Dia desses, pensando nas marcas que a vida deixa na gente, me deparei com uma cicatriz que tenho na perna e ela me fez viajar no tempo... Quando eu era pequeno, devia ter oito ou nove anos, subia correndo uma escada de casa quando tropecei e bati a canela direita na quina de um degrau. A pele subiu abrindo uma espécie de Grito de Munch na minha perna. A batida foi tão forte que meio que anestesiou o local, pois lembro que não sentia propriamente dor. Lembro também que apenas um fino filete de sangue corria da ferida. Mas eu chorava e gritava da mesma forma, tamanho foi o susto e o estrago que a queda causou. Quando minha mãe atendeu aos meus apelos e viu o que tinha acontecido, saiu porta afora aos berros, acenando e gritando para os carros que passavam em frente à minha casa. Um deles parou e nos levou ao hospital. Aqui minha memória faz um pequeno lapso. Não lembro de quem nos levou até lá, nem do trajeto, nem tampouco da chegada no hospital. Só lembro de já estar sendo atendido pelo Doutor Sidney... Dr. Sidney era o médico da família, compadre dos meus pais, que eram padrinhos de sua filha Fátima. Adoro essa cena e nunca, jamais, em tempo algum irei esquecê-la. Enquanto costurava minha perna, Dr. Sidney mantinha preso aos lábios um cigarro aceso. De vez em quando ele pegava o cigarro com uma das mãos para bater a cinza no cinzeiro e, aproveitando os lábios livres, dizia à minha mãe: Calma, comadre, vai ficar ótimo! Ótimo não ficou: Até hoje tenho uma espécie de sorriso gravado na canela como lembrança desse acidente. Mas vamos combinar que transformar o Grito de Munch em um smile não é pouca coisa... Tenho muita saudade desse tempo em que a gente conhecia os médicos e não tinha plano de saúde. As relações eram pessoais e não burocratizadas como são hoje. E ninguém adoecia ou morria porque o médico não usava luvas esterilizadas em um ambiente totalmente asséptico. Já estou com cinquenta e dois anos e nunca fui hospitalizado na vida. Todas as doenças que tive puderam ser tratadas em casa. Sem plano de saúde. E o smile na minha canela direita é a prova. São as tais marcas que a vida vai deixando e que contam a nossa história...
Na foto, Robertinho por volta dos oito ou nove.
quarta-feira, 23 de dezembro de 2015
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Nunca, jamais, em tempo algum... parece que vai começar uma música, uma dor de Betânia. Um pito nos bicos, tipo Mad Men, muito bom. Incensando um pajé, cura pelas fumaças de Virgínia. Felizes Festas, saúde.
ResponderExcluirFumaças da Virgínia! Só você, Sergio Lilkin... Amei. E me trouxe outras lembranças...
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