Teatro Leopoldina e já tinham o LP de mesmo nome, o dito Pássaro da Manhã. Eu, que desde pequeno adorava ouvir música (ficava até tarde da noite escutando a rádio Farroupilha no rádio da Variant do meu pai estacionada em frente à casa ou no meu radinho de pilha da Luluzinha) me tomei de amores por Bethânia, aquela entidade mística e misteriosa, e seu encantador disco recheado de hits e curiosidades. Quando ainda estava morando em Soledade lembro de ver na TV a propaganda do show, em que ela aparecia cantando um trecho da canção Um Índio, de Caetano: "num ponto equidistante entre o Atlântico e o Pacífico, do objeto sim resplandescente descerá o índio"... Minha paixão foi instantânea. Decorei todas as canções e também os textos que Bethânia recitava. Eu já era apaixonado por Olhos nos Olhos, de Chico (hit do álbum anterior, Pássaro Proibido) que era uma das mais tocadas na Rádio Farroupilha. Não sei descrever exatamente o que significava, à época, o lançamento de um novo LP de um dos nossos ídolos. Era uma espécie de pacote surpresa, que a gente aguardava ansiosamente pela chegada e, quando chegava, estava repleto de referências, memórias, identificações e marcas que ficariam para sempre em nossas vidas. O que seria hoje o correspondente? Acho que não existe mais algo tão repleto de significado. O conteúdo, a qualidade das letras e melodias, a excelência vocal, tudo isso se perdeu. Claro que temos, por exemplo, a graça de Marina Sena cantando "ai que delícia o verão, a gente queima o ombrim, a gente brinca no chão", ou Jão a insistir no já batido "gosto de meninos e meninas" requentando Renato Russo (preguiça total). Mas algo como Gonzaguinha, Milton, Chico, Caetano, Fagner, João Bosco, Djavan, Toquinho e Vinicius, sorry, não tem mais... O Pássaro da Manhã trazia textos de Fernando Pessoa, Fauzi Arap, Clarice Lispector e da própria Bethânia. Além dos hits Terezinha e O Que Será, de Chico Buarque, Um Jeito Estúpido de Te Amar, de Isolda, e Tigresa e Gente, ambas de Caetano. Sem falar em Começaria Tudo Outra Vez, de Gonzaguinha. E os arranjos? Meu Deus, que lindeza. E as fotos de Marisa Alvares de Lima? Um deslumbramento. No encarte, uma foto de Bethânia de terninho branco e gravata de pérolas cercada de arranjos de flores brancas... Estive uns dias junto ao mar e, como sempre faço, ouvi bastante esse álbum no Ipad. E a memória me trouxe tudo de volta...É isso, sigo ouvindo Bethânia e seus chiquérrimos pássaros (da manhã e proibido) e também seus dramas. Para haver algum luxo, por Deus! Que eu também preciso. Amém pra todos nós...
Nas fotos, a capa do álbum e do encarte por Marisa Alvares de Lima.
terça-feira, 5 de setembro de 2023
ALMOÇO AMIGO
Não lembro há quanto tempo eu não saía para almoçar com um amigo. Um amigo querido, daqueles das antigas, que a gente fica um tempão sem encontrar e quando encontra continua tudo igual. Quero dizer, a amizade continua igual como sempre foi. Já as vidas mudam o tempo todo e esses encontros também são bons para isso, para atualizar cada um dos dois acerca das mudanças vividas pelo outro. Quem como eu vive numa grande metrópole como São Paulo, por exemplo, sabe que não é fácil fazer um encontro desses acontecer. As pessoas têm agendas intensas de trabalho e de compromissos pessoais, tudo é longe e dificilmente as duas partes conseguem ter um dia e horário disponíveis em comum. Sem falar que todo aquele tempo que passamos isolados em casa por causa da pandemia acabou nos fazendo perder um pouco o hábito dos encontros. Enfim, eu tenho procurado retomar minhas atividades anteriores ao isolamento e, dentre elas, rever amigos é uma das que mais priorizo. (Além de ir ao teatro e passar uns dias junto ao mar). O almoço de hoje com esse amigo muito querido me divertiu, me fez pensar e repensar; me animou a retomar meu processo de desapego e doações, que andava um pouco parado; "botou a fofoca em dia", matou um pouco a saudade e, sobretudo, me fez ver o valor que tem uma amizade verdadeira. Sincera. Desinteressada. Como todas deveriam ser e, infelizmente, muito poucas são. Quantas amizades desse tipo você pode afirmar que tem hoje em dia? Seria capaz de contar? Caberia nos dedos de uma mão? Talvez das duas? Se você tiver uma só que seja, meu conselho é que a agarre para você e não a solte mais. Sabe aquele famoso e batido “ninguém solta a mão de ninguém”? Solta, sim. Então não solte a mão dos seus amigos de verdade. Cultive as amizades. Mesmo que à distância, por e-mail, por carta, por Whatzapp, por videochamada ou pelo direct do Instagram. Lembre do seu amigo com carinho e demonstre esse carinho para ele. Em vez de reencaminhar tudo o que você recebe pelos grupos de mensagem (e às vezes nem lê, só passa adiante) pense, diga ou faça algo especialmente dedicado a ele ou ela. Algo que diga respeito a vocês dois. Uma memória de um momento bom vivido juntos. Um singelo almoço em um lugar agradável no meio da semana. Como o que tive hoje com o meu amigo. O primeiro amigo que fiz quando cheguei aqui em São Paulo há vinte e sete anos...
Na foto, brinquedos que separei para doar assim que cheguei do almoço. Afinal, já estou bem crescidinho.
terça-feira, 29 de agosto de 2023
AGOSTO DUMP
Calma, mês de agosto! Não vá embora ainda que só postei uma vez aqui no blog esse mês! Então vamos lá: Passou voando, sim! O mês e também o primeiro semestre do ano, que de agora em diante voará direto para o Natal rsrsrs. Nem cheguei a comentar aqui tudo o que assisti, li, descobri ou fiz nesse malfadado mês. Confesso andar com preguiça. Muita. Não apenas de escrever, mas de praticamente tu-do. As redes, as pessoas, os lugares, as "trends"... Fui, pela primeira vez, assistir a um show do cantor Zé Ibarra, de quem sou fã há tempos e ainda não tinha visto ao vivo. Um primor. Ele arrasa! Canta e toca lindamente as suas próprias composições e também sucessos de outros artistas. A cereja do bolo é ele cantando Gal no tom antigo da Gal, agudíssimo e hiperafinado. Só ao violão ou acompanhado da banda ele preenche o palco e encanta não só pela música mas, também, pela beleza. Ô menino bonito! O show foi na Casa Natura Musical, que também não conhecia e adorei. E, por falar em menino bonito, Rodrigo Simas também dá show de beleza e talento em Prazer, Hamlet, de Ciro Barcelos, o eterno Dzi Croquette. Deixando claro que nudez em cena, no teatro, definitivamente, é pra quem pode... E o que dizer da fofurice explícita da segunda temporada de Heartstopper, no Netflix? Com Nick e Charlie desfilando seu amor adolescente pelas ruas de Paris? Mata o velho aqui de inveja & saudosismo... Teve a São Paulo Companhia de Dança no Teatro São Pedro com a belíssima trilha sonora executada ao vivo pela orquestra do teatro. Ao som de Villa-Lobos, as telas de Di Cavalcanti ganharam vida na criação de Mirian Druve. Sem falar que é sempre um prazer ver o bailarino Yoshi Suzuki sur la scène. Outro menino bonito, diga-se de passagem... É claro que não teve só belezas & fofuras no mês de agosto todo. Teve tristezas, feiuras e até algumas vergonhas. Frustrações, também, que a vida não é um perfil do Instagram. Perdemos grandes artistas, como Aracy Balabanian e Léa Garcia, para citar apenas duas. Mas deixa a tristeza pra lá. Vamos falar de coisa boa? Teve a visita do queridíssimo Édson Cordeiro, que veio da Alemanha para cantar e encantar em Salvador, na Concha Acústica, acompanhado da Orquestra Sinfônica da Bahia e, na volta, passou por aqui. E, para terminar o mês com chave de ouro, hoje dia 29, é o aniversário do meu mestre, diretor e amigo amado Luís Artur Nunes! Viva Luís Artur! E deixa eu parar por aqui por que, com tanto menino bonito, já "me sinto enfeitiçada, correndo perigo", para citar Rita Lee... Bom fim de agosto a todos!
Nas fotos, Zé Ibarra e seu violão, Rodrigo Simas e seu corpão e a SP Cia de Dança no palco do São Pedro. Aplausos, por favor!
sábado, 12 de agosto de 2023
RETORNO A "A HERANÇA"
Ontem fui ao teatro pela segunda vez para assistir ao mesmo espetáculo. Na verdade, a segunda parte de A Herança, peça de Matthew Lopez em cartaz no Teatro Raul Cortez. Foi o meu "retorno a Howards End", para citar a obra inspiradora dessa bela história. Eu, que saio cada vez menos de casa; que nunca assisto a nada que dure mais de duas horas. Me surpreendi preso a essa complexa e intrigante narrativa de quase sete horas de duração. E ao final da primeira parte já estava louco de vontade de voltar para assistir à segunda... Assim como eu, a plateia toda parece estar mergulhada na história do jovem Eric, interpretado com graça, talento e carisma por Bruno Fagundes, que é também produtor da peça. Fiquei pensando que os intermináveis meses de confinamento que vivemos com a pandemia da covid talvez tenham alterado a nossa percepção da passagem do tempo. Exercitamos à exaustão a contagem das horas, dias e meses. E o que antes parecia longo agora flui de maneira prazerosa. Poderia começar com isso. Também poderia começar dizendo que uma boa história, quando é bem contada, prende a atenção do interlocutor do início ao fim. Uma herança é algo que é doado após a morte de alguém. "O patrimônio, incluindo bens, direitos e dívidas, deixado por alguém em razão de seu falecimento". É disso, em suma, que a peça trata: Da casa que Eric recebe de herança de Walter. Casa que, durante os anos oitenta, abrigou muitos jovens vítimas da Aids. Mas também trata do legado que uma geração de homens gays deixa para a outra. As leituras são vastas e plurais. A gente ri, se emociona e se encanta. É muito tocante lembrar de todos os amigos que perdemos para a Aids. Há shows de interpretação como o monólogo de Marco Antônio Pâmio na primeira parte e a sua imitação dos arroubos dramáticos do personagem de Rafael Primot na segunda. (Não me contive e puxei os merecidos aplausos em cena aberta). Há o talento e juventude de André Torquato, que se desdobra em dois personagens completamente diferentes um do outro em belo exercício de composição. Há também a participação luxuosa de Mirian Mehler que, quase no fim do espetáculo, entra e dá um show. Há a direção sensível e clara de Zé Henrique de Paula. Há um Reynaldo Gianechinni surpreendentemente maduro e belo em cena. Eu nunca o havia visto atuar sur la scène. Há tanta coisa boa que só assistindo. Esse post tem o intuito de recomendar o espetáculo. Depois dos aplausos, Bruno pede que cada pessoa da plateia recomende para outras cinco. É o que estou fazendo aqui. Em agradecimento a esse belíssimo espetáculo a que assisti convido quem me lê a assistir também. Que bom que voltamos a fazer teatro. Que bom que as pessoas voltaram a ir ao teatro. E, last but not least, que bom que Bruno Fagundes herdou dos pais o talento e o amor pelo teatro. Esse espetáculo evidencia que, mesmo ainda tão jovem, Bruno já é um homem de teatro. E que isso fique de herança para as gerações futuras! Corre que ainda dá tempo: A peça fica em cartaz aqui em São Paulo até o dia 03 de setembro e depois vai para o Rio de Janeiro, em curta temporada no Teatro Clara Nunes.
Na foto, Bruno Fagundes e Reynaldo Gianechinni para a divulgação do espetáculo.
terça-feira, 18 de julho de 2023
EMOÇÃO VERDADEIRA
Nesses tempos em que tudo é artificial, até mesmo a inteligência, resolvi falar de uma emoção verdadeira... Nos dias que passei em Porto Alegre aproveitei para visitar a Cema. Iracema. Fomos eu, minha irmã Raquél e nossos amigos Guto e Carminha. Durante muitos anos da minha adolescência e juventude a Cema foi nossa empregada. Não sei se é correto falar assim nos dias atuais. E, também, ela nunca foi apenas isso. Era muito mais. Cuidava da casa e de nós. E mandava na gente também! Rsrsrs... Com o tempo, além de trabalhar para nós, se tornou faxineira do prédio. Não só do nosso, de vários outros da rua também. E de outras ruas. Guto e Carminha, os amigos que foram conosco visitá-la, também são moradores do prédio da rua Garibaldi, onde morei grande parte da minha vida. Meus anos dourados, digamos assim... A Cema não parava. Começava muito cedo e ia até o fim do dia. Já entrava em casa dando ordens: Beto (ela me chama assim), se tu não arrumar o teu quarto eu não vou limpar! E se a Raquél não guardar aquele monte de sapato eu vou jogar tudo pela janela... Descendente de imigrantes alemães, fala com sotaque forte e com aquele "ere caregado". Cema está lutando contra o câncer. Fez uma cirurgia de risco para retirada do tumor e está no processo de recuperação, fisioterapia e repouso. Nossa visita despertou muitas emoções. Choramos, nos abraçamos, ela disse várias vezes que me amava. Quero aproveitar esse post para dizer: Cema, eu te amo muito! Não sei se consigo descrever aqui o que sempre houve a mais entre nós do que a simples relação de tabalho. Sempre fomos amigos. Cúmplices. Lembro do quanto sofremos quando nosso querido amigo Marcelo Pezzi, para quem ela também trabalhava, nos deixou. Lembro com carinho dela indo, toda feliz com a chave do carro na mão, me cumprimentar após a apresentação da minha peça Lisístrata no teatro São Pedro. Muito antes de se ouvir falar em meritocracia, Cema já era a self-made womam que criou e formou a filha, construiu a casa própria, comprou carro e investiu em terras no interior, de onde era originária, apenas com o suor do seu trabalho. Muito antes de se cogitar falar em inclusão, ela já me aceitava e gostava de mim do jeito que eu sempre fui. E agora, quando eu achava que ela não tinha mais como me surpreender, ela me conta que um sobrinho "virou mulher e mudou o nome pra Yasmin". Assim, cheia de afeto e naturalidade... Tomamos café, comemos pãezinhos de queijo, bolo e cuca. Me mostrou os ovos das galinhas que ela tem no quintal. Guto, que é fotógrafo, colheu limões-bergamota do pé que ela tem na frente da casa, para fazer uma foto. Cema sempre foi uma mulher forte, uma verdadeira fortaleza. Vê-la debilitada pela doença, vacilando entre desistir e ir em frente, me fez repensar muitas coisas. Não sei de onde tirei ânimo para encorajá-la a continuar com o tratamento, com a promessa de que, na minha próxima ida a Porto Alegre, eu irei até a casa dela novamente para ela cozinhar para mim e tomarmos juntos uma cerveja. Essa semana ela começa as sessões de radioterapia. Vou rezar e torcer muito pela sua recuperação. E contar os dias para o nosso reencontro...
Nas fotos, Cema e eu no dia da visita, os limões-bergamota fotografados por Guto e Cema et moi nos velhos tempos do Edifício Navarra.
sábado, 1 de julho de 2023
TERRA SEM MAPA
Que bom que estou de volta a Porto Alegre depois de quase quatro anos. Que bom, também, que o teatro está de volta. E tem mais: O bom teatro está de volta. Aquele que, sem maiores pirotecnias, se faz verdadeiro bem diante dos nossos olhos. Com seus recursos primeiros e essenciais: Atores e plateia; reunidos para essa celebração que permite que a magia aconteça. E faz com que todos, público, atores, tecnicos e funcionários embarquem em uma viagem poética rumo a uma terra sem fronteiras, aquela para a qual sempre voltamos: A da memória. (Um dos universos que mais me encantam nessa vida). Estou me referindo ao espetáculo Terra Sem Mapa, a que tive o prazer de assistir no novo e interessante espaço Zona Cultural, aqui na capital dos pampas. Sempre teremos Paris, para citar um cult movie. O trem que chega é o mesmo trem da partida, para citar Milton. Mas a vida em si, com tudo o que trazemos conosco ou deixamos para trás, está misteriosa e encantadoramente contida na memória. Vrum e Luba, personagens criados e muito bem alimentados pelos brilhantes atores Sergio Lulkin e Mirna Spritzer, são os condutores dessa nau que arrebata a plateia e a transporta por seu labirinto de emoções, experiências e histórias transbordantes de lirismo; o maestro que rege a orquestra imaginária, a menina que chora com a chuva, o urso com a pata ferida, o caldo de galinha para a sopa, os pais e mães que deixam e são deixados para trás, os lugares de onde saímos e os outros, para onde iremos e de onde tornaremos a voltar. Os personagens/contadores de histórias amarram lembranças, improvisações e leituras a danças, brincadeiras e canções como crianças que deixam correr solta a imaginação. Em um palco vazio, preenchido por iluminação e trilha sonora inspiradas, eles desfilam entre as brumas das lembranças nos levando gentilmente consigo. Daqueles espetáculos que ficam guardados para sempre na - vejam só - memória da gente. Uma pequena joia; um presente de Sergio e Mirna para a cidade que os viu desabrochar como os talentos que são. Talentos esses que vem sendo burilados através dos anos e que, como os bons vinhos, só melhoram. Imperdível!
Na foto, Sergio e Mirna nas peles de Vrum e Luba.
domingo, 18 de junho de 2023
EMOÇÕES CARAS
Cá entre nós: Às vezes a vida não fica morna demais? Tudo meio normal, médio, beirando a mediocridade? Nesses momentos estão em falta as emoções caras. Não no sentido financeiro, mas que são caras à gente. Que nos trazem vida, acalanto, nos aquecem o coração e a alma. E fazem, claro, a pele ficar arrepiada e os batimentos cardíacos, acelerados. Elis cantando Na Baixa do Sapateiro a plenos pulmões no Festival de Montreaux, por exemplo; um beijo na boca cheio de paixão e lascívia, daqueles que quando a pessoa começa a se aproximar a gente já sente o arrepio na coluna; aquele entardecer à beira-mar tomando champanhe com quem se ama; um bolero bem dançado, de rosto colado, à meia luz com um globo de espelhos girando; a viagem dos sonhos ao país ou cidade preferidos com direito a tudo que te faz amar aquele lugar e torná-lo especial para você; aquela pessoa incrível que você conhece do nada, num boteco de esquina, e com quem descobre ter uma gama infindável de conexões; reunir todos os amigos mais queridos numa festa sem hora para acabar; passar um mês em Paris assistindo a todos os espetáculos da temporada; seu projeto há anos trabalhado saindo do papel e se tornando enfim realidade; o já saudoso sucesso; uma plateia lotada te aplaudindo; o sapato, bolsa, óculos ou tênis caríssimos que você namorava há tempos e agora vai poder comprar; a sonhada promoção, o dinheiro que finalmente cai na conta. Sim, dinheiro também. Que de emoções baratas a gente já anda por aqui! E sonhos de consumo também são sonhos a serem realizados… Taí: Nada melhor para sacudir a mesmice do que realizar um sonho. Material ou imaterial. Real ou virtual. Dormindo ou acordado. Ou, como cantou Djavan, o direito de escolher a música melhor para se dançar… Na foto, Elis arrasando no Festival de Montreaux.
domingo, 4 de junho de 2023
FESTA NO CÉU
Rita Lee chegou no céu ainda sonolenta. Não estava entendendo direito o que tinha acontecido. Meu Deus, pensou. Estou com uma ressaca daquelas... Peraí, como assim? Eu não bebo mais, não uso mais nada, tô limpa faz mó tempão! Uma verdadeira Santa Rita de Sampa! De súbito, se deu conta de que tinha feito a passagem. Então aqui é o céu? Bom, pelo menos não fui pro inferno, como muita gente jurava que eu iria… Se espreguiçou um pouco, alongou braços e pernas, respirou fundo e entrou. São Pedro a aguardava para o checkin. Foi muito bem recebida e talz. Então perguntou pela sua amiga, que há muito sonhava rever: Onde eu posso encontrar a Elis? Um anjo que por ali esvoaçava respondeu: Tá vendo aquela nuvem ali na frente? Chegando lá, você vira à esquerda e vai até aquela outra nuvem bem carregada. É lá. Mas chegue de mansinho… Quando virou à esquerda, Rita logo percebeu que a nuvem da Elis estava cinza, tipo cúmulus nimbus mesmo. Soltando raios e trovões. Elis tinha acordado puta, de mau humor, pois no show da noite passada no céu só tinha gente desafinada. Quando Rita se aproximou, pé ante pé, Elis sacou a presença da amiga e mandou: Porra, bicho, até que enfim! Isso aqui tava uma caretice insuportável! Se abraçaram demoradamente. E entoaram: Baila, comigo, como se baila na tribo... Relembraram a visita que Elis fez a Rita quando ela estava presa; o modelito que Rita usou no Lança Perfume e que Elis copiou no Trem Azul; também se lembraram de quando foram ao Rio de Janeiro gravar o especial Mulher 80 da Globo e ficaram no camarim fazendo graça das sexualidades das outras cantoras. Cê não sabe, hoje em dia tá babado, disse Rita. Tá cheio de não-binárias! Ou melhor, não-bináries... E riram muito, lembrando de muitas outras coisas que viveram juntas. Lá pelas tantas, Elis perguntou: E a Maria Rita, tá cantando direitinho? É afinada, pelo menos? Kkkkk, riram mais ainda. Hoje à noite vai ter balada no céu. Vamos arrombar a festa! Sabe, Elis - disse Rita - eu tô mó zen. Depois que você partiu eu fui me acalmando, curtindo só a música, os bichos, os filhos e o Roberto. Até show parei de fazer. Ficava só de boa no meu sítio. Mas você fez falta! Aliás, continua fazendo. Vou te confessar: Depois de você não veio nenhuma outra igual. Ne-nhu-ma. Nem parecida. Você era mesmo a melhor! Se abraçaram mais uma vez e saíram pelas nuvens planejando o show que fariam no Festcéu, as duas usando o mesmo figurino do Lança Perfume/Trem Azul e cantando Doce de Pimenta, que Rita fez para Elis: “Cada um vive como pode e eu não nasci pra sofrer. Cara feia pra mim é fome, eu não faço manha pra comer. A vida é como uma escola e a morte é um vestibular. No inferno eu entro sem cola, mas o céu eu vou ter que descolar”... Vem, amiga. Vamos passar na nuvem da Gal para acordá-la, disse Elis. Boa, emendou Rita. E depois, claro, vamos até a Hebe que eu to louca pra tascar um selinho nela... Desde então o “céu” nunca mais seria o mesmo.
Nas fotos, Rita & Elis no especial da Band.
Enviado do meu iPhone
sábado, 20 de maio de 2023
ROBERTO SEM RITA
Há muito tempo uma mulher sentou-se e leu na bola de cristal que uma menina loura ia vir de uma cidade industrial. De bicicleta, de bermuda, mutante, bonita, solta, decidida, cheia de vida, etc e tal, cantando ié ié ié… Dias de sol à beira-mar, friozinho outonal e entardeceres de beleza incomum. Só penso em Rita Lee. Suas canções na minha cabeça e na caixa de som. Rita Lee foi passear, vinte anos, namorar talvez. Tanto amor pra dar. Ela quer ser feliz. Ela só quer seu par... Roberto sem Rita. O marido e eu, Roberto também. O palhaço ri dali, o povo chora daqui, diz o ditado... O bom é que Rita estará sempre aqui. A cara de São Paulo. Como Hebe Camargo, que até hoje não acredito que morreu. Vamos embora, companheiro, vamos. Eles estão por fora do que eu sinto por você... Louco pra rever todos os DVDs dela que tenho. Num apartamento, perdido na cidade, alguém está tentando acreditar que as coisas vão melhorar ultimamente... Ouvir todos os CDs e LPs, reler todos os livros, apreciar todas as fotografias. Depois que eu envelhecer ninguém precisa mais me dizer como é estranho ser humano nessas horas de partida. São coisas da vida e a gente se olha e não sabe se vai ou se fica… Fica. Rita fica para sempre em mim. A Rita levou meu sorriso, no sorriso dela meu assunto... Por enquanto é só, nesse mês de maio que nos levou Rita...
Fotos do livro FavoRita.
quarta-feira, 10 de maio de 2023
RITA FOREVER
São Paulo amanheceu chorando pela despedida da sua mais completa tradução. Chove sem parar em Sampa City. Eu ainda não tenho palavras para expressar o tamanho, a intensidade do sentimento que me abate pela morte de Rita Lee. Falar dela é meio que impossível, já que é dona de extensa trajetória e de uma obra não menos extensa, além de profundamente significativa e representativa da música e da cultura brasileiras. Não teria espaço suficiente em nenhuma plataforma. Além do que, ela já nos brindou com suas pérolas de sabedoria ao longo da obra e na sua brilhante autobiografia. Então só me resta falar de Rita em mim. Na minha vida P&B que ganhou cores radiantes a partir dela… Eu teria onze, doze anos no máximo quando Rita lançou o álbum Fruto Proibido e me apaixonei à primeira audição de Ovelha Negra. Eu já amava a gravação dela da versão de José, mas nem sabia que era ela quem cantava. Depois fui descobrindo Agora Só Falta Você, Cartão Postal, Esse Tal de Roque Enrow (o hino de todos os desajustados), Luz Del Fuego e Dançar Pra Não Dançar que foi, durante anos, a minha preferida. (Era louco por aquele piano na introdução). Sonhava usar aquelas roupas que ela e os músicos vestiam, aquelas botas de plataforma e os cabelos compridos. Tudo muito pouco adequado para um menino da minha idade numa cidade do interior… Quando me mudei para Porto Alegre, em 1978, com catorze para quinze anos, o primeiro show a que assisti foi Babilônia, no antigo Teatro Leopoldina. Felizmente, de lá para cá, perdi a conta de quantos shows de Rita tive o privilégio de assistir. Em Porto Alegre, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Rita sempre foi um ídolo para mim, uma referência de bom humor, irreverência, alegria, inteligência e sobretudo, contestação. Maravilhosa. Inesquecível. Adorável transgressora. Corista de rock. Em um dos shows a que assisti aqui em São Paulo, na extinta casa de shows Olímpia, tive a graça de ir ao camarim dela junto com Edson Cordeiro e o saudoso Ocimar Versolato, que a vestira para a ocasião e que generosamente me convidou para acompanhá-los. Lá Edinho fez a única foto que tenho com Rita. Ainda consigo ouvir, na memória auditiva da minha infância, Rita cantando nas manhãs da TV Mulher: Por isso não provoque, é cor de rosa choque. A Rita compositora nas vozes de Ney Matogrosso em Bandido Corazón e Amor Objeto, Zezé Motta em Prazer Zezé, As Frenéticas em Fonte da Juventude e Elis Regina em Alô Alô Marciano. Por falar em Elis, não chorava tanto pela morte de um ídolo desde que Elis nos deixou, no começo dos anos oitenta. Choro de bobo que sou, porque Rita sempre foi pura alegria. Minha vida em discos que Rita gravou. Minha vida em trilhas sonoras de novelas em que ela cantou. Minha vida em bailinhos de garagem ao som de seus LPs. Minha vida em filmes nos quais ela atuou. Minha vida em livros que ela escreveu. Minha vida sem Rita, nem sei mais… “Disseram que o palco não é mais aquele lugar. Mas do jeito que a gente me olha de frente, como eu vou parar?” cantava ela em Corista de Rock, no álbum Entradas & Bandeiras. Entre as muitas imagens de Rita que trago na memória, uma em especial eu vou guardar para sempre. Em um de seus shows a que assisti em Porto Alegre, no Ginásio Gigantinho, Rita voando sobre a plateia em um enorme balanço preso ao teto do ginásio. Quero lembrar dela assim, voando, que é como ela deve estar agora. São coisas da vida. E a gente se olha e nem sabe se vai ou se fica. Fica. Rita fica para sempre...
Nas fotos, Rita fotografada por mim no show Babilônia, Rita e eu fotografados por Edson Cordeiro no Olímpia e eu vestindo fraque e jabô de Rita em uma exposição/bazar de seus figurinos.
terça-feira, 25 de abril de 2023
SESSENTA OUTONOS
Pois é, sessentei. Quem diria! Não gosto de contar meus anos em primaveras, como habitualmente se faz. Nasci no mês de abril, em pleno outono. Então eu conto assim: Acabo de completar sessenta outonos... E com a cabeça na lua! Rsrsrs… É claro que, como bom taurino, também tenho os pés plantados no chão. Apesar da minha aparente cabeça avoada, tenho uma boa conexão com a realidade. Só que a realidade por vezes me esmaga. Aliás, quase sempre. Não me sinto adulto o suficiente para encará-la. Então preciso de válvulas de escape, um certo lirismo, devaneios, loucuras. Vou enfeitando a vida com literatura, teatro, cinema, música e álcool. A procurar fazer do mundo um lugar melhor para viver… A cada década da minha existência lembro de meu pai, que no dia em que fiz dez anos me deu de presente um relógio- o primeiro que ganhei - e me disse que eu estava subindo o primeiro degrau da minha vida. Chego, portanto, ao sexto degrau. Com a sensação de que do terceiro pra cá tenho subido muito rápido! O primeiro e o segundo demoraram tanto a passar e agora passa tão depressa que tenho a impressão de que estou subindo de elevador… Chego aos sessenta ainda adolescente. Um idoso incapaz de lidar com as idiossincrasias do ser humano e com certa dificuldade de viver em sociedade. Hoje posso afirmar que vivo mais nos livros do que na vida real. Tenho consciência dos meus privilégios e sou grato por eles, que me permitem levar essa vida semi-real. Trago feridas emocionais deixadas pelo bullying que sofri na infância e adolescência. Sim, havia isso, apesar dos saudosistas da repressão insistirem que “naquele tempo não tinha essas frescuras”(Perdoai-os, pai, eles não sentiram na pele)… Aos trancos fui me inserindo nos avanços da tecnologia e na digitalização de tudo. (Confesso ainda resistir a alguns aplicativos, operações bancárias e compras pela internet). Com a diplomacia que me é natural tenho me mantido fora de polarizações. Ou acima, não sei… Driblando minha sufocante timidez consegui fazer sucesso nos palcos como comediante. (Até hoje não acredito). Isso tudo sem nunca ter feito uma única sessão de terapia. Imaginem eu, todo resolvido e trabalhado, que insuportável que seria! Mas vamos falar de coisa boa? O corpinho continua uma loucura! Rsrsrs. Apesar de toda essa pauta (para usar uma palavra da moda) sobre etarismo (outra), me sinto jovem e de bem com meu corpo. Aliás, acho que nunca estive melhor fisicamente do que agora. Claro, a pele laceia, o colágeno desaparece, a gravidade exerce com poder o seu efeito mas, com força-fé-e-endorfina a gente vai em frente... Não creio que já tenha vivido tudo o que me foi dado viver. Ainda espero muito dessa minha experiência terrestre. Embora sem maiores ilusões ou ingenuidades, a cabecinha voa longe quando imagino o que ainda está por vir. E é só coisa boa… Fasten your seat belts, que o sessentão-garoto promete turbulência! E assim que voltar da praia vou providenciar minha carteirinha de idoso e desfrutar dos privilégios que a minha nova idade me proporciona. E, para terminar falando em relógios, um dos que meu pai me deu foi o seu Omega de bolso, que ficou anos perdido no campo e, quando foi encontrado pelo capataz, foi só dar corda que voltou a funcionar imediatamente. Seu interior, de ouro e rubis, resistiu intacto à intempérie. E assim é a passagem do tempo em nossas vidas…
Na foto, eu e meus sessenta outonos junto ao mar de Camburi.
segunda-feira, 17 de abril de 2023
TCHAIKOWSKY, SÉC. XXI
São Paulo, década de vinte do século atual: Da janela do ônibus li o título estampado na fachada do cinema da Avenida Paulista: A Esposa de Tchaikowsky. Desde aquele instante comecei uma viagem sem volta. Soledade, década de setenta do século passado: Minha professora de piano me pede para escolher um compositor sobre o qual eu gostaria de fazer um trabalho de pesquisa. Respondo sem vacilar: Tchaikowsky. Piotr Ilitch Tchaikowsky. Talvez eu tenha escolhido mais pela sonoridade do nome, que me era totalmente exótica, do que pela obra em si, que então eu pouco conhecia além do Concerto Número 1 Para Piano e Orquestra. De onde eu tirei o material da pesquisa, a memória me trai. Deve ter sido de alguma enciclopédia, que era o que basicamente tínhamos à época. Ou de algum livro que a própria professora tenha me emprestado. O que ficou foi a decepção que tive. Que vida triste! Na minha santa ingenuidade de criança do interior, gente famosa tinha vidas maravilhosas, cheias de sucesso & glamur. Fiquei chocado com a aura de sofrimento com que era pintado o seu retrato. E o pior: Sua suposta homossexualidade. Isso, para mim, foi o mais difícil de entender. O que ainda era descrito como "homossexualismo". Um palavrão impronunciável. Como me arrependi de ter escolhido aquele compositor. Mas já era tarde, o trabalho precisava ser entregue. Que estrago faziam com a cabeça das crianças escondendo-lhes tudo e distorcendo tudo da pior maneira... Hoje a vontade de ir ao cinema foi incontrolável. Mesmo sabendo que era um filme um pouco mais longo do que as habituais duas horas de duração, que são o meu limite. A tristeza estava toda lá. Filmada, traduzida em imagens. O filme me levou para uma viagem sem volta, tal qual a que entrei em direção ao passado quando li o título da janela do ônibus. Uma viagem escura e linda. À luz de velas. Um delírio musical e poético. Por vezes erótico. Corpos nus, músculos e genitálias. A Rússia do final do século dezenove se impondo sobre os seus cidadãos. Ditando suas regras. Como, de certa forma, segue fazendo até hoje... Mas, como cinema é também magia e fantasia, encontrei momentos de prazer e alegria na vida do meu compositor escolhido: Ele bem que se divertia de vez em quando - entre uma sinfonia e outra - com suas amigas bibas e seus boys magia. À luz do século XXI isso não podia continuar sendo mantido em segredo. Foi um bom resgate de memória para mim. Uma verdadeira glasnost...
Na foto, Piotr Ilich e sua esposa.
sexta-feira, 31 de março de 2023
TRANS É TUDO
Hoje é o Dia da Visibilidade Trans. Pois dia desses, conversando ao telefone com meu amigo Edson Cordeiro, que há anos mora na Alemanha, falávamos do bem-vindo aumento da visibilidade trans quando me lembrei da nossa saudosa amiga Claudia Wonder. Lamentei que ela, grande precursora dessa visibilidade, não tivesse chegado a viver para ver esse merecido reconhecimento. Edinho então me sugeriu o seguinte: A maneira de fazer com que as portas que ela abriu permaneçam abertas é justamente lembrar dela. Falar dela para as novas gerações. Concordo plenamente. Precisamos atualizar a memória de Claudia. Sua importância não apenas para a comunidade LGBTQIAP+, mas para a sociedade como um todo. Lá nos anos oitenta e noventa do século passado ela já lutava galhardamente pela inserção das travestis na sociedade e no mercado de trabalho. Pela dissociação da imagem das travestis da prostituição. Claudia era uma grande artista e um grande ser humano. Que bom que tive o privilégio de ser seu amigo, de conviver com ela como vizinha de prédio. Aliás, ela, Edson e eu éramos vizinhos e nos acenávamos pela janela. Eles, do predinho da esquina da Hadock Lobo – mais conhecido como A Prédia, tal a quantidade de gays que lá moravam – e eu do meu prédio na Alameda Franca... Aprendi muito com ela, sábia que era. E generosa... Relendo crônicas de Caio Fernando Abreu para a pesquisa do meu solo Caio em Revista, me deparo com uma chamada Meu Amigo Claudia. Nela, Caio conta de um jantar em que esteve na companhia de Claudia; de como ela foi agredida por um “senhor” naquele jantar; de como se sentaram lado a lado e ficaram amigos; conta dos shows dela no Madame Satã e da coragem de Claudia de ser completamente quem era. Corajoso ele também: Na Sampa da década de oitenta do século passado, nem tudo era vanguarda... Essa crônica inspirou o título de um documentário sobre ela chamado, justamente, Meu Amigo Claudia. Pop que só ela, tenho certeza de que teria adorado ver Linn da Quebrada participando do BBB, por exemplo; e o sucesso de Gloria Groove; sem falar no imenso talento de minha amiga gaúcha Valéria Barcellos, cantora e atriz que fará parte da próxima novela das nove da Globo... Há muitos registros de Claudia Wonder em CD, cinema e livro. Eu não vivi aquela Sampa dos oitenta, do Madame Satã, da Claudia nua numa banheira de groselha. Mas tive o privilégio de tê-la pertinho de mim por alguns anos aqui nos jardins. Cheguei a dirigi-la em uma performance na extinta boate So Go em que ela representava aquele androide do filme Marte Ataca. E, também, em um show de Laura Finochiaro no Centro Cultural São Paulo chamado, justamente, Viva a Diversidade. É isso, por hoje. Uma tentativa de dar um pouco mais de visibilidade trans à minha saudosa amiga. Os mais jovens ou desavisados que busquem por ela no Google...
Nas fotos, com Claudia Wonder chez moi, com Linn na entrega do Prêmio Arcanjo e com Valéria como Val & Gal na Terça Insana.
terça-feira, 28 de março de 2023
MARÇO FECHANDO O VERÃO
O mês de março, que mal começou, já está na sua reta final. O terceiro mês de um ano que parece ter começado ontem. E assim vamos, céleres rumo ao fim de mais um ano que passará em um triz, como vem sendo desde sei lá quando… (É pau, é pedra, é o fim do caminho). Meus últimos dias de março se passaram junto ao mar de Santa Catarina, na companhia de minhas irmãs Raquél e Regina. (Mais a doce Chica, filha pet da Regina, e nossa nova amiga Lolita). O belíssimo litoral catarinense, que em muito lembra o litoral norte de São Paulo, continua inspirador e relaxante como nos tempos da minha juventude. Junto com minhas irmãs relembramos nossa infância em Soledade e nossa juventude em Porto Alegre. Revivemos histórias, lembramos de nossos pais, familiares, amigos e professores. É incrível como a memória guarda tudo bem guardadinho e, quando é acessada, traz tudo à tona em segundos e a gente viaja no tempo com riqueza de detalhes... (É um peixe, é um gesto, é uma prata brilhando). Fizemos passeios lindos, de carro, a pé (Uma trilha até o alto de um morro) e de bicicleta; revi cidades como Florianóplois, Blumenau e Balneário Camburiú, sempre retornando a nosso QG em Meia Praia, chez minha irmã Regina; reencontrei pessoas queridas, amigos e familiares, entre eles minha sobrinha Viviane e meu sobrinho-neto Martin; pegamos praia todos os dias, bebemos vinho e comemos muito. (Uma semana inteira sem dieta nem treinos, com direito a doces, frituras e chopps). Agora, já de volta a São Paulo, retomo minha espartana (Pero no mucho) rotina diária de treinos e, evidentemente, fecho minha boca. (É o projeto da casa, é o corpo na cama). Mas quer saber? Esses excessos são tão necessários para a saúde quanto as privações. Pelo menos para a saúde mental... E deixa eu parar por aqui, antes que chegue abril, o mês em que irei completar sessenta anos de idade e me tornar, oficialmente, um idoso. Não que eu ainda não o seja. (É o mistério profundo, é o queira ou não queira). Bom fim de março a todos. (É a promessa de vida no meu coração)...
Nas fotos, eu em três momentos: No topo do Morro do Macaco, após subir a exaustiva porém deslumbrante trilha de dois quilômetros, com a Chica e com minha irmãs.
sábado, 11 de março de 2023
CARTAS
Se o leitor tiver menos de trinta anos, certamente não sabe o que é uma carta. Ou, pelo menos, nunca escreveu ou recebeu uma. Mas, por outro lado, imagino que ninguém com menos de trinta esteja me lendo... Estou me deliciando com a leitura das cartas de Caio Fernando Abreu reunidas em livro por Ítalo Moriconi. (Para quem não conhece, Moriconi é professor de literatura na UERJ, poeta, doutor em Letras e organizador das antologias Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século e Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século). Embora tardiamente, a obra me chega às mãos no oportuno momento em que me debruço sobre a vida e obra do escritor gaúcho para a realização do meu solo Caio em Revista, com direção de Luis Artur Nunes. À época do lançamento não dei a devida importância, talvez achando que cartas não tivessem o valor ou a qualidade da obra do escritor. Ledo e Nagle engano, para citar o próprio. O Caio epistolar é tão literário quanto o contista, romancista ou cronista. A gente percebe o seu estilo marcante e particular nos mínimos detalhes. E, por mais que ele não tivesse a preocupação de que "um dia viessem a ser publicadas", se revelava por inteiro nelas assim como no restante da obra. E com que cuidado! Caio, ao mesmo tempo em que burila o próprio estilo, brinca com ele e mesmo se diverte experimentando variações estilísticas. Um primor... O minucioso trabalho de pesquisa de Ítalo Moriconi nos apresenta as missivas em ordem cronológica, o que permite ao leitor acompanhar as mudanças de humor de Caio, suas expectativas em relação à vida, aos fatos, à sociedade, à política, suas alternâncias de estado de espírito, sua peregrinação constante de uma cidade a outra, de um país a outro, sua relação de amor e ódio com os lugares onde vivia. E o quanto se dedicava aos amigos e ao cultivo das amizades. Alguns amigos se recusaram a doar as cartas para a publicação. Compreensível, do ponto de vista de temerem uma possível exposição da intimidade do remetente. Mas ele nunca teve medo de se expor. E mesmo quando ficcionava, estava totalmente exposto no que escrevia. Isso sem falar que tudo o que escrevia era, no mínimo, muito bem feito. Como brincou Luis Artur Nunes, até uma lista de compras feita por Caio seria bem escrita... Isso faz da publicação uma obra relevante e de grande importância para o conhecimento do estilo e da interioridade do Caio "pessoal", que em nada difere do Caio "profissional", uma vez que ele se doava completamente ao que escrevia. E para as novas gerações, que não chegaram a escrever cartas, é, no mínimo, interessantíssimo. Se é que as novas gerações se interessam por alguma coisa que não seja a internet. A leitura dessas cartas tem me envolvido mais do que uma série de televisão, por exemplo. Leio o tempo todo, em casa, no ônibus, antes de dormir. Revivo épocas da minha vida através das vivências de Caio. Que bom que ele escreveu tanto. E que bom que esse tanto está à disposição de quem quiser conhecê-lo melhor.
Na foto, a capa da excelente publicação de Ítalo Moriconi.
domingo, 26 de fevereiro de 2023
CLARICE FALA
Minha amiga Annelise Hachmann me mandou pelo whatsap a entrevista que Clarice Lispector concedeu a Marina Colassanti e Afonso Romano de Santana para os arquivos do MIS, Museu da Imagem e do Som. O arquivo traz a tradução da entrevista para o inglês, por escrito, e também o áudio original. É um áudio longo, sobretudo em tempos de internet. Tem mais de uma hora de duração. Mas vale cada segundo. Sou um fã de Clarice daqueles fanáticos, minha obsessão por ela beira a adição. Li tudo ou, pelo menos, quase tudo o que ela escreveu. E fora a obra, sempre a achei fascinante como pessoa. Clarice encarna a figura mítica da escritora misteriosa, o personagem romântico movido a inspiração que, quando não está escrevendo, cai em depressão até que alguma nova urgência a mova a se dedicar ao seu ofício. Amo e me identifico num grau absoluto. No áudio dessa entrevista, ela se revela humana e muito, muito falha. E ainda assim fascinante. O que todos achavam ser seu sotaque de russa, ela define como "língua presa mesmo". E explica que a cirurgia não valia a pena por ser um local muito úmido cuja cicatrização seria muito difícil. Perde o fio da meada o tempo todo e não procura disfarçar. Diz: O que eu estava falando? Hi, me perdi... Adorável. Hoje seria diagnosticada com déficit de atenção, no mínimo. Ela própria justifica esses lapsos dizendo já ter consultado um médico para saber se era normal pensar tantas coisas ao mesmo tempo. E o médico teria respondido: Sim, todo mundo pensa... A maior parte do que é dito na entrevista a gente já leu ou ouviu falar. Tudo faz parte da aura de mistério que envolve Clarice. Mas é fascinante ouvi-la tão despojada conversando com amigos. Pede Coca-Cola, pergunta se tem alguma coisa para comer, pois não tinha almoçado. Revela que não lê as traduções de seus livros para não se irritar, porque sabe que não foi ela que escreveu aquilo... Fiquei muito satisfeito e feliz de ter reservado parte da minha manhã de domingo para degustar essa pérola. Ou melhor, essa iguaria, pois pérola não se degusta. Que bom seria se tudo o que a gente recebesse por esses aplicativos de mensagem fossem coisas assim! Como o mundo seria melhor... Mas, enfim, o mundo não é assim tão bacana. E o que se compartilha nas redes passa longe, muito longe de algo desse quilate. Viva Clarice Lispector. Quem ainda não a leu, que o faça imediatamente. Quem ainda não a ouviu falar, que busque essa entrevista. Prometo maravilhas. Mas, como disse, é uma pérola. E pérolas são para poucos...
Na foto, Clarice no Central Park, fotografada por Érico Veríssimo. Presente da minha amiga Mariana Veríssimo, neta de Érico.
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