quinta-feira, 30 de setembro de 2021

RELOADING TARANTINO

Costumo dizer que minha cultura cinéfila tem lapsos. São determinados filmes e/ou cineastas que, por um motivo ou outro, deixo de assistir e que acabam ficando para trás formando brechas, lacunas a serem preenchidas. Uma das coisas boas que o isolamento social pandêmico me proporcionou foi justamente reparar, na medida do possível, esses descuidos. De modo que venho assistindo a várias obras cinematográficas a que jamais assistira. Foi assim com Scarface, de Brian de Palma, e A Época da Inocência, de Martin Scorsese, como já contei aqui no blog. Agora foi a vez de atualizar Quentin Tarantino. Acredite-se ou não, eu só havia assistido a Pulp Fiction. Mais nada desse cineasta contemporâneo. Uma vez cheguei a pegar Cães de Aluguel em vídeo para assistir, mas desisti logo no começo não me lembro por qual motivo. Atentem para a antiguidade da frase anterior: Cheguei a pegar em vídeo. Remete ao tempo das videolocadoras... Bem, voltando à minha recente atualização de Tarantino, comecei logo com dois petardos, dois socos no estômago: Django Livre e Bastardos Inglórios. Confesso que não foi nada fácil para mim. São longos e extremamente violentos. Logo, resolvi assisti-los em partes, dividindo-os em episódios, como em uma série. Assim podia tomar fôlego para o que ainda me aguardava. Gostei muito. Dos roteiros, das trilhas sonoras, do humor – sim, tem muito humor em meio a toda crueldade e horror – e, principalmente, dos atores. Um em especial se destacou para mim nos dois filmes: Christoph Waltz. Em Django ele encarna o dentista caçador de recompensas e em Bastardos, o carrasco nazista caçador de judeus. Fiquei encantado com o trabalho desse ator. Sempre dizendo e fazendo as piores barbaridades com um sorriso nos lábios e com a fineza de modos de um gentleman. Impressionante. Também em Bastardos Inglórios vemos Brad Pitt desconstruir o galã com contidas e infalíveis doses de humor e construção de tipo. Agora estou louco para assistir a mais Tarantinos. Claro que pouco a pouco. Pois, assim como o álcool, esse cineasta deve ser apreciado com moderação... Nas fotos, Christoph Waltz botando para quebrar em Django Livre e em Bastardos Inglórios.

quarta-feira, 15 de setembro de 2021

SENHORA DIRETORA

O primeiro professor de direção a gente nunca esquece. No caso, primeira professora: Irene Brietzke. Ela nos ensinou o beabá da encenação. Montar uma cena como quem pinta um quadro. Ler a cena da esquerda para a direita, como quem escreve. Explorar linhas no espaço, diagonais, retas, semicírculos. Compor quadros vivos de acordo com um tema proposto. Lembro que uma vez ela me deu o tema praia para que eu compusesse um quadro com os colegas. Dei tudo de mim para fugir do óbvio, elaborei o mais que pude e entreguei uma praia totalmente "cabeça". Dona de um senso de humor único, após examinar atentamente o resultado, Irene comenta, seriíssima: Refaz essa praia um pouco mais Copacabana e menos Praia do Rosa. Nunca esqueci... Como também nunca esqueci seu comentário após assistir à primeira cena que dirigi com atores (Mario Ruy e Cibele Sastre) cujo tema era Cenas de Um Casamento: Tu tens postura de diretor. Procurei carregar para sempre comigo essa postura... Uma das primeiras peças a que assisti foi o seu inesquecível Salão Grená, com canções de Brecht e Weill, no pequeno palco do CAD - hoje DAD - onde anos depois eu iria estudar e ser aluno justamente dela. Lembro do quanto me impactou e de como saí de lá impressionado e decidido a cursar Artes Cênicas... Fora todo o conhecimento que Irene nos passava nas aulas, a gente tinha o privilégio de acompanhar nos palcos da cidade a trajetória profissional dela como encenadora e atriz. Atuando ou dirigindo, ela arrasava sur la scène. Foram inúmeras montagens com o Grupo Teatro Vivo, espécie de curso de extensão universitária que vinha como prêmio. Entre elas, O Casamento do Pequeno Burguês, Mahagonny, Peer Gynt, A Aurora da Minha Vida, No Natal a Gente Vem te Buscar e tantas outras.... Cursei o DAD de 1984 a 1989. Tempo recorde comparado à maioria dos alunos que ficava anos e anos cursando. Muitos sem ao menos se formar. Mas foram anos muito bem vividos. Tive grandes mestres, Irene foi um deles. Como Ivo Bender, Maria Helena Lopes, Luís Artur Nunes, para citar alguns. Pertencem a uma casta, uma cepa especial, representam uma era de encantamento e arte, algo que se assemelha a um sonho do qual estamos acordando agora. E dando de cara com uma realidade assustadora... Descanse em paz, Irene. Que os Deuses do Teatro te acolham com os louvores a que tens direito. Na foto, Irene pelo luxuoso olhar da fotógrafa Jacqueline Joner.

segunda-feira, 6 de setembro de 2021

SETEMBRO INTENSO

Que bom que finalmente o mês de setembro chegou. E, com ele, a promessa de renovação de esperenças, de vida, de possíveis alegrias futuras. Já entrei o mês voltando ao teatro, um dos lugares onde mais gosto de estar na vida. Foram dois ensaios no palco do Teatro Folha e no domingo, dia 05, nossa estreia do espetáculo O L Perdido, que marca minha volta aos palcos como diretor. Confesso que ainda me senti bastante estranho. E nada à vontade, como costumava me sentir quando estava em um teatro. Digo isso não pelo tempo que passei sem dirigir mas, sim, pelo atual estado pandêmico de distanciamento e reclusão que estamos vivendo. Felizmente, à medida em que o espetáculo foi transcorrendo, fui me envolvendo com ele e, aos poucos, relaxando. Grace Gianoukas (minha parceira de palco de muitos anos) e Agnes Zuliani são grandes atrizes, com talento de sobra tanto para o drama quanto para a comédia. No mais, foi só apertar alguns parafusos para que a coisa fluísse como deve ser quando reúne duas forças cênicas dessa natureza. Não deu outra, o público presente deitou e rolou com as aventuras das amigas Leila e Laila em busca do tal L perdido... Já o dia de hoje, segunda-feira, trouxe duas grandes perdas: As mortes de Jean-Paul Belmondo, ícone do cinema francês, e de João Carlos Assis Brasil, grande pianista e compositor brasileiro. Tive a honra de trabalhar com João Carlos na montagem carioca de A Caravana da Ilusão, de Alcione Araújo, na qual fui assistente de direção de Luís Artur Nunes e ele foi responsável pela trilha sonora, especialmente composta para o espetáculo. Além de ter estado com ele em diversos ensaios e reuniões, tive o privilégio de acompanhar a gravação da trilha no estúdio, com ele ao piano e Mauro Senise, outro dos grandes músicos brasileiros, na flauta. Eu ficava com um cronômetro do lado de fora do estúdio, sinalizando para João através do vidro o término de cada vinheta musical. Uma experiência inesquecível. Eu já era fã de João Carlos Assis Brasil do álbum que ele gravara acompanhando Olivia Byington. Depois disso ainda tive a oportunidade de vê-lo em cena como ator acompanhando a diva Marilia Pera no espetáculo A Prima Dona, do mesmo Alcione Araújo de A Caravana da Ilusão... Bem, como tudo tem dois lados, a segunda-feira trouxe coisa boa também: Chegou a minha tão esperada segunda dose da vacina. Acordei cedo, tomei café da manhã e tratei de ir logo para a fila... No mais, a cidade explode em cores com a floração dos ipês amarelos e das azaléas de diversos tons. E aqui em casa as orquídeas fazem a festa, antecipando a primavera... É isso, setembro mal começou e olha eu aqui já cheio de histórias para contar... Desejo uma linda e próspera primavera a todos! Nas fotos, Grace e Agnes em cena de O L Perdido, João Carlos Assis Brasil ainda jovem, eu tomando a segunda dose da vacina e a festa das orquídeas chez nous.