sábado, 1 de maio de 2021
ÉTOILES
Meu primeiro dia de maio não podia estar mais lindo, apesar de. Um sábado ensolarado, friozinho, logo cedo pela manhã fui dar uma volta na Liberdade – antes que a foule sem noção se aglomerasse nas lojas reabertas – respirei tranquilo (ainda que de máscara), comprei bolinhos de polvo para comer em casa e me recolhi às minhas atividades cotidianas. Tudo seguia tranquilo, Nana Caymmi no iPad, vinho na taça, eu no fogão. Até que chega a triste notícia: Rolando Faria partiu. Tudo mudou de repente. O colorido ficou preto e branco, o dia nublou, Nana se calou. E a pergunta de sempre voltou à minha cabeça: Porque as pessoas boas, legais, talentosas, importantes, bacanas, amigas, se vão e as tralhas que não servem para nada ficam? Mas isso não cabe a mim responder. Só Deus é quem sabe do amor, eu não sei nada. Só sei que a vida nos prepara cada cilada, como cantava Elis nos versos de Guilherme Arantes. Rolando abalou Paris nos anos setenta e oitenta junto com Luiz Antônio. Os dois formavam a dupla musical Les Étoiles, que fez muito sucesso e gravou vários álbuns na capital francesa. Conheci Rolando em Paris, no início dos noventa, quando morei lá. Nosso amigo em comum Mareu Nitschke nos apresentou em animada noitada no Iguana Café, na Bastilha, na qual também estava presente Luís Artur Nunes, de passagem pela Cidade Luz hospedado chez moi. Logo de cara nos tornamos amigos inseparáveis. Cheguei a assistir a um show da dupla, um dos últimos que fizeram, pois o Luiz morreria logo em seguida. Rolandô, como o chamavam os franceses, seguiu próspera carreira solo não apenas na França, mas na Espanha também. Eu morava no Marais e sempre que ele ia fazer suas aulas de dança num estúdio próximo à minha casa, passava em frente ao prédio da Rue des Écouffes e gritava para a minha janela do primeiro andar: Robertinhoooo! Eu descia na hora e íamos tomar uns verres no Petit Fer à Cheval onde ele, conhecidíssimo, era saudado pelos garçons: Les étoiles du Brésil... Na última vez que esteve aqui em São Paulo, ele foi me assistir na Terça Insana, que à época estava em cartaz no Avenida Clube. Nas últimas vezes que estive em Paris, 2013 e 2015, nos reencontramos. Ele morava na Bastilha e gostava de marcar nosso encontro nas escadarias da Opéra de La Bastille de onde seguíamos até o l’Industrie, um restaurante que ele adorava e do qual era frequentador habitué. Almoçávamos e depois esticávamos a tarde tomando vários verres até o sol se por... Quantas histórias! Não daria para contar aqui. Muitas, muitas e todas elas interessantíssimas. Claro, além de muito vivido, experiente, talentoso e dono de vasta carreira artística, ele era inteligente, bem-humorado e engraçadíssimo. O tipo do amigo que a gente ama ter... Quando a última estrela do quilate de Rolando se for, o que restará por aqui? Isso também não cabe a mim responder. Só Deus é quem sabe... Vai em paz, querido amigo. Vou lembrar de você para sempre.
Nas fotos, o último registro que fiz dele em 2015 no l'Industrie e com Luiz Antônio caracterizados como Les Étoiles.
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Revivendo aqui contigo, andando nessas escadarias e pelos quais com vocês. Aperô, apeou, desceu e subiu.
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