sexta-feira, 9 de junho de 2017

PALAVRAS ERRANTES

Palavras são como pássaros, às vezes pousam na página em branco enchendo-a de beleza e poesia. Outras vezes voam em bando, migratórias, para terras longínquas, deixando sem assunto e nem ao menos título a pobre lauda vazia... Vez por outra se permitem pousar sobre um ou outro assunto, o novo espetáculo de um grande ator de teatro, a estreia de um amigo, um livro que li, um restaurante que conheci, bem en passant, não chegando a preencher sequer um parágrafo... E os assuntos, assim como as palavras, voam em bando para outro hemisfério. Les mots me échappent, como se diz en français... A vida, esse fenômeno por si só já tão interessante, às vezes nos faz pensar que está passando em vão. São Paulo, essa cidade efervescente que amo tanto, às vezes me faz ter a sensação de que não me corresponde, pois me permite, morto de tédio, achar que não há mais o que fazer... E se vai com as palavras o meu assunto. Ouvindo antigos discos de Caetano Veloso me encontro e me reencontro em diversas faixas, refrões, versos. Por mais distante, o errante navegante, canta ele em Terra. Me dou conta de que sigo errando por esse planeta que, às vezes penso, não é o meu. Sim, porque no planeta que imagino meu, metade das coisas que aqui acontecem não aconteceriam... Eu não sou daqui, eu não tenho amor. Marinheiro só errando de cais em cais... Ela me conta que era atriz e trabalhou no Hair. Eu também era ator, costumava brilhar sobre a cena. Alguém disse outro dia na TV: A gente nunca sabe quando vai estar no palco outra vez. Nunca sabe. Acho que foi Crioulo... Eu sempre quis muito. Mesmo que parecesse ser modesto. Agora nem sei se o que quero é muito ou pouco. Tampouco se quero. Ou o quê... Que me voltem as palavras! Isso eu sei que quero. Pelo menos...
Na foto, grafitti na antológica Rua Augusta, inesgotável fonte de assuntos.

2 comentários:

  1. Caríssimo, mesmo quando lhe fogem as palavras você consegue produzir um bom texto, e, acho, é assim que deve ser. Quando há a diversidade é que nos esforçamos mais. Só não concordo quando diz que "era ator", na minha modestíssima opinião continuarás a ser ator até o fim dos dias, mesmo que não estejas em cena. É a tua verve, é o teu ofício, e aí não importa saber quando estarás no palco outra vez porque quando estiver será sempre por inteiro.

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  2. Odilon, querido! Obrigado pelas suas lindas palavras.

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