15 ANOS
Hoje faz quinze anos que o escritor gaúcho Caio Fernando Abreu faleceu. Cada vez que chega uma dessas datas, do tipo aniversário de morte ou nascimento de alguém, me dou conta do quanto a vida está passando depressa. Demais. Eu tive a sorte de conhecer pessoalmente esse que sempre foi um dos meus escritores favoritos. Caio falava a minha língua. A língua de uma geração. Tenho comigo até hoje guardada uma foto dele que roubei de um painel do Clube de Cultura no começo dos anos oitenta. Eu já era fã do Caio e adorava frequentar o bar do Clube de Cultura, na Ramiro Barcelos, em Porto Alegre. Acho que na ocasião estava em cartaz no teatro do Clube a peça Reunião de Família, adaptação que Caio fizera para o romance de Lya Luft, e a produção do espetáculo montou um painel com fotos e matérias de jornal para divulgá-la. Discretamente, parei em frente ao painel e peguei a foto do Caio sem que ninguém visse. Ela ficou anos colada na parede do meu quarto em Porto...Quando, em 1990, estava morando em Paris, hospedei em meu apartamento nosso amigo em comum Luiz Arthur Nunes, que havia ganho um prêmio Molière pela peça que escrevera em parceria com Caio, A Maldição do Vale Negro, e aproveitou a passagem da Air France com que o prêmio contemplava os vencedores para dar um giro pela Europa. Depois de ficar uns dias comigo, Luiz foi a Londres, onde encontrou com Caio, e, na volta a Paris, ele me disse: Dei teu telefone pro Caio. Ele está vindo para Paris e vai te ligar. Passa um tempo, Luiz volta para o Brasil, e eu esqueço completamente do que ele me falara. Um belo dia, estou em casa, toca o telefone, eu atendo e escuto: Alô, Roberto? É o Caio. Quase desmaiei...Marcamos de nos encontrar para nos conhecermos. Fui pegá-lo na casa do amigo que o hospedava e passamos uma agradável tarde juntos, passeando, sentando em um café e conversando muito. Eu citava trechos de livros seus que sabia de cor. Contei o quanto seu livro Triângulo das Águas mexeu comigo, e que um dos contos começava assim: Acabei de me masturbar. E ele: Eu escrevi isso? Uma noite ele foi jantar em minha casa e depois saímos para beber no Duplex, que na época já era o meu bar favorito em Paris. Lá pelas tantas ele me pergunta: Robertinho, posso mesmo dormir na tua casa? Claro, Caio, respondi. E ele: Então vamos encher o cú de Brahma! Adorável...Quando voltei ao Brasil nos encontramos diversas vezes no Rio e em São Paulo. Tive o prazer de conhecer seu apartamento da rua Hadock Lobo, onde agora seríamos vizinhos, pois moro na Franca com a Hadock. No meu aniversário de trinta anos, que comemorei em Porto Alegre, ele estava presente. Já debilitado pela doença, Caio tinha voltado a morar lá. A última vez que o vi foi em um show de Fito Paez, na Reitoria da UFRGS. Ele estava com a Mary Mezzari, sentados na fila em frente à minha. Quando Fito começou a cantar a segunda música ele me perguntou: E aí, já dá pra dizer se ele é Jacira? Querido... Quando ele morreu, não tive coragem de ir ao enterro. Sinto muito não tê-lo conhecido antes, convivido mais. Todo mundo dizia que Caio tinha um pé na fossa. E era isso que eu adorava, pois também tinha. Sem falar no seu humor, deliciosamente ácido. Amanhã, dia 26, vou homenageá-lo na Mini Mostra Caio, que o Mini Teatro, da Praça Roosevelt, está organizando. Apresentarei seu texo A Lenda das Jaciras, pelo qual tenho verdadeira paixão. Quem estiver em São Paulo, não perca. À meia noite. E pra encerrar, um trecho da Lenda: “Jacira que é Jacira nasce Jacira, vive Jacira e morre Jacira. No fundo, achando que Telmas, Irmas e Irenes são tão Jaciras quanto elas. E talvez tenham razão!”
Na imagem que ilustra o post, a foto que roubei do Clube de Cultura.
Hoje faz quinze anos que o escritor gaúcho Caio Fernando Abreu faleceu. Cada vez que chega uma dessas datas, do tipo aniversário de morte ou nascimento de alguém, me dou conta do quanto a vida está passando depressa. Demais. Eu tive a sorte de conhecer pessoalmente esse que sempre foi um dos meus escritores favoritos. Caio falava a minha língua. A língua de uma geração. Tenho comigo até hoje guardada uma foto dele que roubei de um painel do Clube de Cultura no começo dos anos oitenta. Eu já era fã do Caio e adorava frequentar o bar do Clube de Cultura, na Ramiro Barcelos, em Porto Alegre. Acho que na ocasião estava em cartaz no teatro do Clube a peça Reunião de Família, adaptação que Caio fizera para o romance de Lya Luft, e a produção do espetáculo montou um painel com fotos e matérias de jornal para divulgá-la. Discretamente, parei em frente ao painel e peguei a foto do Caio sem que ninguém visse. Ela ficou anos colada na parede do meu quarto em Porto...Quando, em 1990, estava morando em Paris, hospedei em meu apartamento nosso amigo em comum Luiz Arthur Nunes, que havia ganho um prêmio Molière pela peça que escrevera em parceria com Caio, A Maldição do Vale Negro, e aproveitou a passagem da Air France com que o prêmio contemplava os vencedores para dar um giro pela Europa. Depois de ficar uns dias comigo, Luiz foi a Londres, onde encontrou com Caio, e, na volta a Paris, ele me disse: Dei teu telefone pro Caio. Ele está vindo para Paris e vai te ligar. Passa um tempo, Luiz volta para o Brasil, e eu esqueço completamente do que ele me falara. Um belo dia, estou em casa, toca o telefone, eu atendo e escuto: Alô, Roberto? É o Caio. Quase desmaiei...Marcamos de nos encontrar para nos conhecermos. Fui pegá-lo na casa do amigo que o hospedava e passamos uma agradável tarde juntos, passeando, sentando em um café e conversando muito. Eu citava trechos de livros seus que sabia de cor. Contei o quanto seu livro Triângulo das Águas mexeu comigo, e que um dos contos começava assim: Acabei de me masturbar. E ele: Eu escrevi isso? Uma noite ele foi jantar em minha casa e depois saímos para beber no Duplex, que na época já era o meu bar favorito em Paris. Lá pelas tantas ele me pergunta: Robertinho, posso mesmo dormir na tua casa? Claro, Caio, respondi. E ele: Então vamos encher o cú de Brahma! Adorável...Quando voltei ao Brasil nos encontramos diversas vezes no Rio e em São Paulo. Tive o prazer de conhecer seu apartamento da rua Hadock Lobo, onde agora seríamos vizinhos, pois moro na Franca com a Hadock. No meu aniversário de trinta anos, que comemorei em Porto Alegre, ele estava presente. Já debilitado pela doença, Caio tinha voltado a morar lá. A última vez que o vi foi em um show de Fito Paez, na Reitoria da UFRGS. Ele estava com a Mary Mezzari, sentados na fila em frente à minha. Quando Fito começou a cantar a segunda música ele me perguntou: E aí, já dá pra dizer se ele é Jacira? Querido... Quando ele morreu, não tive coragem de ir ao enterro. Sinto muito não tê-lo conhecido antes, convivido mais. Todo mundo dizia que Caio tinha um pé na fossa. E era isso que eu adorava, pois também tinha. Sem falar no seu humor, deliciosamente ácido. Amanhã, dia 26, vou homenageá-lo na Mini Mostra Caio, que o Mini Teatro, da Praça Roosevelt, está organizando. Apresentarei seu texo A Lenda das Jaciras, pelo qual tenho verdadeira paixão. Quem estiver em São Paulo, não perca. À meia noite. E pra encerrar, um trecho da Lenda: “Jacira que é Jacira nasce Jacira, vive Jacira e morre Jacira. No fundo, achando que Telmas, Irmas e Irenes são tão Jaciras quanto elas. E talvez tenham razão!”
Na imagem que ilustra o post, a foto que roubei do Clube de Cultura.
Caio marcou uma geração inteira. A mim tão imensamente que reli muitas vezes os seus livros. Caio para mim é o Cazuza dos livros.
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