terça-feira, 27 de abril de 2010


VINTE ANOS
Aos vinte anos de idade eu ainda era um adolescente bastante introspectivo. E com um pé na fossa. Gostava de ler Baudelaire, Álvares de Azevedo, Clarice, Rimbaud. Vivia escrevendo, ouvindo música, lendo ou tocando flauta sentado na janela do apartamento. NA janela, mesmo. E não à janela. Sentava na beira da janela do terceiro andar e devia torturar os vizinhos com minha flauta e minhas músicas, escutadas sempre no volume máximo. Atividades solitárias. Ainda não havia começado a fazer teatro. O conto abaixo eu escrevi nessa época, quando tinha a mesma idade da foto acima.

CONTO

Ficar, agora, como vinha fazendo desde que lhe conhecera, parado ao canto do quarto com um livro na mão, tentando escrever em folhas soltas, com canetas hidrocor, os pensamentos que, por forças externas, permaneciam internos, clarear as coisas, assim uma limpeza geral feita de dentro pra fora, colocando em dia e trazendo à tona todas as ânsias que sufocara por não estar, ou não se julgar, suficientemente pronto para a vida, um péssimo jogador, como ele mesmo colocara.
A cada hora da tarde e, mais tarde, a cada hora da noite, uma olhada pro relógio revelava sessenta pulsações de vida, sessenta chances de ser feliz passadas em branco.
Desde que constatara que não dava pra essas coisas, resolveu isolar-se nos fins de tarde junto a um jacarandá em flor pois, em plena primavera, seus desejos brotavam e não havia jeito. Devia, ou deveria, seguir tomando suas enganadoras doses de gim seco, e projetar seus sonhos numa parede do apartamento, já que rachaduras não faltavam e os cupins devoravam a janela paulatinamente.
A vida não era bem assim, como as pessoas pensavam e seguiam vivendo. Ele preferia ter encontros esporádicos consigo mesmo, mas cheios, esses encontros, de uma verdade crua, esmagadora e sem máscaras.
As mãos que viriam tocá-lo, descobrir seu corpo ao clarear do dia, certamente seriam as mãos do seu graaade amor, pois, quando as andorinhas passaram em bando sobre os jacarandás pousando aos poucos nas margens do lago da Redenção, ele sentiu ( e quis até escrever o que sentia), ele sentiu que assim não queria mais, não valia mais a pena e resolveu se dar um prazo, um prazo até que razoável, mais um ano de batalha, de sofrimentos e solidão.
Trezentas e sessenta e cinco vezes o dia clareou, o sol bateu no seu corpo jovem de rapaz de vinte anos e nunca o encontrou ao lado do seu graaande amor.
Então, no último amanhecer do ano, ele se retirou do mundo com a calma dos que sabem que tentaram. Mas não lhe foi dado vencer.

Acho que faz jus às referências citadas...

4 comentários:

  1. Clarice na veia! Mais do que Baudelaire, Rimbaud e Azevedo.
    Parabéns, Roberto, passarei a "te ler" sempre!
    Abraços, Janaina

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  2. Oi Roberto
    Adoramos o teu blog e estamos seguindo ^^
    achamos digno hahaha
    beijos

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  3. Oieee
    td bem??
    Betinho preciso do seu email pra te add no Orkut.
    Tentei mas é necessario o seu email para tal fim.
    melhor me add lá mibibi1_2@hotmail.com.
    Gabi
    sua Fã number one...rsrs
    Beijo me liga...

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  4. Bob, simplesmente me emocionei!
    Grande, simples, solitário... lindo...!!!
    bjs

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