sábado, 27 de maio de 2017

ANTÍGONA

Como diria Odorico Paraguassu, é com a alma lavada e enxaguada nas águas da emoção mais profunda que venho por meio deste enaltecer o incomensurável talento de Andrea Beltrão. E, como trata-se de post em blog e o tempo/espaço urge, não me estenderei sobre o irretocável conjunto da obra mas, sim, me restringirei ao não menos irretocável solo que ela agora nos apresenta: Antígona. Não a de Sófocles, mas a da própria. Dela e de Amir Haddad em bem sucedida e oportuna adaptação. Os exageros iniciais de Odorico se justificam por vários motivos. Primeiro porque já pisei em temporada de três meses, há exatos trinta anos, as mesmas tábuas em que agora Andrea nos brinda com sua tragédia: O histórico palco do Sesc Anchieta, templo do teatro de Antunes Filho. Lugar sagrado em que, no ano de 1987, me apresentei com Império da Cobiça, criação do Grupo Tear, da minha mestra Maria Helena Lopes. E, segundo mas não menos importante, porque amo a tragédia grega, em especial essa de Antígona, a jovem que se rebela contra a tirania do governante opressor. Em adaptação primorosa, Andrea percorre não apenas a tragédia mas o mito em si. A genealogia do mito. E conduz a plateia com maestria pelas peripécias trágicas, sem deixar de lado o humor, se é que isso é possível, e acaba provando que é. Sem nunca banalizar a gravidade do tema. Ela é capaz de fazer o público embarcar facilmente em todas as emoções que propõe sobre a cena. Não sou crítico de teatro. O que tento passar aqui vem totalmente embalado pela emoção. E, devo confessar, por algumas taças de vinho... O que mais me agrada na montagem é a dosagem perfeita entre o registro trágico e o drama. Recentemente assisti a uma montagem de Gota d´Água em que o registro da interpretação escorregava o tempo todo para o drama, o que não seria o caso, posto que Gota d´Água é uma adaptação da Medeia, portanto, uma tragédia. Ocorre que Andrea é uma grande atriz. E mais não digo... Muitos anos atrás, nem vou dizer quantos, assisti a uma montagem da Antígona protagonizada por minha professora de interpretação, a grande Sandra Dani, que me marcou profundamente. Dois anos atrás assisti, em Paris, a uma montagem cinematográfica protagonizada pela não menos maravilhosa Juliette Binoche. Devo dizer que temia algo que não estivesse à altura dessas minhas referências. Pois meu temor revelou-se totalmente infundado. Andrea brilha como nunca. Ou melhor, como sempre. Fui às lágrimas quando ela avança pela plateia dizendo a frase do coro: Numerosas são as maravilhas da natureza, mas de todas, a maior é o Homem... Lembrei o tempo todo do meu professor de teatro grego na faculdade de teatro em Porto Alegre, o mestre Ivo Bender. Ele certamente faria várias críticas ao espetáculo. Mas saberia, como poucos, apreciá-lo... Fica até 18 de junho. Não perca!
Fiz a foto enquanto Andrea esperava o público sentar para começar o espetáculo. Depois, educadamente, desliguei o celular.

quinta-feira, 11 de maio de 2017

JAPAN HOUSE

Como volta e meia costumo repetir aqui no blog, São Paulo não se cansa de me surpreender. Acaba de inaugurar na cidade, em plena Avenida Paulista, a Japan House. Em bom português, a Casa Japão. E eu, encantado que sou com tudo o que diz respeito a esse país, fui correndo conferir. Correndo é maneira de falar. A inauguração foi no sábado passado, mas esperei até ontem para evitar aglomerações. E foi ótimo ter esperado. Estava super tranquilo. Mesmo assim, visitei tudo rapidamente, uma passada geral para conferir todos os ambientes. Pretendo voltar com mais tempo e mais calma para me dedicar a cada recanto. Um misto de galeria de arte, biblioteca, café, jardim, loja, restaurante e museu. A exposição inaugural é dedicada ao bambu, elemento presente em vários aspectos da vida e da cultura japonesas. Diversos artistas apresentam obras de grande beleza e impacto visual utilizando esse rico e versátil material. Dei uma rápida olhada nos livros e fiquei especialmente tocado por Kazu, ensaio fotográfico de Herb Ritts com nus artísticos do jogador de futebol japonês Kazuyoshi Miura. O restaurante, no segundo andar com vista para a Avenida Paulista, é o Junji Sakamoto, do renomado chefe de mesmo nome, e a cafeteria no térreo é o Imi Café. Sem muito o que dizer e ainda sob o impacto da primeira visita, deixo algumas imagens que registrei com meu celular. Mais para a frente conto em detalhes sobre o restaurante, exposição, café e etc. Como sempre, a cidade de São Paulo me surpreende e encanta. Sou muito grato por ter sido acolhido por ela. Arigatô, Pauliceia!
Nas fotos, o terraço com vista para a Paulista, eu fazendo graça em frente à parede de washi do artista Yasuo Kobayashi, obra de Chikuunsai IV Tanabe na sala de exposições, o incrível jardim de pedra e Kazuyoshi Miura para Herb Ritts.

terça-feira, 2 de maio de 2017

MONÓLOGO PÚBLICO

Como é bom ir ao teatro. Como é bom ir ao teatro e sair satisfeito. Como é bom ir ao teatro e se sentir provocado, instigado. Como é bom ir ao teatro e sair de lá transformado. Assim é o teatro de Michel Melamed: Provocador, instigante, transformador. Foi a melhor coisa que eu poderia ter feito nesse feriado de segunda-feira. Gosto muito de tudo o que faz esse poeta, autor, ator, diretor, performer e apresentador de TV. Seu solo Dinheiro Grátis já havia mexido muito comigo anos atrás no Rio de Janeiro. E nesse Monólogo Público ele vem ainda mais intenso e autobiográfico. É um deleite embarcar nas desventuras do personagem narrador cujo texto se desenvolve ora em verso ora em prosa, cheio de jogos de palavras e associações, pleno de beleza e inteligência raras. Com uma belíssima luz assinada por Adriana Ortiz, um impressionante objeto/cenário de Sergio Marimba e uma trilha sonora inspirada e inspiradora do DJ Ansioso, Michel está muito bem amparado sobre a cena. Mas ele não precisaria de nada disso. Se quisesse, poderia chegar e fazer seu solo em qualquer lugar, com qualquer roupa, em quaisquer condições. O que interessa, o que enche os olhos, a alma e o coração, é o que está com ele. Seu conteúdo. Ainda bem que o seu monólogo é público. Para mim, que já vivo uma crise de abstinência cênica, foi como uma espécie de abdução ao mundo do teatro. Uma consagração. Uma epifania. Viva Michel Melamed!
Nas fotos, Michel em si sobre o palco e eu totalmente abduzido após o espetáculo.