sexta-feira, 8 de novembro de 2024
AINDA ESTOU AQUI
O filme de Walter Sales é lindo. Potente. Intenso. Relevante. Necessário. Não tem como assistir a essa obra e ficar ileso. Não tem como não se envolver. Pelo menos quem ainda tem um mínimo de memória do que foi o período histórico que o filme aborda. Digo que ele é, entre outras coisas, necessário, porque vem num momento em que o mundo, totalmente dividido, polarizado, flerta com extremismos e apoia ditaduras, tanto de direita quanto de esquerda. Adoro os filmes de Walter Sales, eles são invariavelmente plenos de sensibilidade. O cineasta tem a fineza de não ser panfletário na sua belíssima obra. Ainda Estou Aqui transborda afeto. É impossível não se ver espelhado naquela família, naquelas relações, naqueles almoços e jantares, nos pequenos prazeres do dia a dia. (Fala-se tanto em defender a família, como se alguém fosse contra). Pois essa linda família apresentada no filme foi cruelmente ferida, mutilada pelo afastamento do pai. Quando isso acontece, me transportei imediatamente para a minha infância. Eu tinha sete anos de idade e cursava a primeira série do primário. Não tinha a menor noção do que estava acontecendo no país. Era uma criança feliz, feliz a cantar, alegre a embalar seu sonho infantil. E brincava dizendo que o nome do presidente do Brasil era “Garrafa Azul Médici”… Fiquei, além de muito tocado e triste, feliz com esse filme. Num país notadamente sem memória como o nosso, sempre é bom dar uma refrescada. E, quem sabe, provocar revisões e ressignificar conceitos e ideologias. Isso tudo sem falar nas interpretações irretocáveis de Fernanda Torres, Selton Mello e todo o maravilhoso elenco. E, claro, Fernanda Montenegro que, em participação especial, entra muda, sai calada e arrasa como a personagem de Fernanda Torres na velhice com Alzheimer. Os figurinos de Claudia Kopke e toda a direção de arte são precisos na reconstituição da época. E ricos em detalhes como a poncheira de cristal sobre a mesa de festa. Fora a trilha sonora, que a gente sai do cinema com ela na cabeça. Parece que estamos folheando antigos álbuns de retratos. Que guardam, graças a Deus, nossas memórias... Não deixem de assistir!
Na foto, o cartaz do filme e a belíssima arquitetura do Conjunto Nacional.
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Amigo querido, seu post me tocou, me emocionou, assim como o filme também me tocou em pontos que eu julgava adormecidos. A cena do dente resgatado na areia e os almoços barulhentos, cheios de conversas e provocações dão uma métrica da convivência, a chegada dos sequestradores e o fechamento das cortinas da casa estabeleceram em mim uma virada, ao ver fechar aquelas cortinas tive a certeza de que nada mais seria como antes, mesmo com todo o esforço de D. Eunice para manter a rotina, houve um bloqueio, um buraco que não seria preenchido nunca mais.
ResponderExcluirMuito bom seu comentário sobre o figurino da Claudia Kopke sem qualquer afetação e a primorosa direção de arte, reconstruir aquele escritório - biblioteca não deve ter sido tarefa fácil. Estou louco para rever, tenho certeza que vou descobrir novas nuances igual a quando revejo Central do Brasil.
Odilon, querido! Adorei seu emocionado relato. O filme já nasce cult e tem cenas antológicas, como as citadas por você e - para mim a mais forte - a do chuveiro quando Eunice volta da cadeia. Para ser revisto!
ExcluirSim, muito bem lembrado. Essa cena do chuveiro é de chorar junto com ela. Estou esperando acalmar um pouco a sanha para ir rever, de preferência num dia de semana, no primeiro horário, para ter a sensação da tela inteira só pra mim. Coisa de velho rsrs
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