quinta-feira, 27 de agosto de 2020

FLÂNEUR

Com a morte recente do dramaturgo Antonio Bivar, de quem sou fã declarado, a imagem do flâneur voltou com força às minhas memórias e reflexões. Para quem não sabe, flâneur é o indivíduo que percorre as ruas e as cidades do mundo como se estivesse na sua casa. Livre por excelência, ele esquadrinha detalhes e reentrâncias, comportamentos padrão e outros nem tanto, obviedades e singularidades. Com um olhar um tanto mais afiado e perspicaz que o da maioria, e um desprendimento moral que lhe permite quase tudo, o flâneur é o cronista do mundo para os reles mortais que não o percebem com tanta riqueza e abrangência de detalhes... Bivar era assim, esse era o seu melhor personagem. Tanto que fazia da própria vida ficção ao narrá-la em vários volumes de uma biografia. Que eu sempre acompanhei com grande interesse... Me ocorre agora o livro, para mim cult, de João do Rio, A Alma Encantadora das Ruas. Nele o nosso dândi tropical percorre desde os salões mais elegantes da aristocracia até os mais infectuosos bas-fonds. E descreve as ruas como libertárias e democráticas por natureza. Nelas desfilam todos os tipos e profissões, todos as manifestações populares e festas, todo o horror que permeia os buracos e vielas junto aos cais de todos os portos. Sempre me identifiquei muito com esse tipo, eu que flano pelas cidades sempre em busca do novo, do insólito, do insuspeito. E mesmo na minha própria cidade, atento que sou, procuro encontrar o que ainda não vira, sentira, vivenciara. (Adoro o mais que perfeito. Rsrsrs). Com a pandemia e o consequente isolamento social, tenho me sentido muito limitado nessa que era a minha atividade preferida. Mas não há quarentena capaz de confinar a alma de um flâneur. Ou, para citar a Carmen de Bizet, nul ne peut apprivoiser. Mesmo entre quatro paredes, meu espírito segue errante, andarilho por natureza. Busco na música e na literatura a expansão de universos que os limites geográficos me impedem de percorrer. E, no final do dia, sentado à varanda contemplando o sol se pôr, sorvo uma taça de vinho enquanto deixo o pensamento - esse sim livre que só - voar longe em busca de outras paragens... Que a Terra nos seja leve! Na foto, João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, o João do Rio, nosso dândi tropical e flâneur por excelência.

domingo, 23 de agosto de 2020

MURAKAMI ET MOI

Hoje terminei a leitura de mais uma obra de Murakami: O Assassinato do Comendador, volume 2. Fiquei grande parte do domingo ensolarado e frio pensando porque ainda leio essas histórias. Já perdi as contas de quantos livros deste autor eu já li. As tramas se confundem na minha memória, na verdade são parecidas entre si, mas não consigo deixar de acompanhar com interesse cada nova empreitada literária deste que é um fenômeno da literatura mundial. Começo como quem não quer nada, tá, ok, mais um Murakami. Quando vejo estou envolvido até a medula e tenho uma necessidade urgente de desvendar o mistério por trás de cada reviravolta na trama. Nem dá para dizer que haja reviravoltas, mas as histórias tem a força de me levarem junto com elas. Há sempre um buraco, um portal, uma passagem que desvenda uma realidade paralela. Ou talvez perpendicular. Taí, gostei, realidade perpendicular. Acabo de cunhar a expressão, se é que ainda não existe. Preguiça de conferir no google... Murakami tem o poder de me levar junto nas aventuras. E elas invariavelmente se encaixam no que estou vivendo. Parece que foram escritas para me fazer crescer, me esclarecer e me dizer coisas. Como no teatro mágico de O Lobo da Estepe, de Hermann Hesse. Preciso entrar, preciso conferir e desvendar. Ando ausente, eu sei. Distante, isolado numa casa no alto da montanha, como o personagem sem nome de O Assassinato do Comendador. Talvez seja isso que eu precise aprender. Me isolar como no alto de uma montanha. Criar um personagem sem nome. Ou, talvez, ser um personagem sem nome. Entrar no universo paralelo ou perpendicular de onde sairei mais resistente, fortalecido e, quiçá, mais sábio. Os dias se extendem lentos, vazios e repetitivos. O futuro nunca foi tão incerto, mesmo o futuro próximo. Parece que vivo uma espécie de futuro do pretérito. Que poderia ou não se realizar... Desculpem se soo enigmático, hermético talvez. Perco um pouco a capacidade de me relacionar. Mas isso faz parte uma busca maior. Quem sabe eu talvez me encontre e possa me compartilhar com vocês que me lêem. Por enquanto, fica a dica da leitura de mais um Haruki Murakami. Aliás, dois: O Assassinato do Comendador volumes 1 e 2. Na foto, o escritor e seu gatinho de estimação. Aliás, gatos sempre estão presentes nas histórias de Murakami.

sábado, 1 de agosto de 2020

LINA


Oi! Eu sou a Lina, uma gatinha rajada. Hoje é meu aniversário de seis meses e por isso eu pedi ao meu pai que me deixasse escrever aqui no blog dele. Eu tenho dois pais, o Roberto e o Weidy. Semana que vem, o dia dos pais vai ser uma festa para mim. Vou comemorar com dois enquanto muitos felinos como eu não tem nem ao menos um... Falando em pais, fiquei chocada com a reação de alguns humanos pelo fato da Natura ter colocado o Thammy, filho da Gretchen, na campanha de dia dos pais. Só por ele ser um homem trans. Que atraso! Nós gatos somos bem mais evoluídos neste aspecto. Aliás, em vários outros também... Mas isso não vem ao caso agora. Hoje é um dia festivo para mim. Graças aos meus pais eu tenho um lar, cheio de amor e outras delícias. Nasci na rua, mais especificamente dentro de um carro abandonado, onde minha mãe deu à luz quatro gatinhas. Minhas três irmãs e eu fomos recolhidas pelas donas do pet shop que fica aqui perto. Elas castraram minha mãe e a devolveram à rua onde ela mora. E colocaram nós quatro para adoção. Claro que devidamente vermifugadas, castradas e vacinadas. Meus pais já tinham encomendado ao pet shop uma gatinha que fosse exatamente como eu sou: Rajada feito um tigrinho. E dengosa. Portanto, fui planejada e muito desejada. Como sou até hoje, dia do meu aniversário de seis meses. Mas já estou me repetindo, não? Rsrsrs... É que ainda não tenho muita prática com a escrita. Eu raramente fico sozinha em casa, meus pais estão sempre comigo. Eles dizem que estão em isolamento social por causa de uma pandemia. Ainda não entendi direito o que isso quer dizer, mas sei que gosto muito de tê-los sempre comigo. Nós brincamos, dormimos, assistimos televisão, tomamos sol na sacada, a vida aqui em casa é bastante animada. Fico só imaginando como será depois que a pandemia passar... Toda vez que vão sair de casa eles colocam máscaras, ficam muito engraçados. E quando chegam limpam tudo com álcool e ficam um tempão lavando tudo que compraram com água e sabão. Esses humanos... Bom, por enquanto é isso. Talvez eu volte a praticar a escrita aqui no blog, se o meu pai deixar. Quem sabe até eu me torne uma gata escritora? Ou uma escritora gata... Agora vou curtir o dia do meu aniversário. Bom mês de agosto a todos!