quinta-feira, 22 de julho de 2010





ROSA DE SAL

Você já se sentou para beber sozinho em um balcão de bar? Tendo por companhia somente o atarefado barman que, entre um coquetel e outro, troca algumas palavras de compaixão com você que, afinal de contas, se está bebendo sozinho ali, é porque não tem ninguém com quem falar? Eu já. Muitas vezes. Ainda bem que os bartenders do Ritz, onde costumo beber no balcão, são meus amigos e super queridos. Assim fica mais fácil encarar a solidão do bar. Mas, por mais queridos e atenciosos que sejam, estão trabalhando. Ocupados demais pra lhe dar a devida atenção. Então, entre um papinho e outro, você se põe a observar o entorno. O bar. As bebidas. Os utensílios. E, claro, as pessoas. Foi assim que descobri a Rosa de Sal. Não me refiro ao poema de Neruda. Se você quiser saber de que diabos estou falando, peça para algum barman lhe mostrar o pratinho com sal onde ele faz a crosta das Margaritas, ou de qualquer outro drinque que leve crosta de sal. Com o tempo, após várias crostas feitas, o pratinho fica parecendo uma rosa. De sal. Parece papo de bebum. E é. Não que eu esteja escrevendo alcoolizado, não é isso. Mas, quando fiz a observação, eu certamente estava. Tanto que anotei em um pedaço de papel que pedi à gerente, pra não esquecer, caso fosse acometido de amnésia alcoólica. Como de fato fui. Bendito papel rabiscado encontrado no meu bolso pela faxineira...Como eu dizia, parece papo de bebum, mas é mera observação de quem tem o hábito de frequentar balcões de bar. No Ritz, por exemplo, a rosa fica ao lado da máquina de Frozen Margarita, à direita de quem entra, perto da porta giratória. Ok, Rosa de Sal descoberta e registrada, sigo bebendo e observando. À medida que o teor alcoólico sobe, minha observação vai deixando de ser tão, digamos, poética, e vai se tornando mais crítica. Começo a observar melhor as garrafas de bebidas e me deparo com um Campari cujo rótulo é ilustrado por Romero Brito. Tá, eu até gosto de Romero Brito, acho colorido, divertido, tem algo do grafitti, da ilustração, mas ele precisa ilustrar todas as embalagens de todos os produtos? Outro dia fui pegar água de coco no mercado e a caixinha da água de coco era do Romero Brito. Ele também já havia feito a vodka Absolut, o panetone Bauduco, e um sem número de produtos e embalagens. Pra que? Ele está tão necessitado de dinheiro assim? Sua arte já não é comercial o suficiente? Só falta o absorvente íntimo do Romero Brito. Modess Romero Brito! Parece papo de bebum, não? E é. Resolvo, então, observar as pessoas. Entra um rapaz de calça Diesel, camiseta Abercrombie e tênis Diesel também. Sei disso porque estava visivelmente escrito DIESEL nos tênis. E olha que a luz não era muito clara e eu já havia bebido bastante. O corpo também era grifado. Pela academia, pelo personal trainer e pelo hormônio do momento. Provavelmente GH. Igual a quase todos os outros freqüentadores. De quase todos os outros lugares da moda. Lembrei, então, apesar do teor alcoólico que subia vertiginosamente, de um e-mail que recebi de uma casa noturna daqui de São Paulo, dizendo que queriam me enviar o seu cartão especial, VIP, mas que para isso eu teria que preencher o cadastro deles. Eu, que quase nunca vou a casas noturnas, só saio para jantar ou, nesse caso, para beber meu vinho e depois ir pra casa dormir, resolvi preencher o tal cadastro por pura curiosidade. E o cadastro perguntava, de Armani a Zara, quais das seguintes grifes eu tinha o costume de comprar ou que já comprara pelo menos uma vez. Passando, claro, por Dior, Dolce & Gabana, Gucci, Prada e tudo mais. E ia além: Tem carro? De que marca? E novamente o alfabeto inteiro: De Audi a, sei lá, Volkswagen. E mais: quanto você ganha? Deseja receber e-mails dos nossos parceiros? NÃO!!! E antes que o cadastro ficasse completo cancelei o preenchimento. Por que estou falando isso? Parece papo de bebum...E é. (Soluço).
Resolvi pedir a conta e ir pra casa antes que surgissem, porta giratória a dentro, as três filhas da Baby: Sarah Sheeva, Nanashara e Zabelê...
Asereh hê!
Termino com trecho do já citado Neruda:
“No te amo como si fueras rosa de sal, topacio
o flecha de claveles que propagan el fuego:
te amo como se aman ciertas cosas oscuras
secretamente, entre la sombra y el alma”.

4 comentários:

  1. Oi,
    Observar, nos traz imagens muitas vezes únicas, certo? E os pensamentos vão longe.....
    bjo

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  2. Eu ate tento sentar sozinha num bar mas nao consigo porque sempre alguem interessante paga um vinho pra mim.....dai se vai a observacao e o pensamento viaja na minha propria maionese... papo de bebum, nao? Claro que sim!Bj.

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  3. A Rosa e o meu projeto de Vida... Arrasa o meu projeto de vida.
    Ou
    Pra dormir com Lia que via que eu ia sonhar dentro do barco de Rosa. Rosa que se ria e dizia nem coisa com coisa.
    Ou
    Rosas, rosas, rosas a me confundir com as rosas as rosas, as rosas de abril.

    Ro, só os grandes pensam nas rosas... ou melhor, os grandes de coração, não de altura!

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