sexta-feira, 29 de março de 2019

SUNSET BOULEVARD

Fui assistir à estreia VIP de Sunset Boulevard, musical de Andrew Lloyd Webber inspirado no filme homônimo de Billy Wilder, que aqui no Brasil ficou conhecido como Crepúsculo dos Deuses. Eu já ando um pouco saturado de musicais, mas não pude resistir à oportunidade de ver Marsia Orth interpretar o icônico personagem vivido por Gloria Swanson no cinema: Norma Desmond. Ainda bem que não resisti. Marisa está perfeita no papel. Além da grande atriz que desde cedo mostrou ser, ela está cantando como nunca. É uma outra voz, um outro registro que pertencem de fato a uma outra pessoa: A sensacional Norma Desmond, que parece ter sido feita sob medida para o talento dessa atriz. Marisa sempre soube ser hilariante sur la scène, desde os tempos do Luni, grupo musical em que esbanjava talento performático. Depois vieram as não menos cômicas Maralu Menezes, da Banda Vexame, Nicinha, da novela Rainha da Sucata e Magda, do humorístico televisivo Sai de Baixo. É sempre um prazer vê-la atuar, seja qual for o mote da empreitada. Da comédia ao drama, sem o menor esforço.Tive a honra de dividir o palco com ela no antológico Show do Gongo, do Festival Mix Brasil, em que minha personagem Betina Botox participou como jurada. Mas é quando uma grande atriz encontra um grande personagem que dá-se o milagre. Marisa Orth e Norma Desmond foram feitas uma para a outra. E o gigantesco palco do Teatro Santander fica totalmente preenchido pelo seu enorme talento. Corram para assistir: Marisa Orth está pronta para o close...
Na foto, Marisa mostrando pra galera o que é dar close de verdade.

sexta-feira, 22 de março de 2019

RETIRANTE ABDUZIDO

Hoje faz vinte e três anos que estou morando em São Paulo. Tenho com essa cidade uma relação ímpar. Adotei-a como minha e me sinto adotado por ela. Uma cidade múltipla, pulsante, surpreendente. Oferece de tudo vinte e quatro horas por dia de segunda a domingo. Não para. Não pode parar nunca. Aqui me sinto no mundo e não fora dele como me sentia antes. Ela me dá tudo o que espero de uma grande cidade. Uma metrópole. Sampa é cosmopolita. É claro que não se compara a Paris, Londres ou Nova Iorque. Mas em termos de Brasil nada se compara a ela... Como toda boa madrasta, também sabe ser cruel e indiferente. Ela dá, mas exige bastante em troca. Se você não estiver dando nada para ela prepare-se para amargar dias de abandono. Agora me pergunto: Que relação não tem lá suas crises, seus altos e baixos? Felizes para sempre é uma ilusão. Não passa de conto de fada... Amo reclamar de São Paulo. Me sinto no direito, afinal, sou da família. Só não venha falar mal dela pra mim, combinado? Defendo com unhas e dentes.... Parece mentira que já se passou tanto tempo desde que cheguei aqui. À beira de completar trinta e três anos, a idade de Cristo, e cheio de sonhos a realizar. Um deles realizou-se logo na chegada: Era exatamente morar aqui. Ao longo desses anos todos tenho aprendido muito com São Paulo. Um aprendizado vasto e contínuo. Suas facilidades e perrengues, praticidades e estorvos, belezas e feiúras, enfim, suas idiossincrasias. Mas, acima de tudo, aprendi a respeitar essa cidade. E amá-la sempre. Cada vez mais. Cheguei aqui como apenas mais um retirante. Hoje já me sinto abduzido pela Pauliceia. Quase um paulistano...
Na foto, jardim japonês do Largo da Pólvora, no bairro da Liberdade, um dos meus refúgios preferidos em meio à caótica metrópole.

segunda-feira, 18 de março de 2019

ELIS 7.4

Se ainda estivesse viva, ontem a cantora Elis Regina teria completado setenta e quatro anos de vida. Passei o domingo tomando vinho e ouvindo suas canções. Até aí, nada de mais. Afinal de contas, beber vinho e escutar Elis são duas das coisas que mais faço na vida. Mas o aniversário me fez ficar pensando em como ela estaria hoje... Logo que Elis morreu eu ficava imaginando músicas que ela cantaria e como seria a sua interpretação. Durante muito tempo eu a imaginei cantando Exagerado, de Cazuza, aos berros, bem jogada aos seus pés mesmo, como diz a letra da canção... Como sempre foi muito lúcida, engajada, consciente e antenada nas novidades, acho que teria se tornado uma espécie de Dama Indigna da nossa canção. Acredito que não perderia a mão, não sairia do tom, não cederia a modismos, enfim, não me decepcionaria, como alguns e algumas tem me decepcionado... Entre as anotações da agenda de Elis estavam algumas canções que ela pretendia gravar no próximo álbum em que já estava trabalhando quando morreu. Uma delas era O Amor, música de Caetano sobre um poema de Maiakovski, gravada por Gal no LP Fantasia. Nada me tira da cabeça que a versão de Elis teria se tornado a definitiva... Eu sou daqueles que ainda espera por uma nova cantora do quilate de Elis Regina. Mas acho que morrerei sem ver isso. Nada do que temos hoje por aqui sequer se aproxima da maior cantora do Brasil. Nem mesmo sua filha Maria Rita, uma pálida sombra do que fora a mãe... Adoro as versões para o francês de Samba da Benção, de Vinícius, Noite dos Mascarados, de Chico, e A Noite do Meu Bem, de Dolores Duran, que ela gravou ao vivo em Paris. Aliás, adoro saber que a Pimentinha a-ba-lou Paris. Uma pena eu não tê-la visto cantar por lá. Por aqui eu tive esse privilégio três vezes: No Canecão do Rio, com o show Saudade do Brasil, no Teatro Leopoldina de Porto Alegre, com Essa Mulher, e no Ginásio do Gigantinho, também na terra natal de Elis, com seu último show Trem Azul... Feliz aniversário, Elis!

sexta-feira, 15 de março de 2019

DANCING DAYS

O musical carioca O Frenético Dancin'Days estreou na Pauliceia neste fim de semana. A montagem tem texto de Nelson Motta e Patrícia Andrade e direção geral de Deborah Colker. Fui muito mais movido pela empatia e pelo saudosismo do que pelo espírito crítico. E fiquei muito feliz com o que assisti. Deborah construiu um espetáculo vibrante, dinâmico, alegre e cativante. As músicas contribuem em grande escala para isso. São aqueles hits do tipo "quando toca ninguém fica parado". E é sempre bom lembrar que é possível a gente ser livre e feliz, mesmo em meio a adversidades... O espetáculo mostra a discoteca Frenetic Dancing Days como uma espécie de Shangri-lá, uma ilha da fantasia, um lugar mágico onde tudo era permitido em plena ditadura militar. E traz, claro, as tais Frenéticas. Foi lá que o grupo despontou para o sucesso. Chorei de emoção e saudade da minha amiga/irmã astral Lidoka na cena em que cada uma das Fre se apresenta para a entrevista de emprego na discoteca. Contratadas para serem garçonetes, elas acabam sendo o show oficial da casa. E dali para o sucesso nacional foi um passo. É quase inacreditável que esse sonho tenha durado apenas quatro meses. E que tanto tenha sido visto e vivido em tão pouco tempo... A cenografia despojada e dinâmica de Gringo Cardia dá o tom e a cor desse ambiente encantado. O ator Bruno Fraga, que interpreta Nelson Motta, conduz a narrativa como um mestre de cerimônias e, de lambuja, canta lindamente. Aliás, todos cantam e dançam muito. É só abrir as asas, soltar as feras e levar com você o seu sonho mais louco. Com essa trupe a festa nunca vai acabar...
Nas fotos, o elenco agradece os fervidos aplausos e minha amiga Lidoka se acaba na festa de despedida do Dancing que, dizem, ninguém lembra muito de nada do que aconteceu rsrsrs.

quarta-feira, 13 de março de 2019

TERNO AZUL

Dia desses, assistindo ao jornal na televisão, em uma matéria sobre a votação da presidência do senado, me dei conta de que todos os participantes estavam vestindo ternos azuis. Até bem pouco tempo atrás, terno azul era algo bastante particular, de bom gosto, usado por poucos homens ousados e antenados nas tendências da moda. Agora virou bunda, sabe? Chegou no camelô, como gosto de dizer quando algo se populariza demais. Por mais que eu reflita e questione, não consigo entender essa necessidade que as pessoas tem de serem todas iguais umas às outras. Se algum jogador de futebol famoso resolve descolorir uma parte dos cabelos, milhares de homens fazem o mesmo com os seus. Se uma atriz de Hollywood corta a franja bem curta, todas as mulheres copiam. É assim em todos os setores da sociedade. Em todas as camadas sociais. Em todas as tribos. Frases tatuadas no corpo? Todos com frases tatuadas no corpo. Piercing no nariz? Todos com piercing no nariz. Barba? Todos os homens - gays ou hétero - todos com barba. Camisa estampada com flores e folhagens? Todos etc... Até mesmo no carnaval, que era justamente quando todos poderiam ser diferentes, se fantasiando do que bem entendessem, está todo mundo igual. A indefectível sainha de tule dominou geral nas ruas de São Paulo, parecendo uma espécie de abadá sem o qual era proibido pular... Não quero fazer o que todo mundo faz. Prefiro ser eu mesmo. Ainda que isso, por vezes, me traga consequências inesperadas... Não sigo líderes espirituais ou políticos. Não tenho partido. Muito menos gurus. Acho que não pertenço a esse planeta e muito menos a esse país. Não tenho rack, penduro minha TV na parede mesmo. Passei já mais de cinquenta anos me procurando e ainda não me encontrei... Mas, de qualquer forma, ainda bem que não mandei fazer meu terno azul! Rsrsrs.... Isso me fez lembrar daquele terno azul bem mais claro, quase bebê, de cetim, que David Bowie usava cantando Life on Mars. Aí sim, né? Mas Bowie era Bowie. Outra estirpe, outros tempos, outra civilização...
Nas fotos, Bowie e Bekham, dois Davids ingleses copiados all around the world.

sexta-feira, 1 de março de 2019

LISÍSTRATA

Apesar de ter sido minha segunda direção, considero Lisístrata a minha estreia como diretor. Foi com esse espetáculo que os críticos e o grande público me descobriram como profissional. Foi também com Lisístrata que ganhei todos os prêmios do ano: Prêmio Açorianos de Melhor Direção, Prêmio Quero-quero (Sated) de Melhor Direção (que dividi com Luís Arthur Nunes, por A Fonte, no qual eu também atuava) e Prêmio Scalp de Teatro. Esse último, apesar de "menos importante", é o que mais considero, justamente por ser underground. Sem falar que o troféu é uma bela escultura em arame de Fiapo Barth que até hoje enfeita a minha sala... Voltando ao espetáculo: Apesar de ser um texto clássico, uma comédia grega de Aristófanes, minha montagem era bastante autoral, com uma concepção bem definida e que já revelava claramente um estilo, uma postura de diretor, uma assinatura. A peça tinha dez atores, um elenco considerado grande para os padrões da época em Porto Alegre. Encabeçado pela estrela (então local) Ilana Kaplan no papel título, o grupo trazia ainda Nora Prado, Ciça Reckziegel, Adriane Mottola, Miriam Tessler, Gisela Habeyche, Paulo Vicente, Angel Palomero, Mario Ruy e o saudoso Fernando Severino. Minha adaptação partiu da tradução de Millor Fernandes. Para agilizar a trama, suprimi todas as passagens do coro. No lugar delas, coloquei cenas mudas, que comentavam a história e avançavam a narrativa. Essas cenas foram criadas a partir de improvisações com os atores, que eram estimulados por mim com um tema relacionado à trama. Depois eu as redesenhava, com base em ícones da pintura e estatuária clássicos. A trilha sonora, que embalava essas cenas mudas, era basicamente composta de músicas clássicas que foram pesquisadas e selecionadas por mim, com o auxílio de Ciça Reckziegel. Não sou nada modesto em relação a esse que considero um dos meus melhores trabalhos em teatro até hoje. Uma montagem simples no que se refere a pirotecnias cênicas, Lisístrata começava e terminava com o palco totalmente vazio. Calcada principalmente nas interpretações, no conjunto, nos tableaus e frisas. Poucos elementos cênicos manipulados pelos próprios atores compunham a cenografia. E a luz precisa de Marga Ferreira definia a ambientação e atmosferas. Esse requinte estético em nada afastava minha Lisístrata do público. Pelo contrário, a peça tinha grande apelo e aceitação populares, o que atestavam as grandes plateias que a prestigiaram. Fizemos várias temporadas em Porto Alegre e algumas viagens ao interior, totalizando um ano em cartaz. Em Palmeira das Missões fomos convidados para inaugurar a Casa de Cultura local. Tenho especial carinho por essa montagem que começou como um trabalho de direção meu na escola de teatro e, devido ao grande sucesso, ganhou os palcos profissionais. Dediquei-o ao professor Ivo Bender, como prova de meu carinho e reconhecimento. E lá se vão já trinta anos...
Nas fotos, de Fernando Brentano, Ilana Lisístrata Kaplan impede suas companheiras de cederem à tentação, As Três Graças Miriam Tessler, Gisela Habeyche e Ciça Reckziegel e Nora Prado personifica A Paz no cortejo que antecedia o banquete final.