sexta-feira, 9 de novembro de 2012




MACK THE KNIFE
Na minha lista de coisas para fazer e ver antes de morrer - ou antes que o mundo acabe, para ser mais atual – constou durante muito tempo assistir a um espetáculo de Bob Wilson. Finalmente a minha hora chegou: Ontem à noite tive a oportunidade de assistir, no Sesc Pinheiros, a um espetáculo dirigido por ele. Só que, além de se tratar de uma encenação de Bob Wilson, a peça era a Ópera dos Três Vinténs, de Bertold Brecht e Kurt Weill, que amo de paixão, e, como se tanto não bastasse, o grupo era não menos que o Berliner Ensemble, criado pelo próprio Brecht e sua mulher, Helene Weigel, em 1949. Meu chará Robert é um gênio da encenação contemporânea e essa sua obra me deixou no mínimo perturbado. Inquieto. Feliz. Satisfeito. Saciado. Meu Deus, como é gratificante assistir a um bom espetáculo de teatro! E como é difícil que tal nível de satisfação seja atingido. Eu falo porque vou à quase tudo e sei que não é bem assim. E olha que sou bem bonzinho... Seu Mack Navalha, totalmente desconstruído, reinventado, desfeito e refeito, é algo como um cabaretier, uma Marlene Dietrich, uma figura andrógina jamais pensada além do clichê do mafioso, do bandido, e até mesmo do malandro, na versão brasileira de Chico Buarque. Seu intérprete, Christopher Nell, é daqueles atores que encantam desde o momento que pisam o palco. Ano passado eu assisti, em Paris, à versão da Comédie Française, quase cinematográfica, de tão realista, e me encantei. Mas, depois dessa essa encenação de Bob, não tem pra ninguém. É quadrinho, é desenho animado, é Tim Burton. É expressionismo alemão. Suas figuras são compostas corporalmente nos mínimos detalhes e nenhuma movimentação sobre a cena é livre ou solta: Tudo é milimetricamente marcado. Coreografado. E as canções de Weill... Ah! As canções de Kurt Weill. Várias delas estão no espetáculo Cabarecht, no qual tenho a honra de dividir o palco com Cida Moreira e que conto os dias para que volte em cartaz. Cheguei em casa tarde, o espetáculo dura três horas, mas não consegui dormir. E mesmo quando deitei, já de madrugada, as cenas e canções ecoavam na minha cabeça. A atualidade do texto de Brecht chega a ser irônica, de tão adequada à realidade que vivemos. Como dizem os versos da canção de abertura, Die Moritat von Mackie Messer: Tubarões tem muitos dentes e os exibem sem pudor. E Macheath tem uma faca, mas prefere não a expor. Tubarões no ataque deixam, como rastro, sangue atrás. Mac põe luvas que não trazem traço algum do que ele faz... E assim seguimos, sem expor nossas torpezas. Varrendo a sujeira pra baixo do tapete.

Na foto, o Mack Navalha do virtuoso Christopher Nell.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012



UM LUGAR NO MUNDO
Será que existe um lugar nesse mundo, um lugarzinho só para mim? Onde eu possa existir sossegadamente, sem ter que interagir muito com quem quer que seja. Aliás, onde eu possa me dar o luxo de só interagir com quem gosto? Um lugar, não sei qual, mas bem diferente da São Paulo onde vivo há dezesseis anos e que tanto já me encantou e me fez feliz. Agora eu gostaria de um pouco mais de tranquilidade. De silêncio, esse artigo  de luxo que anda tão difícil da gente encontrar... Eu não gosto de barulho. Não gosto de aglomeração. Não gosto de filas. Não gosto de trânsito nas estradas. De feriados prolongados. Não gosto de shoping centers. De parques nos fins de semana. Não gosto de churrasco. De cerveja. De tecnobrega. Não gosto de pagode. Não gosto de excursão. De cruzeiros. Tenho horror a ir ao cinema em finais de semana. Pavor de salas lotadas de pessoas consumindo refrigerantes, pipocas, balas e amendoins. Falando no celular. Não gosto de celular. Não gosto de ir aos lugares da moda. Não gosto de usar o corte de cabelo da moda. Não gosto de música ao vivo. Não gosto de estreias. Não gosto de shows em estádios. Não gosto de futebol. Não gosto das novelas da Glória Perez. Não gosto de quem faz lobby. Não gosto de fazer lobby. Aliás, não sei fazer lobby. Quando tento, fica péssimo, super falso e desastrado. Não gosto de gente interesseira. De gente falsa. Não gosto de cuidar da vida dos outros. Muito menos, que cuidem da minha. Não gosto de fotos de comida no Instagram. Nem no Facebook. Não gosto do Facebook. Não gosto de gente que fala alto. Que mente. Que joga lixo na rua. Não gosto de muvuca. De barraco. De escândalo. Não gosto de quem grita chupa!!! em dias de jogos. Não gosto que soltem foguetes em dias de jogos. Sobretudo, à noite. Não gosto de quem buzina. De quem para em fila dupla. De quem leva crianças em lugares para adultos. Não gosto de academia lotada. De música de balada tocando alto na academia. Ainda mais de manhã, que é quando gosto de treinar. Não gosto de balada. Ou seja, sou um baita de um chato, neurótico e exigente. E esse mundo não é para mim... Mas haverá, por Deus, esse outro lugar? Aceito sugestões...
Na foto, La Figueira, em Piracaia. Um lugar possível, só que sem internet.